Há 34 anos eu e a esposa somos proprietários de uma área de 827 mil metros quadrados no Sul de Blumenau, que há 32 anos foi reconhecida como RPPN – Reserva Particular do Patrimônio Natural, por portaria do governo federal através do Ibama. Atualmente esse reconhecimento é feito pelo ICMBio.

Parece uma área grande quando comparada com terrenos urbanos ou sítios de lazer de fim de semana e de fato ajuda muito, mas, para a preservação da fauna é necessário ainda muito mais.

Assim que assumimos a propriedade, por vigilância própria, localizamos e eliminamos algumas armadilhas para captura de animais silvestres e mesmo acampamentos de caça dentro da propriedade. Cessamos, também, completamente, o corte de palmeiras juçaras e semeamos milhares de sementes dessa espécie a partir de matrizes diversificadas obtidas na região, cujos pequenos frutos, são importantíssimos na alimentação de centenas de espécies da fauna, principalmente no inverno.

Amargamos duas vezes roubo parcial de palmito juçara na propriedade e conseguimos sustar uma terceira tentativa de roubo, com a prestimosa colaboração, sempre que possível, da Polícia Militar Ambiental e do ICMBio, mesmo sabendo das precariedades a que muitos governos relegam essas instituições.

Nas andanças pela nossa mata, ainda que preservada acima da média das matas similares, quase não ouço, por exemplo, o forte trinado dos trinca-ferros. No entanto, andando pelas ruas próximas, esse é o trinado que mais ouço, partindo não da floresta, mas de gaiolas mantidas por muitos que dizem amar a natureza e seus bichinhos, desde que miseravelmente presos em gaiolas para cantar sempre perto dos egoístas ouvidos dos algozes que os aprisionam.

Não vamos entrar no mérito, no momento, da legalidade ou não de manter pássaros presos, quantos estão ali de forma “legal” ou ilegalmente. O fato é que eles estão ali presos, pois, bichos não sabem onde termina a propriedade de quem preserva e fiscaliza e onde começa a área, digamos, de “perigo”, onde a fauna corre o risco de ser morta ou capturada. Muitas vezes, basta o bicho andar uns passos ou voar alguns metros fora da área vigiada que ele corre o risco de ser capturado ou morto, anulando em grande parte os esforços de quem preserva.

Por isso esta coluna aplaude as várias ações de combate à caça, captura e tráfico de animais silvestres que vêm sendo noticiadas recentemente, a última delas, a Operação Pelznickel, que desbaratou uma quadrilha de criminosos que não respeitava sequer o grande santuário de vida natural, que é o Parque Nacional da Serra do Itajaí, indo matar justo ali, o pouco que resta de nossa depauperada fauna, a fauna que as crianças, induzidas à mentira pelos adultos, cantam que “nossos bosques têm mais vida”.

A exitosa operação Pelznickel usou de serviço de inteligência da Polícia Militar Ambiental, com participação da Polícia Federal e já prendeu e/ou autuou criminosos em municípios tão diversos como em Guabiruba (este município já foi apelidado de Covil de Caçadores), Blumenau, Rio dos Cedros e Indaial. Outras operações resultaram em prisões e apreensões em Ilhota, Jaraguá do Sul, Rio do Sul e vários outros municípios.

Se algum bicho ainda consegue sobreviver nos fragmentados ambientes naturais que restaram é porque ele escapou do desmatamento, das queimadas, da poluição, dos atropelamentos em estradas, das doenças transmitidas por animais domésticos, da perseguição de animais domésticos carnívoros (cães e gatos), de choques contra superfícies espelhadas (caso das aves), do tráfico de animais silvestres, da fiscalização fraca ou inexistente e até da apatia das pessoas que, com justiça, se incomodam com alguém que chuta um cachorro, mas nada fazem contra alguém que mata bicho silvestre, valendo aqui a expressão “longe dos olhos, longe do coração”.

Bicho selvagem que enfrenta tudo isso e continua vivo é um bicho herói, uma raridade, um fenômeno de resiliência num ambiente extremamente hostil criado fisicamente e comportamentalmente pelo ser humano. Se quase nada justifica a caça nos tempos atuais, nada, absolutamente nada, justifica a caça ilegal, perpetrada por sujeitos que tem tudo, menos necessidade de dizimar o pouco que resta de nossa fauna.

Que as ações de repressão aos crimes contra a fauna não cessem. Ao contrário, se intensifiquem e se perpetuem. Que os devastadores de nossa fauna sejam mais perseguidos do que eles perseguem nossos bichos.

Você, leitor, pode ajudar. Cobre das autoridades maior apoio às instituições como nossa valorosa Polícia Ambiental. E denuncie. Denuncie seu vizinho, seu conhecido, seu desconhecido e até mesmo seu parente, pois, eles estão lhe prejudicando. É que sem fauna não há equilíbrio ecológico. Sem equilíbrio ecológico não há qualidade de vida nem futuro. Se quisermos futuro, temos que lutar pela vida e lutar pela vida é lutar pela qualidade de vida de nossos filhos e netos. E netos dos nossos netos. E netos dos netos de nossos netos …
Em tempo, outra boa notícia: recentemente a pena prevista para o crime de caça aumentou. Que a lei seja aplicada com o máximo rigor possível a todos os envolvidos em crimes contra nossa fauna.

Aventurar-me em meio à natureza ajudou-me a conhecê-la e tentar entendê-la. Este clic, tomado por uma primitiva câmera Kodak Instamatic, mostra de onde partimos, eu e quatro colegas gaúchos, de mais de mil metros acima do nível do mar, descendo o canhadão de Fortaleza dos Aparados por um pequeno canhadão lateral que aparece no centro da imagem. Os precários 23 km de Cambará do Sul-RS até o topo desses paredões também foram vencidos a pé, carregando tudo nas costas. No planalto que não aparece lá em cima, fica o Rio Grande do Sul; da borda dos paredões para baixo, ou seja, tudo o que se vê na foto, é Santa Catarina, município de Jacinto Machado.

É possível que tenhamos sido o primeiro grupo a fazer essa travessia que atualmente está proibida por questões de segurança. Sete anos depois, em 1992, esta belíssima região passou a pertencer ao Parque Nacional da Serra Geral, frequentado por milhares de visitantes ao ano.

Foto Lauro E. Bacca, em 09/02/1975.


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Casarão da rua Floriano, em Blumenau, foi construído para receber médicos da Alemanha: