Influencer de Blumenau conta como perda dos rins foi chave para mudança de vida

Após mudanças na alimentação, Jaque passou a usar a internet para compartilhar rotina

Prestes a completar 29 anos, a blumenauense Jaque Scholemberg conquistou seguidores compartilhando a alimentação e a rotina nas redes sociais. Entretanto, o início dessa atividade que se tornou o trabalho dela veio de forma inesperada. A inspiração surgiu após Jaque perder os dois rins e precisar passar por um transplante.

Em um período de muitas mudanças no dia a dia, especialmente na alimentação, vídeos de pessoas comendo eram o que traziam conforto para Jaque. Se imaginar voltando a experimentar os sabores e retomar a rotina foi o que inspirou ela a também compartilhar receitas e restaurantes de Blumenau e região.

“Eu passei mais de um mês internada e ficava horas no TikTok vendo vídeos de gringas comendo. E eu só com comida de hospital. Era o que me dava satisfação”, conta a produtora de conteúdo, criadora do perfil @jaqueestacomendo.

Atualmente a blumenauense acumula mais de 20 mil seguidores no Instagram e quase 700 mil no TikTok. Mas se engana quem pensa que os perfis, que tem pouco mais de um ano, foram os primeiros dela. Jaque começou a produzir conteúdo para a internet em 2011, mas focada em outros temas. Foi quando se concentrou na alimentação que o público passou a reconhecer mais o trabalho dela.

@jaqueestacomendo Responder @nathanbrit.0 tá frio aí também, gente? #cafedamanha #comendo ♬ som original – jaqueestacomendo

Diagnóstico inesperado

Aos 14 anos Jaque foi diagnosticada com lúpus, uma doença autoimune que pode afetar diversos sistemas do corpo. Ainda assim, ela teve uma rotina normal na adolescência e início da vida adulta. Após passar um tempo em Campinas (SP) e se formar em Direito, voltou para Blumenau em 2019.

Foi em uma manhã fria de junho de 2020 que ela reparou algo de errado com o próprio corpo. Após três dias estranhando a cor da urina, Jaque decidiu comentar com o pai, que na mesma hora a levou para o hospital.

Apesar de ter lúpus, não foi a doença que atacou os rins de Jaque. A jovem passou dias sendo medicada para uma infecção, mas nada resolvia. Qualquer alimento que ela tentava ingerir acabava vomitando e a fraqueza do corpo intoxicado só crescia.

Com isso, em pleno auge da pandemia, Jaque acabou passando mais de um mês internada. Nesse meio tempo ela contraiu o vírus da Covid-19, que atrasou o tratamento, já que o corpo não estava forte suficiente. O diagnóstico foi de doença de antimembrana basal glomerular, mais uma condição autoimune.

Jaque durante uma sessão de hemodiálise. | Foto: Arquivo pessoal

“Lembro que nem sabia o que era hemodiálise e de repente estava dependente dela. Confiei muito na equipe da Renal Vida. Depois de dois anos dessa trajetória vejo como eles são incríveis. Sabem nos acolher, são muito inteligentes e resolvem tudo em equipe. Sou muito grata”, reforça.

Do início da doença até dezembro de 2020, o funcionamento dos rins de Jaque foi de 100%  para zero. A doença tinha se tornado irreversível. Em poucos meses ela já estava na fila do transplante, concretizado em novembro de 2021.

Um novo rim

Um paciente que aguarda transplante nunca sabe quando será chamado para a cirurgia. No caso de Jaque, ela estava colocando a mesa do café para receber os amigos que vinham a visitar de São Paulo quando os pais chegaram em casa e a levaram para o hospital às pressas.

“Fui para o hospital com meus pais e meu irmão sem saber se ia acontecer. Mas estava preparada para tudo que passei. Nunca fiquei nervosa. Fortaleci muito minha mente para enfrentar esse momento. Fui internada no fim da tarde do sábado e no domingo de manhã já fui transplantada”, relembra.

Jaque logo após o transplante de rim. | Foto: Arquivo pessoal

Entretanto, o processo de aceitação para entender que um transplante seria necessário levou certo tempo. Até então, Jaque falava muito sobre saúde mental e autoconhecimento na internet e acreditava que conseguiria ser curada sem a operação.

“Eu sentia que todo mundo era saudável, menos eu. No começo tinha certeza de que ia melhorar, mesmo os médicos dizendo que não. Mas a única coisa que podia fazer era confiar e descansar, porque ficar estressada não ajudava em nada. Eu precisava do máximo de bem-estar possível para melhorar”, conta.

Jaque reforça que morar em Blumenau, cidade referência em transplantes e em tratamento renal, foi um dos fatores que mais a tranquilizou. Poder contar com os pais para sustentar e apoiá-la também foi fundamental.

“Não sei como teria passado por tudo isso sem minha rede de apoio e sem a Renal Vida. O apoio da família e dos amigos é muito importante”, enfatiza.

Produção de conteúdo

Durante mais de um mês de internação sem poder receber visitas, Jaque baixou o TikTok e passou a assistir vários vídeos. Entretanto, nenhum trazia tanto prazer quanto os de pessoas comendo – algo que ela só sonhava em fazer.

Entretanto, foi apenas um ano após o início da doença que ela passou a produzir o conteúdo também. Fazendo hemodiálise e no processo para entrar na fila de transplante, Jaque perdeu 10 kg. Sem conseguir comer e com manchas na pele, ela descobriu uma nova condição trazida pelo lúpus.

“Comecei a tomar altas doses de corticoide todos os dias. Ele abre muito o apetite, aumenta as bochechas e libera muito cortisol. Eu me sentia uma máquina de vencer. Falava para os médicos que podia dominar o mundo”, brinca.

Com toda a energia trazida pelo tratamento, Jaque criou o @jaqueestacomendo, iniciou três canais no YouTube e começou a escrever um livro de receitas. Tudo ao mesmo tempo. A blumenauense mal dormia, porque queria focar toda energia na produção.

“Tudo isso com aquele apetite enorme. Qualquer arroz parecia a melhor comida do mundo. E eu fazia vídeos comendo com muito gosto. Além das bochechas inchadas, que chamavam atenção. Logo comecei a viralizar no TikTok e decidi focar nisso”, conta.

@jaqueestacomendo Responder @lymircia #comendo #sushi #comidajaponesa #mukbang ♬ A cute little background music – hajime saito

Uma nova Jaque

Entretanto, após as restrições alimentares que viveu pós-transplante, Jaque ainda está retomando a alimentação. Um exemplo são vegetais crus, como saladas ou frutas, que foram proibidos por um período. Algo que antes era parte da rotina da blumenauense, agora precisam voltar a agradar o paladar.

“Além disso eu estou trabalhando o fato de que algo tão ruim como essa doença me trouxe algo bom, que é essa nova vida. Não quero que me cérebro deixe as duas coisas atreladas. Já até recebi comentários de pessoas dizendo que eu só fazia sucesso quando estava doente, mas sei que não é verdade”, diz.

Retomando os exercícios físicos, os encontros com os amigos e voltando a comer tudo que gosta, Jaque vive o momento de se redescobrir. Voltando a ganhar dinheiro e se sentindo uma “adulta normal”, ela já pode começar uma nova vida e deixar a versão doente para trás.

“Está sendo um processo de experimentar muito. Escolher como quero que sejam minha rotina e meus hábitos. E tá sendo bem interessante”, comemora.

Arquivo pessoal
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