Estimulado pelas palestras que ouvia do grande botânico Dr. Roberto Klein, nas quais ele descrevia em detalhes como as florestas absorvem as águas das chuvas, resolvi pesquisar na literatura científica e, também, realizar meus próprios experimentos aqui no Vale do Itajaí, para ter uma ideia quantitativa daquilo que o Dr. Klein expunha de forma descritiva. Parte dos resultados principais constam da tabela abaixo:
Essas medições foram feitas ao longo de aproximadamente um ano em duas áreas com florestas nativas na Itoupavazinha, em Blumenau e numa plantação de Pinus que antigamente existia ao lado do atual Xópim Neumarkt no Centro de Blumenau.
Como se vê na tabela, as florestas nativas, bem desenvolvidas interceptam, ou, retém, em média, um terço das águas das chuvas. Em outras palavras, 33% das águas das chuvas ficam retidas nas bilhões de folhas, densas ramagens e nas samambaias, bromélias, musgos e uma infinidade de outras plantas que crescem nos galhos e troncos das árvores. Isso significa que um impressionante volume de água deixa de escorrer imediatamente para os cursos d’água, aliviando substancialmente o efeito das enchentes e enxurradas.
O capoeirão de 17 anos teve um bom desempenho, quase se igualando à retenção das águas da floresta bem desenvolvida, enquanto a mata de Pinus elliottii respondeu por cerca de dois terços desse valor. Seja como for, esses números comprovaram, também para o Vale do Itajaí, o que já se sabia na literatura científica: que as florestas exercem um efeito de verdadeiras esponjas gigantescas, que retém muita água das chuvas.
Nossa espetacular “novela hídrica” está longe de terminar. As gotas de chuva que finalmente conseguem atravessar a densa copa das árvores não atingem diretamente o solo e muito menos causam erosão, pelo simples fato de não haver solo desnudo no interior das florestas, sempre cobertos pela serrapilheira formada por camadas de folhas, galhos e outros detritos da mata, cuja espessura varia de centímetros até bem mais de meio metro.
Essa camada de folhas não apenas amortece o impacto das gotas que pingam das folhas, galhos e troncos, como também contribuem para reter mais uma boa parte das águas das chuvas. Nesse caso, a serrapilheira campeã de retenção de águas das chuvas foi a plantação de Pinus. Isso se explica por que, na ocasião da pesquisa, havia uma grossa camada de acículas (folhas com formato de agulhas, típicas da espécie) sobre o solo.
Na última coluna da tabela, os totais mostram que as florestas funcionam sim, como importantíssimas e gigantescas esponjas que retém grandes quantidades de água das chuvas. Discussões a respeito da pouca biodiversidade nessas plantações à parte, as florestas plantadas também contribuem para a minimização das enchentes.
Na última linha, embora não tenhamos medido diretamente, vê-se que as pastagens pouco contribuem para segurar as águas das chuvas. Fica fácil deduzir que, se todas as matas de nossos vales fossem substituídas por pastagens, as enchentes e enxurradas seriam terrivelmente muito piores.
Como se vê, urge que nossos governantes compreendam que preservação e RECUPERAÇÃO de nossas florestas, nativas, principalmente, são parte do planejamento e estratégia de gestão da paisagem e do controle de enxurradas e enchentes. Não podemos nos ater apenas às obras estruturais, como as barragens, no controle das cheias.
Nossa “novela hídrica” ainda não terminou. Se possível já na próxima semana, trataremos da infiltração de água no solo e de como em outros países houve sucesso na recuperação do papel das florestas na minimização das cheias periódicas, como as que afligem grande parte de Santa Catarina e tantos outros lugares.
Um terço das águas das chuvas ficam retidas no emaranhado de árvores, arvoretas, arbustos e ervas, mais os cipós, gravatás, musgos e uma infinidade de plantas de uma floresta nativa bem preservada. Essas florestas constituem um importantíssimo aliado na amenização das enchentes e enxurradas. Foto Lauro E. Bacca, Parque São Francisco, Blumenau, em 30/04/2023.