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Envolvidos em furto de fuzis do exército de Blumenau são ouvidos pela Justiça

Dois estão sendo acusados de furto e outros quatro de receptação

Os envolvidos no furto e receptação dos fuzis que caíram do caminhão do exército que sofreu um acidente em Blumenau em março do ano passado foram ouvidos na tarde da última quinta-feira, 9. A denúncia do Ministério Público Militar (MPM) foi apresentada contra seis acusados pelo juiz da 5ª Circunscrição Judiciária Militar (CJM), Diógenes Moisés Pinheiro.

De acordo com a denúncia, os dois fuzis que foram ejetados do veículo do 23º Batalhão de Infantaria que se envolveu no grave acidente na região do Progresso foram furtados por Cristiano Ribeiro de Oliveira. Ele morava com a esposa da época, Indianara Aparecida, que também está sendo acusada.

A denúncia afirma que ela colaborou com o furto, o que Indianara e Cristiano negam. Os dois foram denunciados por furto, enquanto os outros quatro por receptação. Os crimes foram considerados militares, pois, apesar de terem sido cometidos por civis, foram contra o patrimônio militar.

Denúncia do MPM

Cristiano teria vasculhado a área da queda do veículo por curiosidade e acabou encontrando um fuzil. A arma foi escondida em um matagal próximo à residência. Em seguida, ele teria retornado à região do acidente com familiares e encontrado o segundo fuzil junto de uma mochila com comida, cantil e peças de roupa do exército.

Os itens foram escondidos junto do primeiro fuzil e Cristiano decidiu vender o armamento. O contato inicial foi feito com Ezequiel Costa, amigo do casal, pelo WhatsApp. As armas foram oferecidas por R$ 10 mil e Ezequiel e o primo dele, Marcos Rogerio Ferreira, foram buscar as armas.

Uma transferência de R$ 1 mil foi feita pela esposa de Marcos, Jéssica, como “entrada” para a compra. Por conta disso, ela também está sendo acusada de receptação. Ela afirma não saber para que seria usado o valor. Toda a negociação aconteceu durante a madrugada após o acidente.

Ezequiel então levou Marcos até a casa de Cristiano, onde pegaram os dois fuzis. O carro de Ezequiel ficou no local como “garantia” para o pagamento dos R$ 9 mil restantes. Marcos e Ezequiel foram então até a casa de Adavilson Narciso, na região de Joinville, onde Marcos vendeu um dos fuzis por R$ 15 mil.

A outra arma foi deixada na casa de Marcos, que entregou cerca de R$ 1 mil para Ezequiel pela ajuda e voltou a Blumenau para pagar os R$ 9 mil restantes para Cristiano. Essa segunda arma foi recuperada na casa de Marcos, que foi preso em flagrante no dia 27 de março.

Fuzil recuperado na casa de Marcos. | Foto: Polícia Militar/Divulgação

Conflito de informações

A área mais cinzenta dos interrogatórios foi o destino do fuzil vendido a Adavilson. De acordo com a denúncia, ele revendeu a arma pelo valor de R$ 30 mil. Entretanto, ele alega ter inventado a venda para se livrar da polícia.

Enquanto o MPM afirma que o fuzil foi recuperado no início de abril graças a uma ligação anônima ao Centro de Operações Policiais Especiais (Cope) de Curitiba que avisou que a arma estava em um bosque perto da unidade, Adavilson afirma que ele teria feito um acordo com o exército.

Ambas as armas recuperadas foram examinadas pelo 3º Batalhão de Polícia do Exército e confirmadas como os fuzis furtados do acidente.

Versão de Cristiano e Indianara

O casal que morava próximo ao local do acidente afirma que muitas das informações contidas na denúncia foram manipuladas pelo exército. O depoimento deles foi tomado pelo capitão José Jader Rodrigues de Lima Júnior, chefe da 1ª Seção.

Cristiano já foi condenado por outros dois crimes: furto de galinhas, pelo qual ele tinha um mandado de prisão em aberto, e uma tentativa de homicídio que acabou sendo reduzida para lesão corporal e pela qual ele recebeu perdão judicial há cerca de três anos.

Segundo o acusado, o furto dos fuzis e a negociação com Ezequiel teriam sido feitas apenas por ele. Indianara teria descoberto após o contato e insistido para que ele devolvesse as armas. Ela estaria envolvida apenas por ser a dona do celular, já que ele não tinha um aparelho.

Cristiano e Ezequiel se conheciam por um grupo de WhatsApp de venda de animais. Ezequiel já teria vindo até Blumenau para trocar patos por galinhas. Já Marcos, o casal negou conhecer e não confirmou ter reconhecido do momento da venda por estar mutio escuro.

