A importância dos cemitérios como fonte de informações históricas e de arte
Capa: um dos túmulos mais interessantes por sua história e período, local que completou, neste ano de 2023, 146 anos de existência e onde está sepultado o pai do pioneiro Gottlieb Reif, personagem histórico que já teve espaço nesta coluna, como também no primeiro volume do livro “Fragmentos Históricos”. O patrimônio cemiterial está correndo riscos, assim como outros túmulos históricos, pelas ações de vandalismo e ausência de manutenção. O Cemitério Luterano de Itoupava Norte/Seca é um dos mais vandalizados e malcuidados cemitérios, dentre os mais de trinta, que já registramos para a série “Cemitérios”.
Hoje, em nossa coluna, não apresentaremos biografias de personalidades históricas, arquitetura históricas ou documentos. Nosso espaço, no presente artigo pretende apresentar a importância dos cemitérios, a partir de suas informações de genealogia, arte cemiterial, cultura, ocupação do espaço, tecnologia dos materiais, etc.
Sob o aspecto antropológico, são muitas as percepções e os rituais em torno da “última morada” – ao longo da linha do tempo da história das civilizações, dentro das muitas culturas – nos mais variados lugares do mundo.
Muito teríamos para dissertar e escrever sobre o Cemitério – palavra que deriva do latim: Coemeterium e significa “pôr a jazer” ou “fazer deitar”. Foi empregada pelos primeiros cristãos para designar os terrenos destinados ao sepultamento dos seus mortos. Seus cemitérios ficavam geralmente fora dos muros das cidades. As catacumbas, primeiros cemitérios subterrâneos dos cristãos estavam localizados nas principais vias que chegavam à Roma clássica.
A partir do século XVII começou a ocorrer falta de espaço para enterrar os mortos e, em muitos lugares, foram criados cemitérios afastados dos centros urbanos.
Em muitas cidades há cemitérios em que os ritos funerários são cumpridos de acordo com a religião. Também há cemitérios para o sepultamento de chefes militares e figuras públicas. O estilo arquitetônico das tumbas e as personalidades que estão enterradas em um cemitério fazem com que muitas vezes este se torne um ponto turístico e atraia muitos visitantes, como por exemplo, o Cemitério Père Lachaise – na cidade de Paris, que recebe milhares de pessoas do mundo inteiro, competindo com renomados museus e pontos turísticos da cidade.
Com as características atuais – o espaço do cemitério é recente. No mundo antigo – dentro da cultura egípcia – os homens viviam para organizar sua morte e são lembrados por seus túmulos – mastabas e pirâmides feitos para durar por toda a eternidade.
Os povos bárbaros, não enterravam seus mortos. Incineravam o corpo material e devolviam-no à natureza dentro de rituais. Os primeiros cristãos, como já mencionado – sepultavam seus mortos nas catacumbas, cavernas onde também faziam seus primeiros cultos. Quando o cristianismo se tornou a religião oficial do maior império do Ocidente – Roma – passaram a enterrar seus mortos nas igrejas.
A explosão demográfica e o risco de proliferação de doenças fizeram com que surgisse a proibição de prosseguir o sepultamento nas igrejas.
Passaram a sepultar no terreno das mesmas o que podemos constatar até os dias atuais, em algumas comunidades.
Alguns cemitérios que se destacam
Cemitério Acatólico de Roma – também conhecido como Cemitério dos Ingleses ou Cemitério Protestante. Fica em um dos mais romanos bairros da capital italiana, o Testaccio.
Cemitério Alter Johannisfriedhof – localizado no centro-oeste de Leipzig, cidade independente localizada no Estado da Saxônia, na Alemanha.
Cemitério Luterano Comunidade Centro Blumenau – O primeiro cemitério de Blumenau. Muitos dos nomes da história de Blumenau se encontram sepultado nesse cemitério. Esse cemitério nos inspirou este trabalho de resgate cemiterial por sua originalidade e importância.
