A história da sede da maternidade Johannastift, que completa 100 anos em 2023
Capa: Fotografia da Johannastift, feita na década de 1930 pelo pastor Leonhard Grau. A arquitetura da maternidade tinha aspectos de “uma casa” rodeada de cerca trabalhada e jardim.
A sede da Maternidade “Johannastift”, do Hotel Alameda, da Turismo Holzmann, dos Restaurantes Zum Weissen Rössel (Cavalinho Branco) e Escola do SENAC “Bistrô Johannastift” e da Casa de Comércio de Blumenau, é uma das tipologias mais emblemáticas e bonitas construídas no início do século XX, na centralidade de Blumenau, dotada de grande decorativismo e arte presentes nos seus detalhes que compõem os dois pavimentos, a mansarda ou o sótão e o Keller, ou porão.
Esta, em processo de ruinificação, após as grandes enchentes de 1983 e 1984, estado que registramos e que nutria grande preocupação, cujo estudo levantamos em 1997, a fim de sensibilizar os responsáveis na época e que, felizmente, aconteceu fazendo com que esta obra de arte arquitetônica marcasse a esquina da Alameda Rio Branco com a Rua Sete de Setembro.
Um pouco de História.
O edifício histórico apresentado aqui foi resultado da ação de mulheres de Blumenau, no início do século XX. Qual seria a origem da união das mulheres de uma comunidade em torno de uma ação social há mais de 100 anos?
Tudo começou na Europa. Mais especificamente nas regiões de onde vieram essas mulheres para Blumenau, no final do século XIX e início do século XX, com origem predominante da Prússia, sob uma sociedade denominada Sociedade Evangélica de Senhoras.
Na época, durante uma batalha decisiva na Europa, quando ocorreu a Batalha das Nações ou Batalha de Leipzig ocorrida em 1813, na cidade alemã de Leipzig, entre o exército de Napoleão Bonaparte e os exércitos de Rússia, Prússia, Áustria e Suécia e que culminou com a derrota de Napoleão.
Nesse período, a partir de 1813, mulheres do território que hoje é parte da Alemanha, se uniram de maneira organizada, seguindo a orientação de oito princesas da Província da Prússia. As mulheres se organizaram em inúmeras sociedades, que angariavam, através de iniciativas de sua sócias, ofertas de dinheiro, joias e outros donativos de valor, como também o trabalho para a reconstrução e libertação, como por exemplo:
- Sociedade Feminina de Assistência aos Pobres e Emfermos, fundada em Hamburgo no ano de 1831;
- Lette Verein, fundada em Berlim no ano de 1886 (formação profissional de moças e mulheres);
- Cruz Vermelha, século XIX, irmandade de enfermeiras;
- Liga de Zehlendorf, também uma irmandade de enfermeiras e de onde vinha “irmãs” para Blumenau e auxiliares o trabalho da sociedade de mulheres da cidade – ajudaram a fundar o Hospital Santa Catarina.
Mesmo findada a guerra, a região de povos alemães e também outras, da Europa, sofreram graves consequências resultantes da célere industrialização (tardia) responsável por ondas migratórias do campo em direção às cidades, despreparadas para receber um aumento populacional.
O resultado disso foram desajustes sociais, com grande número de desempregados, morando mal e em áreas improprias e de grande pobreza.
Muitos desses grupos de mulheres passaram a se dedicar ao trabalho social, especialmente com foco nas famílias migrantes do campo para as periferias das cidades e que muitas vezes, apresentavam algum membro da família, também doente.
Algumas das mulheres contemporâneas deste período histórico e também sócias atuantes de algumas destas iniciativas de sociedades, faziam parte das famílias pioneiras que migraram para a Colônia Blumenau no início da segunda metade do século XIX.
O ideário destas iniciativas sociais veio junto com as mulheres imigrantes, que predominantemente eram de famílias luteranas.
Seis décadas após a fundação da Colônia Blumenau, elas criaram uma sociedade de mulheres dentro da comunidade luterana da colônia que seguia o exemplo da Primeira Imperatriz da Alemanha, a Imperatriz Auguste Viktoria Friederike Luise Feodora Jenny von Schleswig-Holstein-Sonderburg-Augustenburg, que solicitou que a sociedade fundada por seu marido Wilhelm II – Imperador Alemão e Rei da Prússia, em 1888, a Sociedade Auxiliadora Evangélico-Eclesiástica formada somente por homens, também aceitasse as mulheres para participar dos trabalhos sociais. Não somente assim aconteceu, como também a sociedade esteve sob a direção da Imperatriz Auguste Viktória.
