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Afinal, a colônia Blumenau teve escravos? Veja o que dizem historiadores

Fundador confirmou em documento que o sócio Ferdinando Hackradt buscou cinco escravos para construir barracão

A presença de pessoas negras na história de Blumenau é um tema que gera curiosidade e controvérsia. Se, por um lado, não há dúvidas da influência que a cultura negra exerceu e exerce por aqui, o resgate histórico local geralmente ignora a participação de africanos e descendentes deles na construção da colônia.

Baseados em documentos deixados pelo próprio fundador, historiadores afirmam que não só havia negros por aqui nos primeiros anos após a chegada dos alemães como cinco deles foram trazidos como escravos. Um episódio que inclui a cidade no contexto de exploração da mão de obra negra no Brasil – principal fato que motiva o Dia da Consciência Negra, lembrado nesta segunda-feira, 20.

Relacionar a colonização alemã no Sul do Brasil à escravidão é um assunto controverso, “talvez pela necessidade de se identificar o Brasil Meridional apenas com o imigrante europeu, trabalhador livre, dono de suas próprias terras e empreendedor industrial”, como citam os historiadores André Voigt e Marlon Salomon em artigo publicado na revista Blumenau em Cadernos.

Os dois historiadores buscaram registros que comprovassem a presença da mão de obra negra na construção da cidade, mas há apenas um documento sobre a questão, assinado pelo próprio Hermann Blumenau. Nele, o fundador confirma que o sócio Ferdinando Hackradt buscou cinco escravos, entre eles uma senhora, para trabalhar nas terras da colônia.

“Quando ele requereu as terras, fez em sociedade com Ferdinando Hackradt. Doutor Blumenau foi para a Alemanha buscar imigrantes e o Ferdinando Hackradt ficou aqui para  fazer o barracão dos imigrantes. Ferdinando Hackradt, com a aquiescência do Blumenau, contratou cinco escravos, mas eles fugiram. O doutor Blumenau ficou com uma senhora de idade, isso ele deixa escrito”.

Fundador mudou de ideia

Sobre a fuga dos escravos não há consenso entre os historiadores. André Voigt explica que não há registros muito claros sobre essa parte da história. O que não deixa margem para dúvidas é outro documento, assinado pelo fundador em 1850, dois anos depois da aquisição de escravos. Nele, Blumenau se manifesta contra e lamenta a existência da escravidão.

“Quando ele iniciou as primeiras aberturas ele utilizou [mão de obra escrava], mas depois que ele forma a colônia dele, põe uma lei e nesta lei não era permitido, de acordo com a legislação do império, o uso da mão de obra escrava”, explica Sueli.

Voigt esclarece que desde antes da fundação de Blumenau havia luso-brasileiros que viviam próximo à região, convivendo com os imigrantes:

“Da mesma maneira há possivelmente negros, afrodescendentes, que conviviam no espaço da colônia. Hoje, penso muito nisso, é só ver os registros de terras e colonização durante o século XIX: havia proprietários de terras que não eram somente alemães na década de 1850 e até antes. Dessa maneira, a colônia não era tão ‘pura’ assim como se pleiteia”, enfatiza.

Sueli conta que o próximo registro oficial da presença de negros na cidade só ocorreria durante a construção da estrada de ferro, décadas mais tarde. Para que a ferrovia fosse inaugurada, em 1909, trabalhadores negros de outras regiões vieram a Blumenau para ajudar na obra.

A partir de então ficou mais difícil negar a existência da população negra no município, que aos poucos conquistou espaço no cotidiano e na história local. Prova disso é a exposição Consciência Negra: Heranças Culturais, que o Museu de Arte de Blumenau apresenta durante esta semana.