Cemitério Bunhill Fields – localizado no meio do centro financeiro de Londres. Muito mais do que um cemitério, Bunhill Fields é considerado pelos londrinos como um parque e atrai desde casais até ciclistas e corredores.
Cemitério Complexo – museu Mêvlana – Konya – uma das cidades mais sagradas da Anatólia Central, na parte asiática da Turquia. Com mais de 1 milhão de habitantes, a cidade foi dominada pelos Seleucidas no início do século XI e incorporada ao Império Otomano.
Cemitério da Recoleta Buenos Aires – Arquitetura funerária em estilo grego neo-clássico.
Cemitério de Montparnasse Paris, local da capital francesa onde se encontram sepultados intelectuais, políticos e artistas franceses. Por esta razão, o cemitério é uma atração turística bastante popular.
Cemitério de Père Lachaise – mais antigo e o maior cemitério de Paris, com mais de 43 hectares de extensão.
Highgate Cemetery – localizado na região norte de Londres e foi inaugurado em 1839.
Cemitério de Schwanberg – Rödelsee – Sul da Alemanha – onde as pessoas são sepultadas sob as árvores de tílias no alto da montanha. A árvore recebe uma pequena placa metálica com a identificação. Prática das tribos Germânicas.
Cemitério e Arquitetura
Os cemitérios ainda podem ser esteticamente agradáveis por meio de edifícios, como por exemplo os característicos mausoléus ou pelo design artístico de sepulturas ou do complexo como um todo. Em 2010, cemitérios na Europa que valiam a pena conhecer e cumpriam altos padrões artísticos foram conectados entre si pela Rota Europeia da Cultura de Cemitérios, para visitação pública de valor turístico cultural.
No romantismo alemão, os cemitérios eram importantes em conexão com o motivo de desejar a morte. Essa visão idílica contradiz a percepção generalizada do cemitério como um lugar medonho. Pinturas e desenhos de Caspar David Friedriche Carl Gustav Carus mostram cemitérios – como igrejas, ruínas de mosteiros e sepulturas megalíticas – principalmente em solidão melancólica.
Nosso trabalho em andamento, através da coleta de dados, especificamente é o de montar uma amostra do tipo catalogação de locais integrantes da grande Colônia Blumenau e disponibilizar dados como nomes e datas de nascimento, bem como partida dos primeiros pioneiros de diferentes lugares e povoações da grande colônia.
Há muita vida pulsando nos cemitérios: seja nas obras de arte, ou nas informações sobre a história. Geralmente, os visitantes identificam elementos que ilustram a história social e artística da região em que o cemitério está instalado, através de sua estatuária, obras arquitetônicas, epitáfios, símbolos variados.
Há registros de fotografias, datas de nascimento e de partida – Verdadeiros museus a céu aberto.
Um exemplo: durante nossa pesquisa necessitávamos encontrar a fotografia de Gustavo Adolpho Konder para ilustrar sua breve biografia que escrevíamos. Lembramos que a vimos no Cemitério da Rua Bahia e sem qualquer dúvida, retornamos ao local.
Algumas denominações conhecidas
Na maneira de sepultar, atualmente, no Ocidente, há conceitos usados pelos pesquisadores, e também pelas pessoas que reportam ao cemitério e seus principais elementos, a saber:
Túmulo, jazigo ou sepultura – lugar onde as pessoas são colocadas quando morrem e, por extensão, qualquer monumento sobre eles construído, acima da terra. Este segue estilos, e variam de lugar para lugar. Neles são depositadas informações sobre os sepultados, como nome de família, datas de nascimento e partida e epitáfio.
Tumba – pequena construção (ou “câmara”), com paredes, um teto e uma porta. Pode ser parcialmente ou inteiramente no subsolo (exceto por sua entrada) num cemitério, ou pode estar na propriedade de uma igreja ou, em sua cripta. Tumbas únicas podem ser permanentemente vedadas; aquelas para famílias (ou outros grupos) têm portas de acesso.