Em 1897, a Imperatriz Viktoria Friederike fez o seguinte pronunciamento, escrevendo escrevendo ao presidente da Sociedade:
“Aqui se abre um campo de trabalho vasto e bonito para as nossas mulheres e adolescentes, cujo coração e mãos são mais hábeis para este trabalho do que as atividades dos homens, tão ocupados com os compromissos profissionais. Por isso, é a elas que dirijo meu pedido cordial de que ingressem e ajudem, a fim de que possamos transmitir e conservar ao nosso povo as bênçãos do Evangelho em proporção cada vez maior.” Imperatriz Viktoria Friederike
Em 1° de janeiro de 1899 foi criada a Sociedade Frauenhilfe (Auxílio de mulheres) dentro comunidade luterana, na Alemanha. A Imperatriz Viktoria Friederike foi sua patrona. A sociedade chegou a 249.000 mulheres associadas.
O objetivo principal, como sempre era, era de atender às pessoas pobres e doentes. A primeira reunião da sociedade fundada em Blumenau aconteceu em 2 de setembro de 1907, na qual foi aprovado o estatuto. Denominou-se Sociedade Evangélica de Senhoras, oficializando, formalmente, a sociedade de mulheres de Blumenau.
Estiveram presentes:
- Mildred Mummelthey;
- Nanny Pöthig;
- Elsbeth Emma Koehler (irmã do Superintendente Alwin Schrader);
- Wanda Blohm;
- Hedwig Kunzer;
- Klara (Kleine) Hering (1878 – 1964)
- Johanna Hering;
Auguste Schrader; - Charlotte (Kegel)Hering (1861 – 1935);
- Hedwig Rieschbieter;
- Agnes (Probst) Sachtleben;
- Maria Haertel;
- Elise Steinbach;
- Caroline Probst;
- Appolonia Scheefer.
Mildred Mummelthey foi enfermeira da Cruz Vermelha, na Inglaterra, antes de se casar com o Pastor Walther Mummelthey e de vir para o Brasil, na companhia de seu marido. Fundada, a nova sociedade recebeu auxílio da sociedade alemã Auxílio de Mulheres para o Exterior, organizada em 1908.
Isso foi possível por intermédio das diaconisas enviadas para Blumenau e que trabalharam na sociedade. As primeiras diaconisas que vieram para Blumenau e Brasil, foram: Martha Linke e Auguste Küchler, já em 1909.
Na primeira reunião das sócias foi debatido e aprovado o estatuto, este elaborado por Mildred e também, foi formada a primeira diretoria:
- Presidente: Mildred Mummelthey (esposa do pastor Walther Mummelthey);
- Secretária: Elsbeth Koehler (irmã do superintendente Alwin Schrader);
- Tesoureira: Nanny Kegel (Poethig) (cunhada de Charlotte Hering);
- Conselheiras: Wanda Blohm e Hedwig Kuenzer.
Em 1907 tornaram-se associadas ainda: Gertrud Gross, Hedwig Hering, Ellen Feddersen, Margarete Mueller, Helene Altenburg, Berta Odebrechht, Elsbeth Koehler e Bertha Brandes.
O estatuto foi publicado no jornal Der Christenbote, em 3 de março de 1908.
Estatuto:
1- A Sociedade Evangélica de Senhoras tem por objetivo cuidar de pobres e doentes na cidade de Blumenau e nos distritos coloniais pertencentes à cidade de Blumenau: Garcia, Velha, Itoupava Seca, Itoupava Norte, Gaspar e Belchior.
2- Podem se associar à associação todas as mulheres e moças maiores de 18 anos de religião protestante e que possuam domicílio na freguesia de Blumenau. A adesão é obtida através do registro feito no conselho; expira por cancelamento de registro ou por recusa do pagamento da taxa de filiação.
3- A contribuição anual, que deve ser paga em janeiro, é fixada em 6$000 (seis mil réis) ou mensalmente $500. Quem quiser inscrever-se na Sociedade como membro-fundador paga 100$000 e está livre de qualquer contribuição mensal; quem quiser associar-se como benfeitor, paga 50$000. Como sócios fundadores e como benfeitores também homens são bem-vindos.
4- A diretoria se compõe de seis senhoras: a presidente, a secretária, a tesoureira e três conselheiras. A diretoria deve realizar, no mínimo, três reuniões ao ano; ela é eleita para um mandato de três anos.
