César Wolff

César Wolff é advogado e professor da Furb. Foi presidente da subseção Blumenau da Ordem dos Advogados do Brasil entre 2010 e 2015.

“Detector de metais nos fóruns é mais um equívoco burocrático e de custo elevado”

Colunista critica e acredita ser desnecessária implantação dos equipamentos

Está em curso a implantação de detectores de metais, portas giratórias e scanners de pertences pessoais nos Fóruns de Justiça de Santa Catarina. A medida, possivelmente, atende a um clamor por mais segurança nas Casas de Justiça, o que não deixa de ser um paradoxo.

Objetivamente, se levanta como mais uma barreira, física inclusive, de acesso à Justiça. Sim, porque acessar a Justiça não é algo tão simples como pode parecer aos mais desavisados. Protestar judicialmente pelo reconhecimento de direitos pressupõe atendimento de uma série de contingências burocráticas.

Chegar ao Poder Judiciário, em regra, exige o patrocínio por advogado, salvo algumas poucas exceções legais. Estatizadas, as defensorias públicas já sofrem do mesmo mal dos serviços públicos em geral. Basta ver as filas que se formam na calçada, e às vezes sob chuva, a partir do meio-dia na rua Joinville, sede do órgão, aqui em Blumenau.

O segundo entrave está na exigência de reunião da documentação oficial. Muitas vezes a falta de um registro imobiliário, da averbação de um contrato particular ou do reconhecimento de firma, tudo taxado pelo Estado, pode ser crucial para impedir-se o reconhecimento do direito. E geralmente atinge os menos instruídos e favorecidos.

Agora nos deparamos com a obstrução do acesso físico aos fóruns com a instalação das irritantes portas giratórias e detectores de metais. Era mesmo preciso submeter juízes de direito, promotores de justiças, serventuários, oficiais de justiça, advogados, peritos, policiais civis e militares, estagiários e, especialmente, os jurisdicionados a esse inegável constrangimento?

Estou convencido que não. Trata-se de mais um equívoco burocrático, de custo presumidamente elevado, desnecessário, dispensável e, por tudo isso, infeliz.
Recentemente o Conselho Nacional de Justiça divulgou que havia 812.564 presos no país, e 366,5 mil mandados de prisão para serem cumpridos, o que soma 1.179.064‬ encrencados criminalmente. Considerando que o Brasil chegou a 210 milhões de habitantes, esta soma representa algo com 0,5% do total da população.

Se consideramos que os que cumprem pena, independentemente do regime, já estão sob alguma forma de custódia do Estado, então o percentual do universo de possíveis criminosos se reduz aos foragidos, ou seja, 0,2% do total.

Portanto, uma decisão administrativa de duvidosa necessidade sujeitará 99,8% da população brasileira à prova da inocência e de suas boas intenções, sem que o próprio sistema de Justiça reúna contra essas mesmas pessoas qualquer elemento objetivo de sua periculosidade.

Noutra ponta, condenados por crimes de corrupção em duas, três, instâncias e muitas vezes liderando partidos políticos e chefiando governos buscam o direito de serem considerados inocentes, escapando às mãos da Justiça, até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

É preciso refletir sobre esses acontecimentos. Nós brasileiros somos responsáveis pelo país que estamos construindo. Respeitar os cidadãos em dia com suas obrigações civis e penais e repreender os malfeitores é o caminho normal e natural para construção de uma sociedade livre. A inversão desses valores não merece aplausos.

P.S: Não se pode desconhecer que o crime organizado é uma realidade no país e que também os magistrados que atuam na área penal sofrem ameaças contra a vida. Daí a submeter todos à prova de idoneidade, não é o caminho.

Talvez é chegado o momento de se pensar a construção de Fóruns Criminais nos maiores centros urbanos, esses sim sujeitos a fortes esquemas de segurança. Talvez seja o momento de cumprir o Código de Processo Penal e realizar as audiências criminais dentro dos próprios estabelecimentos prisionais, sem a necessidade dos elevados esquemas de logísticas para traslados diários de presos aos Fóruns de Justiça.

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