Conheça o primeiro museu funerário da América Latina, que fica em Blumenau

Memorial reúne relatos da colonização, desenvolvimento e nacionalização na região

É impossível desvencilhar a história de Blumenau da história dos colonizadores. Da mesma forma, a história da família Haas está intrinsecamente conectada a um tema tabu em nossa sociedade: lidar com a morte.

A marmoraria que se tornou funerária para atender às famílias dos falecidos da região conta também a história da colonização, do desenvolvimento e da nacionalização no Médio Vale do Itajaí. Esse registro culminou na construção do Memorial Funerário Mathias Haas.

Primeiro museu funerário da América Latina, o espaço conta a trajetória da família desde a vinda da Alemanha em 1904 até a construção e transformação do negócio. Ao mesmo tempo, ajuda a compreender evolução do serviço funerário na região.

Livro de memórias de Mathias Haas está sendo traduzido para publicação. | Foto: Alice Kienen/O Município Blumenau

Elke Haas Fonseca, gerente do memorial e bisneta do fundador da empresa, comenta como trabalhar com a morte sempre foi algo natural para ela. Nascida junto da abertura da funerária, Elke cresceu com o negócio da família.

“Todos nós vamos passar pela morte, e também pelo luto em algum momento. O apoio e um serviço de qualidade são muito importantes para essas famílias. Assim como cultivar a memória da pessoa que se foi. Por isso preservar os cemitérios é tão significativo. Pois, além de contarem um pouco sobre a história da pessoa sepultada, através da simbologia dos adornos e estatuária, revelam materiais e estilos de diferentes épocas”, reforça.

Chegada da Alemanha

Mais uma família fugindo da crise alemã, os Haas conseguiram um terreno onde hoje fica o município de Ibirama. Começando no trabalho agrícola, como a maioria, a família logo investiu em fretes de carroça até Gaspar e Brusque.

Alocados em um terreno com muito arenito, os descendentes de escultores começaram a fabricar pedras de amolar. Como era um instrumento necessário para todos os colonos, as vendas logo se espalharam por Santa Catarina.

A entrada na arte funerária ocorreu após uma criança falecer próximo de onde eles moravam. A família da vítima, sabendo que os vizinhos eram escultores, procurou os Haas para encomendar uma lápide. Como esse era um mercado que não existia na região, logo os monumentos tumulares se tornaram o carro chefe.

Negativo de uma arte tumular, usado como molde. | Foto: Alice Kienen/O Município Blumenau

Apesar de terem chegado no Brasil em 1904, foi apenas em 1918 que Mathias Haas oficializou a oficina. O pai dele, Anton, concretizou o plano inicial e se mudou para os Estados Unidos em 1911. Além da esposa, ele levou quatro filhos, deixando Mathias e Joseph no Brasil.

Casado com a também alemã Rosa, Mathias começou a construção da sede na rua São Paulo em 1921. O propósito era estar mais próximo da região central da colônia. O endereço foi selecionado por estar próximo da estação ferroviária. O que a família não sabia era que o terreno seria fortemente afetado pelas enchentes.

Residência da família ficava acima da construção à esquerda. Espaço hoje abriga sede da Haas e da Boa Vida. | Foto: Arquivo família Haas

“Um dia meu bisavô viu a vizinha tapando o porão e perguntou o que ela estava fazendo. Ela explicou que a água ia subir e não queria perder o que estava guardado lá. Ele não acreditou e quando acordou a água já tinha entrado em casa. Eles não faziam ideia das cheias, mas na época aquela região era um banhado”, conta Elke.

De marmoraria para funerária

No fim da década de 1940, o filho homem mais velho de Mathias, Guido, assumiu o negócio. A época foi marcada pela mudança nas tendências arquitetônicas na cidade – o que refletiu nos cemitérios. As estátuas em mármore e o granillite deram lugar para chapas lisas de granito.

Mathias, ao fundo, junto do filho Guido, que assumiu o negócio em 1948. | Foto: Arquivo família Haas

Em 1967, Rolf, filho homem mais velho de Guido, assume a Haas após um período morando em São Paulo. É nessa época que a demanda da marmoraria cai e os cemitérios saem do centro da cidade.

Dois anos depois, em 1969, a funerária é fundada e os investimentos na marmoraria cessam, oficializando o fim dela na década de 1990. A empresa logo evoluiu e passaram a ter os planos funerários e também de cremação.

Repassando a história

Fundador da funerária e entusiasta da trajetória da família, Rolf sempre idealizou um memorial junto do filho Ronald. Falecido em 2015, aos 77 anos, ele não viveu para ver o museu pronto, mas o suficiente para contar sua história.

“Meu pai guardava cadernos de viagem, fotos, anotações, catálogos, arquivos da empresa. Tudo isso por gerações. Ele sempre teve interesse que isso fosse divulgado”, conta Elke. Um vídeo de Rolf compartilhando as memórias em 2014 está disponível no memorial.

Instrumentos usados na marmoraria. | Foto: Alice Kienen/O Município Blumenau

O memorial fica em um terreno da família Haas na Escola Agrícola e ocupa a antiga moradia dos sogros de Rolf. Apesar da sede da Haas ficar na rua São Paulo, o fato de o local ser vítima fácil das enchentes blumenauenses fez com que a família decidisse levar o acervo para um endereço mais seguro.

Alice Kienen/O Município Blumenau

As paredes externas narram a árvore genealógica e a trajetória da família. Dentro do imóvel, as memórias são detalhadas e o visitante tem acesso a ferramentas, fotografias e relatos dos Haas – desde a vinda da Alemanha até a modernização do negócio.

Alice Kienen/O Município Blumenau

Placa secreta

Um momento que impactou muito a vida da família Haas, assim como de muitos blumenauenses, foi o projeto de nacionalização de Getúlio Vagas. Até mesmo nos cemitérios o alemão era proibido, fazendo com que inscrições antigas precisassem ser substituídas.

Mathias Haas foi multado em 100 mil réis por produzir uma lápide em alemão. Para ele a multa “injusta” seria um “assédio” das autoridades. “Não esbocei reação, pois uma ação tem tanto valor quanto a ela atribuímos”, completou o alemão em seu diário.

Mathias desenvolveu inúmeras logos com diferentes nomes para o negócio da família. | Foto: Alice Kienen/O Município Blumenau

Em 1999, o neto Rolf estava reformando o telhado da sede da funerária Haas na rua São Paulo quando teve uma surpresa. Escondida entre o forro e o teto, um funcionário encontrou a placa original da oficina – em alemão.

O item de cerca de dois metros está “escondido” no museu – pode ser observado apenas por uma pequena janela. A atitude faz alusão à proibição de exibir a placa por tantos anos. Chegando ao pontos que os descendentes desconheciam ela.

Alice Kienen/O Município Blumenau

Como visitar

Por ficar localizado dentro de um terreno da família, as visitas acontecem com agendamento prévio. Aproveite a visita guiada, que detalha toda a história da família e a importância do serviço funerário para a cultura e história, com registros arquitetônicos e curiosidades da região.

Alice Kienen/O Município Blumenau

Para agendar, entre em contato pelo e-mail contato@haas.museum, pelo telefone (47) 3222-9918 ou pelo WhatsApp (47) 99122-8532. O horário de funcionamento é de segunda a sexta das 13h às 17h e aos sábados das 8h às 12h.

O Memorial fica na rua José Deeke, 751, no bairro Escola Agrícola.  Acompanhe também as redes sociais (Instagram e Facebook) do Memorial, que trazem informações, fotos e curiosidades.

Alice Kienen/O Município Blumenau

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