5- No mês de janeiro de cada ano realiza-se a Assembleia Geral da Sociedade. Esta tem poder para tomar decisões quando dois terços dos membros estão presentes. Na Assembleia Geral, a diretoria apresenta seu relatório; além disto, assuntos importantes são abordados e decididos.
6- É permitido doar, em lugar da contribuição anual: roupas, vinho, fortificantes, etc.
7- Membros da diretoria assumem o compromisso de pagar a contribuição em dinheiro.
8- Sobre o que foi doado e recebido pela Sociedade: dinheiro, roupas, vinho, fortificantes, etc., bem como sobre sua utilização, a diretoria deve manter registro exato para que a sua utilização possa ser constatada.
9- A Sociedade adquire, com seus meios, objetos (por exemplo banheiras, etc.), cabendo à diretoria o empréstimo.
10- Tanto a área da cidade como as áreas externas serão divididas em distritos; para cada distrito será eleita, respectivamente nomeada pela diretoria, uma coordenadora que deve comunicar à diretoria cada caso de ajuda.
11- A Sociedade se dissolve quando o número de associadas for menor que seis. Os bens, neste caso, passam à diretoria da Comunidade Evangélica de Blumenau.
Em 20 de abril de 1914 os estatutos foram revisados e registrados e em 5 de setembro de 1938, foram substituídos por novos estatutos aprovados em assembleia e registrados neste mesmo ano.
Em 1909, a sociedade das mulheres possuíam em caixa, a quantidade 1.113$000 (um conto e cento e treze mil réis), oriunda das contribuições que as associadas pagavam. Atualmente, um conto de Réis, ou mil merréis, valem R$ 123.000,00. Então, a Sociedade de Senhoras possuíam em caixa, para ajudar os pobres e doentes: R$ 136.899,00 (Cento e trinta e seis mil e oitocentos e noventa e nove reais).
Com a chegada das Irmãs Martha Linke e Auguste Küchler, a Sociedade de Senhoras avaliou o contrato com a entidade de Zehlendorf e o assinou. Depois foi alugada uma casa para alojar as irmãs que estava localizada na antiga Kaiserstrasse, atual Alameda Rio Branco, local da esquina com a Rua Sete de Setembro, ou, como diz a ata de fevereiro de 1909 – “perto do Holetz” (o mesmo do Hotel Holetz), expressão da ata. A Frau Holetz fornecia alimentação às irmãs por 50$000 mensais, ou R$ 6.150,00. As sócias providenciaram móveis e artigos para “montar” a casa das diaconisas.
Em 1912, iniciaram-se os contatos com a entidade Frauenhilfe fürs Ausland (Auxílio de Mulheres para o Exterior), de Wittenberg. Em 1913 chegaram em Blumenau, as primeiras diaconisas de Wittenberg: Lina Jeguschke e Gertrud Voigt. Em 1914, a Sociedade de Senhoras resolveu comprar um cavalo para que elas pudessem se locomover e chegar aos lugares mais afastados, onde assistiam aos partos, nas casas das famílias.
Não demorou muito surgiu a ideia de se construir uma maternidade, onde as mulheres pudessem ser atendidas com segurança e com menor trabalho para a equipe de poio, pois aconteceu de algumas vezes, de senhoras grávidas terem que ficar hospedadas na residência das irmãs, aguardando o bom momento, pois moravam distantes e o dia do nascimento do bebê era incerto.
Em 27 de junho de 1920 foi inaugurado o Hospital Santa Catarina, resultado de uma sugestão de Mildred Mummelthey, esposa do Pastor Walther Mummelthey. Mildred foi enfermeira da Cruz Vermelha na Inglaterra.
Com a materialização do hospital, naturalmente surgiu a ideia da maternidade no seio da sociedade. Johanna Hering, irmã de Gertrud Gross doou o terreno na Kaiserstrasse, atual Alameda Rio Branco, no qual seria construído o e edifício Johannastift.
Johannastift (Fundação Johanna) – A Maternidade
Em 1920, Johanna Helene Hering doou o terreno para a construção da Maternidade, e sua irmã Gertrud Gross doou o valor de 200$000 (duzentos mil réis), com o qual se iniciou a arrecadação para construir a maternidade.
Em 1º de março de 1922, foi decidido em reunião, que a construção da maternidade deveria ser iniciada.
O primeiro projeto foi assinado pelo arquiteto Wilhelm Kaulisch Senior, tendo sido aprovado em 26 de abril de 1920 e em 27 de abril de 1922, é iniciada a obra.
O projeto de Kaulisch procurou recriar o ambiente familiar desprovido do aspecto hospitalar.
