Josué de Souza

Cientista social e professor, é autor do livro Religião, Política e Poder, pela EdiFurb.

No que nos transformamos quando crescemos?

Texto do colunista destaca a desigualdade social no Brasil que voltou a crescer

Vinícius é um garoto de cinco anos e possui uma irmã gêmea. Como toda criança desta idade, possui uma visão mágica da vida. Um dia no verão de 2020 percebeu pela primeira vez um morador de rua. Impressionado, perguntou ao pai porque tinham pessoas que moravam na rua.  Vinícius não tem compreensão disto, mas no Brasil, antes da crise da Covid-19 já havia em torno de 101 mil pessoas em situação de rua.

A Covid-19 é um parasita simples, sem metabolismo, desprovido de célula. Seu impacto ao redor do planeta é amplificado pelas condições econômicas desiguais que ele encontrou o mundo. Condições estas que não são naturais, mas foram geradas socialmente. Consequências das decisões de governos e indivíduos.

Segundo dados do Relatório Social Mundial 2020 das Nações Unidas, lançado em janeiro deste ano, desde os anos 90 a desigualdade cresceu em nações que abrigam 71% da população mundial. O próprio relatório assume que está difícil cumprir um dos objetivos do desenvolvimento sustentável estabelecidos pela ONU em 2015 que é de diminuir os índices de desigualdade no mundo.

Neste relatório, o Brasil que até pouco tempo atrás era exemplo de diminuição da desigualdade e de erradicação da pobreza, voltou a ser exemplo negativo. Nosso país é o vice-campeão mundial de concentração de renda. A parte mais rica da população que corresponde 1%, embolsa 28,3% do PIB. Perdemos apenas para o Catar (29%).

O socorro à crise do coronavírus é uma radiografia da mostra de como o governo brasileiro trata com a desigualdade. Aos bancos, R$ 1,2 trilhão, aos trabalhadores informais e desempregados, R$ 98,2 bilhões. Um valor que vai ser dividido por cerca 4,2 milhões de pessoas, que terão de enfrentar as mais diversas dificuldades burocráticas estatal.

O pequeno Vinícius tem o hábito de fazer uma oração antes de dormir. Nela fala sobre o dia que passou, pede bênçãos ao papai, à mamãe e à irmãzinha.  Um dia destes de quarentena, Vinícius pediu para o papai do céu cuidar das pessoas que não tem casas, “pois elas não teriam onde se esconder do vírus.”  Naquela noite eu fui dormir pensando no que as crianças se transformam quando se tornam adultas.

 

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