Epitáfio – frases escritas sobre túmulos, mausoléus e tampas cemiteriais para homenagear as pessoas que partiram. Geralmente feitas em placas de metal (que vêm sendo roubadas atualmente).
Cemitério pioneiro católico de Blumenau – Cemitério São José
Contribuição de Marcos Röck
O primeiro cemitério católico de Blumenau, que existiu atrás da igreja matriz São Paulo Apóstolo e que foi dali mudado em 1862, durante o vicariato de Frei Daniel Hostin, quando foram iniciados outros dois cemitérios: o de Garcia e o de Badenfurt. Eram usados por católicos e protestantes, cujas sepulturas, entretanto, eram separadas por um caminho central.
Obs. Nas imagens, observamos que o cemitério localizado nos fundos da Igreja Matriz de Blumenau não tinha grande área ocupada. Somente no topo do morro veem-se sepulturas.
Quando Pe. José Maria Jacobs chegou a Blumenau em 16 de setembro de 1876, havia no perímetro urbano da cidade, apenas 5 famílias católicas, num total de 61 pessoas.
Segundo relatos do Frei Valdemar do Amaral feitos em dezembro de 1956:
“…este morro era o responsável pela situação da igreja, muito perto da Rua 15 de Novembro, que passa uns sete metros mais abaixo; também já havia prejudicado o alinhamento da capela do Convento, obrigando a construção a estreitar-se para os fundos. Não seria possível demolir a igreja antiga antes que a nova já pudesse ser usada; além disso a construção nova deveria ficar um pouco mais retirada da rua. Antes de mais nada, tinha o morro de desaparecer. Desde longa data já vinha sendo cavado no referido morro, mas o trabalho era árduo, pois não havia apenas terra, mas blocos de pedra e estratificações irregulares em diversos graus de formação e dureza. O trabalho exigia o emprego constante de picareta e alavanca; só em parte e com moderação podia ser feito uso de explosivos, assim mesmo arriscando as vidraças e o telhado da capela do Convento e das demais construções. Foi o Rev. Pe. Frei Joaquim Orth que, durante sua estada aqui como guardião e vigário, resolveu retomar definitivamente o trabalho de arrasamento do morro. Comprou um caminhão próprio para transporte de terra e contratou uma turma de operários, que trabalhavam ativamente desde 1º de julho de 1949 até dezembro de 1951. Finalmente, a 16 de fevereiro de 1953 foi retirado o último caminhão de entulho…”.
“Depoimentos de blumenauenses, hoje com 91 e 88 anos, relataram-nos terem visto, no ano de 1948, após a enchente de 17 de maio de 1948, carroças transportando as terras do antigo cemitério para servirem de aterro nos fundos do antigo Banco Inco e para o local onde seria a Praça Dr. Blumenau. Era comum ver/ter ossadas junto ao material transportado.
Com a desativação do cemitério iniciou-se efetivamente em 03 de maio de 1922, sessenta anos após iniciado e arrasado em definitivo a 16 de fevereiro de 1953, trinta e um anos após a desativação, acredito que muitos dos ali sepultados tenham sido transladados para outros cemitérios, que não, o São José.
No Cemitério São José encontram-se os jazidos dos provavelmente transladados:
José dos Santos / /1899 | 1-E-17-02
Manoel P. da Silva 08/03/1904 | 1-D-08-17
Joao J. Kracik 20/11/1908 | 1-D-07-01
Luiz Correa 08/08/1911 | 1-D-13-21
Hermann Buerguer , 17/06/1912 | 1-D-17-03
Richard Poerner 13/10/1914 | 1-D-18-01
Rosa K. Zimmermann 18/07/1914 | 1-D-09-09
Magdalena Braum 24/04/1914 | 1-E-11-01
Josefa Baader 12/04/1914 | 1-D-19-01
Franz Baader 29/09/1917 | 1-D-19-01
Jacob Brückeimer 12/02/1917 | 1-E-11-01
Samuel Hoffschneider / /1864, 05/04/1919 | | 1-D-23-02
João Ernesto Girolla 29/08/1919 | 2-D-35-12
João Michels 01/01/1855, 10/03/1921 | 1-D-15-01
Zilda Kracik 16/04/1921 | | 1-D-07-01
João Francisco Medeiros 24/05/1921 | | 2-D-41-01
Jazigo Família Laux 05/02/1922 | | 2-D-28-01″ Marcos Röck
Nota: Rua Goiás – compreendia o perímetro da atual Rua Amadeu da Luz e Rua São José. Valiosa contribuição e preenchimento de lacunas históricas.