A forma e os detalhes distribuídos em dois pavimentos, porão e sótão, reportam à casa da família. De maneira festiva, a pedra fundamental da maternidade foi lançada em 7 de setembro de 1922.
O sobrinho dos irmãos Hering, primo de Johanna e de Gertrudes e marido de Elsbeth Koehler, que era editor de jornal, Gustav Arthur Koehler publicou o ocorrido em 15 de setembro no Urwaldsbote. O aspecto curioso é que um documento de sua autoria foi colocado na urna junto à pedra fundamental do Johannastift, com o seguinte conteúdo:
Maternidade Johannastift
“No dia 7 de setembro de 1922, no Centenário da Independência do Brasil, foi lançada a pedra fundamental para esta casa.
No Rio de Janeiro regia o Sr. Dr. Epitácio Pessoa como Presidente da República; em Santa Catarina, o Governador substituto era o Sr. Raulino Horn; como Governador para os quatro anos vindouros foi eleito o Sr. Dr. Hercílio Luz, hoje Vice-Governador.
Em Blumenau, o Sr. Paul Zimmermann é o Superintendente; o Presidente da Câmara é o Sr. Dr. Victor Konder, e o Juiz de Direito é o Sr. Dr. Amadeu Felipe da Luz.
A Sociedade Evangélica de Senhoras colocou esta pedra fundamental para uma maternidade. A entidade quer conforto, um lar onde as parturientes encontrem sossego, ajuda e cuidados, para assim crescer uma geração sadia em Blumenau. O terreno, no qual esta casa será edificada, foi em 1920 doado à Sociedade pela senhora Johanna Hering. Ela quer também ajudar a Sociedade a terminar a construção. Por isso, a Assembleia decidiu dar o nome de Johannastift a esta casa.
O Johannastift será dirigido pelas irmãs diaconisas da entidade “Ajuda à Mulher no Exterior”, da cidade de Wittenberg, a cidade de Luther.
A Sociedade Evangélica de Senhoras conta hoje com cento e cinqüenta e cinco associadas e a diretoria é a seguinte: Presidente: Sra. Elsbeth Koehler; Tesoureira: Nanny Poethig; Secretário: Sr. Pastor Eberhard Neumann, e conselheiras: Sra. Bertha Brandes, Sra. Marie Hiendlmayer, Sra. Sophie Mendel e Srta. Margarete Freygang.
Na Sociedade está incluída a Sociedade de Garcia, com trinta e seis associadas.
A construção será dirigida pelo arquiteto Sr. Wilhelm Kaulisch. A comissão de construção é formada pela Sra. Elsbeth Koehler, Sra. Johanna Hering, Sr. Leopold Hoeschl e Sr. Max Hering, que representam os interesses da Sociedade.
A decisão da construção foi tomada em 27 de março de 1922. Os custos foram orçados em mais ou menos 40.000$000 (quarenta contos de réis).
À pedra fundamental juntamos este documento em duas línguas, a do país e em alemão, a língua das associadas.
Pedimos a Deus, nosso Senhor, que abençoe esta casa e conceda bênção por intermédio da mesma. Seja sobre nós a graça do Senhor nosso Deus. Confirma sobre nós as obras das nossas mãos, sim, confirma a obra das nossas mãos!” Amém.
Gustav Arthur Koehler
Em 30 de setembro de 1923, o Johannastift foi inaugurado. Estará completando, em 30 de setembro de 2023, 100 anos de sua inauguração. Os custos da obra inaugurada somaram 65:712$750, constatando-se que havia um débito no valor de 20:500$000.
O dia 30 de setembro de 1923 foi escolhido por ser o dia de aniversário de Johanna Hering. Neste ano, a Sociedade contava com cento e sessenta e três associadas.
Frau Holetz doou uma área de terra de quatrocentos e cinquenta metros quadrados ao lado do Johannastift. Nesta área, a irmã Bertha Kuehn preparou uma horta, que por muitos anos fornecia as verduras para a cozinha da maternidade.
Em 1925, o número de associadas da sociedade era de duzentos e uma mulheres. Neste ano, Johanna Hering foi homenageada, e passou a ser “Sócia Honorária”, que em 1910, fora concedida à fundadora e primeira presidente, Mildred Mummelthey.
Na assembleia anual de 1926 constatou-se que a maternidade era autossustentável. No ano anterior houvera um superávit de 4:227$350 (quatro contos, duzentos e vinte e sete mil, trezentos e cinquenta mil réis).
