Arteterapia: como trabalhos manuais podem ajudar mulheres em situação de vulnerabilidade em Blumenau
Joseane Monteiro promove encontros de grupos reflexivos com mulheres em situação vulnerável
Com a pandemia de Covid-19 muitos setores e áreas profissionais foram afetados e uma delas foi a Psicologia. Devido à propagação do vírus, consultas que antes eram feitas presencialmente ou em grupos, precisaram ser interrompidas.
Esse período, que mudou radicalmente as relações sociais, demonstrou a importância dos cuidados não somente com o corpo, mas também com as questões psicológicas. Joseane Monteiro, psicóloga desde 2016, atendia presencialmente em Blumenau, grupos de mulheres em situação de vulnerabilidade em. Contudo, com a pandemia, teve que atender virtualmente e isso afetou muito a vida dela.
Ela relata que essa mudança impactou nas relações familiares, com amigos e percepções de vida, e que por isso, precisou fazer trabalhos psicológicos com ela mesma. Foi dessa forma que Joseane encontrou uma técnica de mandalas em pontilhismo, procedimento que começou a estudar como um processo terapêutico.
Faces do Feminino
Durante o ano de 2015, Joseane realizou um projeto em conjunto com as mulheres de uma comunidade de Palhoça, com o objetivo de trabalhar demandas relacionadas ao corpo e como essas mulheres se percebiam como profissionais ou mães. O projeto trabalhava o corpo como uma forma de empoderamento, independente de estereótipos.
Chamado Faces do Feminino, o projeto trabalhava com desenhos coletivos de um rosto, em que a ideia era refletir e identificar como essas mulheres se viam como sujeitas e como se viam no coletivo. Essa prática fazia com que as mulheres que estavam participando do projeto, se identificassem e escolhessem qual parte do rosto elas iriam representar.
Joseane conta que muitas narrativas bonitas afloravam dessas práticas, porque as mulheres davam sentido a parte do rosto a qual elas escolheram e representavam. Se uma mulher escolhesse desenhar os olhos, ela explicava sobre olhar para o futuro, ou ter dificuldade de olhar para o passado, por exemplo.,
Mandalas e a Arteterapia
Uma pesquisa de 2014, realizada por Alice Casanova dos Reis, Pós-doutora em Psicologia Social pela UFSC, mostra que a arte tem um papel muito importante nos processos terapêuticos, já que ela permite que os pacientes se expressem de outras maneiras, além da expressão da fala.
Dessa forma, a arte vem como uma forma de conexão entre o consciente e o inconsciente, ajudando o paciente a se autoconhecer, resolver problemas e facilitar a comunicação com seu terapeuta, já que muitas vezes, a pessoa que procura ajuda tem muitas dificuldades de relatar o que está acontecendo. Além disso, através dela é possível identificar fantasias, medos, memórias infantis e problemas que o paciente está vivendo no momento.
“A arte por si só é um processo terapêutico. Ela (a arte) é utilizada quando é difícil para o paciente elaborar e explicar o que está acontecendo em palavras, e a prática manual faz com que o paciente consiga falar e expressar o que está sentindo”, explica Joseane.
Como Joseane trabalha com mulheres em situação de vulnerabilidade e que vieram de lares tóxicos e abusivos, muitas delas passaram por um processo de despersonalização, em que é preciso um trabalho de reconstrução e análise da visão que aquelas mulheres têm de si mesmas.
“É um resgate muito grande, que com palavras você não consegue acessar, e nesse momento em que entram as diversas práticas de arte. A arte ajuda a reconstrução de si. Musicas, pintura, mandalas e outras práticas como manifestação do corpo e expressão de sentimentos”.
Joseane explica ser possível trabalhar com crochê e trico também, porque isso mostra para essas mulheres, possibilidades e habilidades que ela não imaginava possuir.
O projeto de mandalas surge em meio a pandemia, como um mesmo objetivo que o projeto Face do Feminino, mas para além do desenho.
Joseane também conta que trabalhar com mandalas é terapêutico, pois elas são construídas em ciclos, e dessa forma, a pessoa que está construindo consegue fazer parte de uma filosofia na qual, ao mesmo tempo em que se constrói as mandalas, você pensa em seus próprios ciclos.
“Mandalas são quaisquer coisas com figuras geométricas, coisas que vemos no dia a dia, como uma flor. Tudo que tem continuidade são ciclos, como uma mandala, e é assim que precisamos nos olhar e nos identificar, porque é a partir da prática que conseguimos identificar a abertura e fechamento de nossos próprios ciclos”, explica.
A construção de uma mandala e outras formas de arte, permite que o paciente se auto descubra, pois, a arte permite que seja possível através dos trabalhos dos pontos, traços e linhas, identificar e conversar sobre o porque a pessoa ter escolhido aqueles pontos e traços, de onde vem aquilo que está sendo expressado naquela forma artística.
Em seu relato, ela diz torcer para que no próximo ano o estado tenha mais respostas positivas quanto a imunização e resultados da vacinação para a Covid-19, já que desde agora, as pessoas têm buscado outras pessoas que as ajudaram neste período, criando laços com quem está cuidando de si e criando a proximidade consigo mesmo.
“Esse período de pandemia, ao mesmo tempo que deixou pessoas solitárias e ansiosas, também ensinou como retomar vínculos afetivos. Pode nos dizer muito do que é mais caro em nossas relações, tanto as mais íntimas e familiares, quanto as profissionais e aleatórias. A pandemia mudou nosso jeito de olhar para as nossas relações, de que não foi fácil de adequar, mas tem nos tornados mais verdadeiros em nossas escolhas”, relata Joseane.
Atualmente, ela não está atendendo grupo de mulheres devido a seu mestrado, mas pretende voltar os grupos reflexivos a partir de março de 2022, utilizando as mandalas como prática terapêutica.
Seu consultório fica no Edifício Atenas, na sala 1306, na rua Paulo Zimmermann, no Centro de Blumenau.