Amostra do patrimônio cemiterial da região do Vale do Itajaí e alguns do Estado de Santa Catarina – em construção
Desde 2015 efetuamos o levantamento de uma amostra de cemitérios da região, no qual destacamos dados que reportam ao século XIX e início do século XX. Para acessar essa amostra, basta clicar nos nomes dos cemitérios contemplados – listados abaixo.
- Cemitério Luterano Centro – Blumenau
- Cemitério São José – Blumenau
- Cemitério De Encano – Indaial SC – Jardim da Saudade
- Cemitério de Warnow Alto – Indaial SC – Comunidade Polonesa
- Cemitério da Linha Popi – Itapiranga SC
- Cemitério Testo Alto – Pomerode SC
- Cemitério da Igreja Luterana – Rio do Sul SC
- Cemitério Massaranduba SC
- Cemitério Rua Bahia Blumenau
- Comunidade entre Trombudo Central e Braço do Trombudo SC
- Cemitério Itoupava Central
- Igreja da Paz – Pomerode – Cemitério do imigrante
- Cemitério Itoupava Central – Cemitério – Blumenau SC
- Ascurra – Comunidade Centenária – Ilse – Cemitério – Indaial SC
- Cemitério Comunidade Alto Paraguaçú – Distrito de Itaiópolis SC
- Cemitério de Canelinha SC
- Cemitério Católico e Luterano – Teresópolis – Águas Mornas SC
- Cemitério Bela Aliança – Povoação mais antiga do Alto Vale do Itajaí SC
- Cemitério Católico de Porto Belo SC
- Cemitério Luterano – Itoupava Norte – Blumenau SC
- Cemitério Luterano – Pouso Redondo SC
- Cemitério da Igreja São Bonifácio – Taquaras, Rancho Queimado SC
- Cemitério Católico Águas Mornas SC
- Cemitério Católico Barra Clara – Angelina SC
- Cemitério Luterano Passo Manso – Blumenau SC
- Cemitério Luterano Ibirama SC
- Cemitério Luterano Dalbergia – Cemitério dos Pioneiros e Novo – Ibirama SC
- Cemitério Municipal de Videira SC
- Cemitério Municipal de Fraiburgo SC
- Cemitério Municipal Parque da Paz – Treze Tílias SC
- Cemitério Municipal de Timbó SC
- Cemitério Mulde Alto – Timbó
Diferentes tipologias
Vídeos
Contribuição – na forma de um depoimento – de Portugal
“Moro na cidade do Porto, Portugal e aqui organizam visitas guiadas noturnas a alguns dos principais cemitérios da cidade.
Confesso que (ainda) não fiz nenhuma.
À 1ª vista, pode parecer lúgubre ou até mesmo, desrespeitoso para com os mortos. Mas, vários amigos meus já fizeram e ficaram encantados. Os cemitérios guardam a História da nossa cidade através de seus antepassados mais ilustres. É muito importante a historiagrafia de nossos antepassados seja divulgada para memória futura. Não só é uma visita cultural educativa muito importante como, de facto, constitui uma bela homenagem aos falecidos protagonistas da nossa História local, valorizando suas vidas e não deixando que suas pessoas e feitos caiam no esquecimento.” Norberto LGuimaraes (28 de setembro de 2023)
Registro para a História.
Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
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