Elsbeth Koehler iniciou tratativas para a compra de um terreno localizado ao lado do Johannastift. Decidiram ampliar o edifício da maternidade. Em 1931 iniciou o trabalho de ampliação da área do Johannastift, cujo projeto esteve sob reponsabilidade do engenheiro arquiteto Franz von Knoblauch.
Knoblauch projetou e construiu a nova ala a partir de uma perfeita integração à primeira parte da construção, respeitando o partido arquitetônico pré-existente. aparentemente a ampliação passa desapercebido para olhos menos atentos. O conjunto ficou simétrico e integrado, a partir de suas fachadas. Johannastift foi reinaugurada em 13 de março de 1932, ano em que se comemorou o Jubileu de Prata da Sociedade. Nesta ocasião Elsbeth Koehler apresentou o histórico da entidade.
O Boletim Informativo Daheim und Draussen, da Casa Matriz de Wittenberg, de onde vinham as diaconisas e com a qual a Sociedade Evangélica de Senhoras tinha bom relacionamento, publicou artigo sobre o Jubileu de Prata, enaltecendo a sociedade. Neste tempo atuavam em Blumenau dez diaconisas, sendo seis no Hospital Santa Catarina, três no Johannastift e uma no Garcia. Duas diaconisas que trabalhavam no Johannastift eram parteiras e a terceira era Gemeindeschwester (irmã para tarefas comunitárias), que tinha a tarefa de visitar doentes e idosos, cabendo-lhe ainda formar e dirigir o grupo de jovens (moças), além do culto infantil.
Em 1938, foram modificados os estatutos. Chegando os “ares do Nacionalismo”. Foram aceitas e aprovadas em assembleia as sugestões elaboradas pelo advogado Edgar Barreto. O parágrafo único do 2º artigo destes estatutos deixa entrever o que dificultava a existência da Sociedade Evangélica de Senhoras: “A sociedade não terá ligações com sociedades estrangeiras”. Este parágrafo dos estatutos, bem como a renovação do contrato com o médico chefe do Johannastift, Armando Odebrecht, são sinais da cautela que a situação política nacional e internacional impunha.
Durante o período da segunda Guerra Mundial a entidade esteve sob as ações do nacionalismo. Período de silêncio. Não aconteceram reuniões, nem dos grupos e nem da diretoria. Nem mesmo aconteceram as assembleias anuais. O trabalho das irmãs continuou no Johannastift.
“Durante a Segunda Guerra Mundial, a Sociedade Evangélica de Senhoras não podia exercer mais as suas atividades como antes, porém os serviços na maternidade Johannastift continuavam da mesma forma. Naturalmente, nossa maternidade sentiu também os efeitos da guerra. Assim, como sei, certo dia as duas irmãs – Irmã Auguste e Irmã Lotte – chegaram nervosas à minha mãe e contaram que um médico (não lembro mais o seu nome, só sei que já não está mais em Blumenau) estivera lá na maternidade e dissera que era uma pena estar a sala do andar térreo vazia e anunciara que nos próximos dias ele viria ali instalar o seu consultório. Começou então uma atividade febril. Minha mãe correu logo a um marceneiro, e os homens vieram em seguida com sarrafos e tábuas para montarem instalações na sala. Comprou-se fazenda para as cortinas. As máquinas de costura não paravam de trabalhar. As cortinas foram pregadas e seis pequenos apartamentos instalados no salão. Em cada um destes apartamentos foram colocadas uma cama e uma mesinha de cabeceira. Quando, após três dias, veio o médico para tomar medidas para a instalação de seu consultório, já estavam três apartamentos ocupados com parturientes da sala da terceira classe. Assim, o médico não pôde mais dispor sobre o espaço supérfluo vazio. A grande sala do andar térreo era, em geral, ocupada para reuniões maiores das senhoras, ou assembleias; mas, como durante a guerra eram proibidas tais reuniões, elas deixaram de se realizar e, assim, a sala ficara sem a sua habitual utilidade.”Hertha Hildebrand
Passado algum tempo, Elsbeth Koehler saiu do cargo de presidente e assumiu a sua filha, Hertha Hildebrand. Esta e a tesoureira Vera Stodieck deram início à construção da nova maternidade, que recebeu o nome de Elsbeth Koehler, tendo sido inaugurada em 16 de setembro de 1951. Ernesto Stodieck, esposo de Vera, conseguiu um empréstimo da Caixa Econômica Federal para terminar a obra. Em setembro de 1951, o Johannastift encerra, então, as atividades de maternidade no edifício histórico da Alameda Rio Branco, esquina com a Sete de Setembro, para assentá-la na nova edificação, renomeada de Elsbeth Koehler e localizada na Rua Pastor Stutzer, 319.
