Das Kino - Um olhar crítico sobre o cinema

Jéssica Frazão é doutoranda na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (USP) e escreve sobre cinema, artes e produção audiovisual.

Filme nacional ignorado pelos cinemas de Blumenau está elegível para Oscar 2021

É oficial. Bacurau, filme dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, está elegível para o Oscar 2021. Ele já se encontra na Academy Screening Room, a plataforma de acesso dos membros votantes da Academy of Motion Picture, Arts and Sciences (AMPAS). Quem está a frente da campanha por lá é a distribuidora Kino Lorber.

Em outubro de 2019, escrevi aqui no jornal sobre como o filme estava sendo boicotado pelos cinemas de Blumenau, e que não deveríamos aceitar isso. Com o apoio do próprio diretor, Kléber Mendonça Filho, organizamos uma primeira sessão de maneira independente no dia 4 de dezembro daquele ano. Posteriormente, outras sessões foram sendo organizadas na universidade. Uma forma de mostrar para as exibidoras que havia sim demanda para o filme na cidade. Todas as sessões estavam lotadas, e os espectadores puderam participar de debate após a exibição.

Na época, por desconhecimento da potência do nosso cinema brasileiro, algo sobre o qual também já falei, muita gente não acreditou na capacidade de Bacurau em conquistar prêmios internacionais. Nem em nos representar na disputa do Oscar. Hoje, depois de ser aclamado nacionalmente e internacionalmente, de ter passado na tela da Rede Globo (uma programação que tende a passar os filmes da Marvel) de ter sido premiado em Cannes e em vários outros importantes festivais de cinema, o filme está elegível ao Oscar. Isso é extremamente importante. É também bastante constrangedor para um governo que não apoia o cinema brasileiro. Ao contrário, trabalha para destruí-lo.

Em entrevista recente à revista Jacobin, Kleber Mendonça Filho discorre muito bem sobre o viralatismo que persiste na população brasileira:

“Quando o filme começa a ser mostrado internacionalmente, havia um posicionamento que vinha de pessoas no Brasil. Uma percepção do cinema brasileiro de um olhar incrivelmente conservador, e que chamamos de “complexo de vira-lata”, porque diziam que esse filme jamais seria exibido nos Estados Unidos, que é um filme anti-americano. Mas o filme apenas questiona o papel dos Estados Unidos no mundo. O filme foi bem recebido lá e no resto do mundo e a ideia é muito clara”.

Em 2019, por censura de Jair Bolsonaro na escolha do filme brasileiro que seria indicado a concorrer ao Oscar 2020, Bacurau ficou de fora. Naquele ano, o longa indicado foi ‘A vida invisível’, de Karim Aïnouz.

Agora, em 2021, Bacurau terá uma nova chance. Sem depender de aval do Governo Federal. O que nos possibilita concorrer em todas as categorias para filmes ficcionais, com exceção da categoria de Filme Internacional (antigo filme estrangeiro). Destacam-se as categorias de melhor filme, melhor direção, melhor atriz e ator coadjuvante e melhor roteiro original.

Bacurau está elegível porque a produção teve sua estreia em Nova York no dia 6 de março de 2020. Antes mesmo do fechamento das salas de cinema devido à pandemia. As regras da Academia são claras: são elegíveis ao Oscar as produções estrangeiras que ficaram em cartaz em Los Angeles por pelo menos uma semana do ano corrente, e que não tenham ficado entre os cinco finalistas da categoria de melhor filme internacional no ano anterior.

As chances de Bacurau são reais. Além da boa recepção por parte da crítica estadunidense, o ex-presidente dos EUA Barack Obama deu aquela forcinha colocando-o entre os seus melhores filmes assistidos em 2020.

Além disso, o longa foi recentemente indicado no Spirit Awards, uma espécie de Oscar do cinema independente. Um festival que traz muita visibilidade aos filmes. As escolhas dos indicados ao Oscar será anunciada no dia 15 de março. Até lá, temos tempo de crescer nas apostas.

Sabemos que Parasita surpreendeu o público e a crítica quando conquistou o prêmio de melhor filme em 2020. Algo que nunca havia ocorrido para um longa não falado em língua-inglesa. Com Bacurau pode acontecer o mesmo. Ainda que o filme não precise de consentimento da Academia para mostrar sua qualidade, algo já evidenciado desde Cannes, eu sigo com minha torcida e orgulho imenso. Principalmente por todo boicote, censura e dificuldades perpassadas.


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