Sindicatos criam novas maneiras de arrecadação após extinção de imposto

Instituições empresariais e de trabalhadores vivem o mesmo drama: manter serviços com bem menos dinheiro no caixa

Funcionários de uma empresa de TI de Blumenau receberam neste ano um convite corporativo inusitado. Os patrões sugeriam a participação dos empregados na assembleia do sindicato sobre o Acordo Coletivo do Trabalho.

Entre as cláusulas a serem ratificadas estava a exigência da contribuição anual ao sindicato, equivalente a 4% de um salário do colaborador, a mesma que a reforma trabalhista de 2017 tornou facultativa.

O episódio é curioso porque evidencia a aproximação dos sindicatos de empresários e trabalhadores após a mudança na legislação que retirou de ambos a arrecadação com o imposto sindical. No caso dos funcionários, ele era descontado na folha de pagamento anualmente.

Desde então, as instituições amargam quedas no caixa e buscam novas maneiras de financiar as atividades. A mais comum tem sido a de inserir a taxa negocial entre as cláusulas do Acordo Coletivo. Não há uma regra geral, mas os valores podem ser semelhantes ao imposto sindical.

Quem não paga, não pode usar os benefícios negociados entre as categorias, como questões envolvendo horas extras e feriados.

“O sindicato pode não homologar a rescisão do contrato de trabalho se o empregado não for associado a ele, por exemplo. ‘Se você não é meu associado, eu não trabalho para você'”, exemplifica o advogado trabalhista Thiago Souza Albuquerque.

Empresas

Entre as empresas, episódios parecidos têm ocorrido em Blumenau. No final do ano passado, o Sindilojas recorreu à taxa negocial como exigência para que os comerciantes pudessem estender o horário de atendimento no período natalino, já que a possibilidade havia sido negociada entre os sindicatos. A cláusula causou revolta em alguns empregadores, mas foi considerada válida pela Justiça.

Na prática, o patrão que não paga a taxa sindical e usufrui de cláusulas específicas do Acordo Coletivo corre o risco de ser denunciado pelos representantes dos colaboradores à Secretaria do Trabalho e multado. Em contrapartida, o funcionário não sindicalizado tem acesso a benefícios previstos nos acordos coletivos de qualquer maneira. A lei continua protegendo-o.

Sobrevivência

Albuquerque acredita que tanto a representação patronal quanto a laboral sentem impactos com o fim do imposto. O presidente do Sindilojas, Emílio Schramm, estima que arrecadação despencou 40% desde a reforma. A diminuição é geral.

Outro sindicato ouvido pela reportagem, o dos Trabalhadores nas Indústrias de Fiação e Tecelagem de Blumenau (Sintrafite), diz que passou a registrar um déficit anual de R$ 700 mil.

O diretor executivo do Sindicato Patronal das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e do Material Elétrico (Simmeb), Maurício Rossa, defende que, apesar do repasse ter sido extinto para as duas representações, a laboral é a que tem sentido mais:

“Nós temos realidades diferentes. No patronal, eu consigo oferecer produtos para as empresas e buscar novos subsídios. No dos trabalhadores, a dificuldade é maior porque ele tem dificuldade de fazer eventos e envolver os empregados”, analisa Rossa.

Nas instituições voltadas aos trabalhadores, a meta é não deixar de oferecer serviços. No Sindicato dos Empregados do Comércio (Sec), a assessoria jurídica e convênios continuam os mesmos, mas a queda de 85% na arrecadação com o imposto pode inviabilizar a existência da instituição daqui a dois anos:

“Nós estamos trabalhando com a reserva que poupamos durante anos, mas se nada mudar, não vai ter como continuar. Já há sindicatos menores que estão sendo absorvidos por maiores. Nós incorporamos o sindicato de contabilidade, por exemplo”, detalha o vice-presidente do Sec, Silvio Schaefer.

No Sintrafite, 12 pessoas foram demitidas e alguns eventos de lazer se tornaram menos frequentes. De acordo com a presidente Vivian Kreutzfeld, os serviços sociais, como assessoria jurídica e médicos, não sofreram alterações.

“Só não sei se vamos conseguir manter daqui pra frente, porque temos a Medida Provisória (MP) do governo Bolsonaro, a 873…”, lamenta Vivian.

MP 873

A MP dificulta ainda mais a cobrança das contribuições sindicais. Elas deixariam de ser descontadas em folha de pagamento e os sindicatos teriam de emitir boleto bancário, “que será encaminhado obrigatoriamente à residência do empregado ou, na hipótese de impossibilidade de recebimento, à sede da empresa”.

Para Vivian, a mudança significa uma dificuldade a mais para as instituições, que poderiam acabar após novo desincentivo:

“Se o trabalhador assina a ficha de associação dizendo que quer descontar a mensalidade da folha de pagamento, quem é o governo para proibir isso? Por que não proíbe outras coisas da folha? Por que só os sindicatos?”, questiona.

O Sindicato Único dos Trabalhadores no Serviço Público (Sintraseb) entrou com ação na Justiça e conseguiu liminar para que os descontos continuem sendo feitos nas folhas.

Desde março, com a assinatura da MP, uma equipe do Sec vai até a sede das empresas para cobrar os sindicalizados ou liga e pede que o contribuinte passe no sindicato para quitar a mensalidade. Para Schaefer, criou-se “um transtorno”.

A medida caduca nesta sexta-feira, 28. Sem previsão de ir à votação no Congresso, deve perder o efeito.

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