De acordo com o planejamento da sociedade, o edifício histórico desocupado e que continuava sendo de propriedade da Sociedade Evangélica de Senhoras de Blumenau – SESB, seria então uma fonte de renda para apoio à nova Maternidade, contribuindo com o pagamento mensal do empréstimo feito junto à Caixa Econômica Federal.
Dessa maneira, o edifício histórico foi alugado para ser hotel-pensão – conhecido Hotel Alameda. Entre os hóspedes, residiu no local o florianopolitano Antônio Pedro Nunes, futuro Secretário de Turismo de Blumenau, que vislumbrou possibilidades para o local, além das de hotel. Em 1968, casado com Marga Holzmann, da família do empresário que possuía a primeira agencia de turismo de Blumenau e do estado de Santa Catarina, alugou o edifício e instalou no pavimento térreo um restaurante de gastronomia alemã. Conhecia muito bem a Alemanha e suas festas. Sua empresa de turismo era especialista em organizar viagens para aquele país e Nunes tinha sensibilidade para perceber a autenticidade da arquitetura da antiga maternidade Johannastift, preterida para a arquitetura de um edifício novo. Foram efetuadas adequações e restauro e, em 11 de dezembro de 1969, foi inaugurado o Restaurante Zum Weissen Rössel, nome inspirado na Alemanha, também chamado de Cavalinho Branco. Antônio Pedro Nunes também foi o idealizador da Banda Cavalinho Branco.
Além da gastronomia, colocou música alemã e criou a Banda Cavalinho Branco, que tocava no restaurante. Sua primeira formação foi:
- Acordeon: Döring (Rigo)
- Trompete: Marcos Döring
- Marciel Döring
- Sax e Clarinete: Marcos Novaski
- Bateria e ritmo: Perfeito Aguiar
- Contrabaixo: Osni Sievert
A grande enchente de 1983 inundou o restaurante por dias e também o pavimento superior do edifício histórico, atingindo as instalações da Turismo Holzmann. em 1984, a enchente aconteceu novamente e destruiu tudo o que tinha sido recuperado no últimos meses e comprometeu muito a edificação histórica. A Sociedade Evangélica das Senhoras de Blumenau deixou de cobrar o aluguel para que o restaurante se recuperasse. O estado de conservação do edifício ficou muito ruim, e entrou em processo de degradação.
A Presidente da Sociedade Evangélica de Senhoras de Blumenau em 1991 era Elise Stodieck e tinha grande preocupação com o estado do edifício histórico, mas não havia recursos para recuperá-lo. Em 1995 houve a rescisão de contrato com com Holzmann Turismo, que recebeu um prazo para desocupar o local. A Holzmann Turismo esteve nesse endereço por 25 anos.
O edifício histórico precisava de um restauro e manutenção.
A Câmara dos Dirigentes Logistas – CDL tinha interesse no ponto e no edifício, que era um ponto focal natural e histórico dentro da cidade de Blumenau. Seu presidente era Arno Buerger Filho, que procurou o escritório de Arquitetura Arkhétypos Arquitetura para uma sondagem sobre um projeto e o trabalho para recuperar o espaço.
Neste tempo foram efetuado algumas ações paliativas como a redução da infiltração de água no interior através de consertos provisórios no telhado e nas aberturas e melhoria na segurança dos acessos para evitar invasão.
A equipe do escritório de arquitetura declarou que “…após vária enchentes, o edifício apresentava um estado de conservação satisfatório. Por existir vários pontos de infiltração de água, principalmente no telhado, durante muito tempo, o estado geral da edificação ficou seriamente comprometido. A área adjacente, o entorno imediato da edificação era usado como estacionamento privado mensalista.”
A proposta do CDL, a princípio era criar um Kultur-und Handelszentrum (Centro de Cultura e Comércio). Nesse tempo, sabia-se que o edifício era tombado e fazia parte do Cadastro do Patrimônio Histórico Municipal que estava sob as determinações da Lei Complementar N° 79 e nessa Lei seria observado o Capítulo V – Do incentivo Construtivo, que no caso de restauro e cuidado com o patrimônio, o interessado receberia a autorização e o direito de construir acima do limite permitido na área em questão. Houve um acordo entre a Sociedade das Senhoras e o CDL, firmado em 16 de fevereiro de 1998. O Presidente do CDL e sua diretoria iniciaram a busca por incentivos fiscais através da Lei Rouanet. O escritório de arquitetura Arkhétypos teve o primeiro projeto aprovado pela Lei Rouanet, em Blumenau, recente a esse episódio. Foi efetuada uma permuta, na qual a Sociedade das Senhoras receberia em troca, o aluguel das cinco salas do Edifício Catarinense até o momento em que a CDL se mudasse para o edifício histórico restaurado, a partir do início do acordo de vinte anos.
Patrimônio Histórico – Jornal de Santa Catarina
CDL agiliza reforma do Cavalinho Branco
De acordo com Arno Buerger, há muito interessados em participar da recuperação do prédio inaugurado em 1923.
“BLUMENAU A proposta de restauração do prédio onde ficava o restaurante Cavalinho Branco, desenvolvido pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), já está com a proposta de reforma concluída. O CDL recebeu na sexta-feira o ante- projeto, desenvolvido pelo arquiteto João Francisco Noll, do Departamento de Administração do Campus (DAC) da Universidade Regional de Blumenau (Furb), e agora parte para o início da captação de recursos com patrocinadores, que vão viabilizar a reforma. O presidente do CDL, Arno Buerger Filho, anunciou no sábado que o ex-prefeito Renato Vianna decidiu doar à entidade a casa de propriedade de sua família que fica na Rua Itajaí, ao lado do Hospital Santa Isabel. A casa é um patrimônio histórico do município e a intenção é transportá-la para o pátio do prédio do Cavalinho Branco.
Buerger Filho, explica que há muitos interessados em participar da recuperação do prédio, inaugurado em 1923 para sediar a maternidade Johannastift. O CDL ainda vai definir se o projeto final será executado pelo Departamento de Arquitetura da Furb, ou pelo arquiteto do DAC ou ainda por um outro arquiteto. Segundo Buerger, o book sobre a história da edificação já está pronto e o prazo determinado para o início das obras é de 210 dias, o que expira em julho deste ano.
O coordenador do departamento de arquitetura da Furb Stênio Vieira, ressalta que a iniciativa do CDL é extremamente louvável e que a universidade se sentirá honrada em participar. Mas, por ser um dos prédios mais significativos na arquitetura da região, ele acredita que o restauro deve ser feito por um arquiteto especializado. ‘Muitos alunos gostariam de ver este projeto aqui no departamento de arquitetura’, diz Vieira. Ele informou que vai mandar esta semana uma correspondência ao CDL e ao reitor para explicar a situação.
A reforma do prédio do Cavalinho Branco prevê a construção de um espaço que servirá como sala de visitas de Blumenau, onde o público da cidade e os visitantes poderão conhecer um pouco da história do município. O novo prédio vai se chamar Kultur-und Handelszentrum (Centro de Cultura e Comércio).
O local abrigará espaços para lançamento, divulgação e exposição de todas as atividades artísticas, culturais e econômicas da comunidade. Serão criadas salas de vídeo, teatro e serviço de bar. Também haverá espaço para que artesãos possam trabalhar, mostrando um pouco das tradições da região aos turistas.” JSC
As conversações evoluíram no decorrer de muitas reuniões das diretorias do CDL, Presidente Arno Buerger Filho e da Sociedade Evangélica de Senhoras de Blumenau, cuja presidente era Elise Stodieck. Nessa trocas foram sendo acertados detalhes e em 2002 foi assinado um contrato de arrendamento por parte da Câmara de Dirigentes Lojistas de Blumenau – CDL e o Sindicato do Comércio Varejista de Blumenau, que coordenou o restauro do edifício histórico e a construção do anexo, este permitido de acordo com a Lei Complementar N° 79. O início das obras aconteceu em novembro de 2002. A festa da cumeeira oferecida pelo CDL, aconteceu em 9 de maio de 2003 com uma churrascada, contando com a presença de autoridades, parceiros e membros da Sociedade de Senhoras, oferecida pela CDL. A obra não teve um processo contínuo e permanente por falta de verbas que foram buscadas por iniciativas do CDL, até que foi concluída. A inauguração da Casa do Comércio aconteceu em 14 de Junho de 2007.
O térreo do edifício histórico foi destinado, como foi há muitos anos, para um restaurante. Desde 6 de outubro de 2005, o espaço já recebeu o Restaurante Escola do SENAC “Bistrô Johannastift”. Espaço encantador e muito apreciado por blumenauenses e visitantes. Por muito tempo o local gastronômico esteve sob responsabilidade do Chefe alemão Heiko Grabolle.
Em 2019, a CDL (Câmara de Dirigentes Lojistas de Blumenau) e o Sindilojas saíram do local, após o término do contrato de 20 anos sem a renovação. O local passou a ser ocupado pela Escola Barão, que pertence à Comunidade Luterana de Blumenau, destinando parte do espaço “criado” pelo CDL para a escola de arte Alameda Haus Artes e Idiomas. O edifício histórico nunca deixou de ser parte do patrimônio da Sociedade Evangélica de Senhoras de Blumenau – SESB, que surgiu para dar apoio aos pobres e aos enfermos, na região – no início do século XX.
- FCC – Fundação Catarinense de Cultura
- Nome atribuído: Antiga Maternidade Johannastift
- Outros Nomes: Prédio do Cavalinho Branco
- Localização: Alameda Rio Branco, nº 165 – Blumenau-SC
- Número do Processo: Nº 117/2000
- Resolução de Tombamento: Decreto Nº 1.070, de 31/03/2000
Em julho de 2023, o contrato de locação com o Restaurante Escola do SENAC “Bistrô Johannastift” e a Sociedade Evangélica de Senhoras de Blumenau não foi renovado sendo que, em 7 de julho de 2023 foi o último dia do restaurante – em atendimento ao público.
Depois de mais de 70 anos, o espaço da Johannastift, construído pela entidade sem fins lucrativos Sociedade Evangélica de Senhoras de Blumenau – SESB, para atender gestantes de Blumenau e região, entre outras atividades de atendimentos aos pobres e enfermos, retorna às atividades da sociedade que a idealizara para fins sociais. Isso aconteceu, após completar 20 anos de seu amplo restauro e acréscimo de novas áreas, em anexo, ao edifício histórico que foi coordenado pela Câmara de Dirigentes Lojistas de Blumenau – CDL e o Sindilojas.
Um registro para a História.
Referências:
- BERGAMANN, Von Lukas. Industrialisierung in Deutschland – Urbanisierung in Deutschland. Planet Wissen. Disponível em: https://www.planet-wissen.de/gesellschaft/wirtschaft/industrialisierung_in_deutschland/industrialisierung-deutschland-urbanisierung-100.html . Acesso em: 17 de julho de 2023 – 10h52.
- Centenário Sociedade Evangélica de Senhoras de Blumenau: 1907 – 2007 / [Organização: P. em. Meinrad Piske]. – Blumenau: O. Kuhr, 2007. 64p. ISBN: 978-85-87524-49-2.
- DAY, Adalberto. O Cavalinho Branco. Disponível em: https://adalbertoday.blogspot.com/2007/12/o-o-cavalinho-nranco.html . Acesso em: 19/07/2023 – 12h23.
- GERLACH, Gilberto Schmidt. Colônia Blumenau no Sul do Brasil / Gilberto Schmidt-Gerlach, Bruno Kilian Kadletz, Marcondes Marchetti, pesquisa; Gilberto Schmidt-Gerlach, organização; tradução Pedro Jungmann. – São José: Clube de Cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 2 t. (400 p.): il., retrs.
- Jornal de Santa Catarina. Geral – Cidades. Patrimônio Histórico. CDL agiliza reforma do Cavalinho Branco. Caderno B. Blumenau, 5 e 6 de abril de 1998.
- SANTIAGO, Nelson Marcelo. ACIB – 100 anos Construindo Blumenau. Blumenau. Editora Expressão, 2001. 204p il.:
- Trilhas do Patrimônio. Centro Histórico, Sindilojas. Antiga Maternidade Johannastift. Blumenau. Disponível em: https://www.trilhasdopatrimonio.com.br/20 . Acesso em 17/07/2023 – 11h45.
- WIKIPÉDIA. Augusta Vitória de Eslésvico-Holsácia. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Augusta_Vit%C3%B3ria_de_Esl%C3%A9svico-Hols%C3%A1cia . Acesso em 17 de julho d e2023 – 11h17.
Leituras Complementares – Clicar sobre o título:
- Freya Schmalz Gross – Uma História – Arte e um amor de mais de 35 anos – Hans Broos
- O impacto do Nacionalismo de Getúlio Vargas no Vale do Itajaí, antiga Colônia Blumenau
- Arquiteto Hans Broos – Obra e Vida
- Banda Cavalinho Branco – Música
- Hospital Santa Catarina – Inauguração – Blumenau – 1920
- A História do Oktoberfest Blumenau – Desde 1984
- City Hotel – Blumenau SC – Edifício de 1964 – Arquitetura
Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
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Agenda
Nos próximos dias estaremos presentes na feira do livro de algumas cidades da região. Em breve mais informações.