Cristiano também afirma ter perdido a maior parte dos R$ 10 mil que recebeu pela venda das armas. Segundo ele, o dinheiro foi colocado dentro de uma máscara descartável que ele perdeu no mato. O restante do dinheiro teria sido usado para pagar contas atrasadas, comprar gás e pizza.

O promotor do MPM questionou um carro comprado por Cristiano no nome de Indianara. Porém, o casal afirmou que o veículo foi adquirido dias antes do acidente e que o dinheiro usado na compra veio do trabalho do acusado.

Cristano tentou fugir da polícia

Por estar sendo procurado pelo furto dos fuzis e ter um mandado em aberto pelo furto de galinhas, Cristiano fugiu para casa de uma tia. No início da madrugada dois policiais à paisana o encontraram. “Eles queriam me levar pra conversar dizendo que depois me traziam de volta”, afirmou o acusado.

Em seguida, ele alega ter sido levado a um terreno baldio por policiais civis e militares e agredido para dar informações sobre o destino dos fuzis. Nesse meio tempo, o exército constantemente procurava Indianara, que acabou até sendo ajudada por policiais com cestas básicas.

“Passei coisas que nunca imaginei passar. Fui muito pressionada e sofri muitas ameaças. No depoimento me deram um telefone para falar com alguém que não sei quem era, dizendo que era pra colaborar com eles ou iria direto pro presídio e minha filha pra Febem. Dei horas de depoimento e tem só uma página com pedaços do depoimento que não são verdadeiros”, disse Indianara.

“Tive medo de ser morta. Não por bandidos, e sim pela polícia que todo dia 6h revirava minha casa. Sou hipertensa e ameaçaram me matar me fazendo tomar todos meus remédios se eu não colaborasse. Sendo que nem tomei proveito desse dinheiro. Nunca nem fiz nada de errado”, completou a acusada.

Versão de Ezequiel

O caminhoneiro mora em Ilhota, onde tem uma conveniência com a esposa. Ele afirma que estava com o primo, Marcos, quando recebeu uma ligação do número de Indianara na qual Cristiano ofereceu os fuzis. Marcos teria demonstrado interesse no armamento e vendido um deles para Adavilson.

Os policiais chegaram até ele graças ao depoimento de Cristiano. Segundo Ezequiel, ele também foi agredido e cobrado de onde estava o armamento, mas ele disse não saber. Segundo ele, toda negociação foi entre Marcos e Cristiano.

Versão de Marcos e Jessica

A versão de Marcos é que ele não ouviu bem a conversa entre Ezequiel e Cristian, mas fez o Pix de R$ 1 mil porque deve dinheiro a Ezequiel e achou que a transferência era referente à dívida. Só depois ele teria sido informado sobre os fuzis.

O fuzil que ficou com ele foi inicialmente escondido no mato, mas depois foi levado para dentro de casa. Segundo Marcos, a família nunca soube da arma. Ela foi escondida atrás de peças de porcelanato que estavam apoiadas na parede da cozinha.

Porém, em uma madrugada, a polícia militar teria invadido a casa dele procurando o armamento. No relatório policial, foi registrado que Marcos resistiu à abordagem e por isso foi atingido por spray de pimenta e máquinas de choque. Entretanto, ele nega a resistência e afirma ter sido torturado e que a família também foi vítima de agressões.

“Tem depoimentos que eu dei no dia da prisão que menti por medo. Tanto dos policiais quanto do lado do crime. Fui criminoso, mas não tinha necessidade de ameaçarem meus filhos. Ameaçaram tacar fogo na minha casa 2h da madrugada. Usaram uma fronha pra tentar me afogar. Achei que ia morrer”, relatou.

A esposa dele, Jessica Azenha Likiginski, testemunhou que também foi vítima de agressões. Os filhos gêmeos de 13 anos teriam sido acordados com tapas e ameaças por parte dos policiais.

“Sete dias depois eles voltaram num sábado de manhã pra uma nova busca dizendo que os traficantes locais iam cobrar da gente, porque vários pontos de tráfico foram fechados por culpa do Marcos. Fiquei 15 dias escondida na casa da minha mãe. Meus filhos sem ir pra escola”, disse Jessica.

Versão de Adavilson

O morador de Joinville já foi condenado por um assalto em 1995 e por porte de arma em 2019. Ele nega a versão do MPM de que o fuzil que ele comprou teria sido revendido. Segundo ele, a arma estava escondida no sótão.

Porém, após a polícia ter mostrado fotos dele para pontos de drogas na região para ameaçá-lo, ele teria feito um acordo para devolver a arma. Entretanto, nunca explicou como o fuzil foi parar em Curitiba.

O promotor do MPM questionou um Pix recebido no nome dele de R$ 30 mil. Porém, ele afirma que o valor foi decorrente da venda de uma corrente de ouro. A transferência foi feita da região de Curitiba, onde o fuzil foi encontrado.

Tortura será investigada pela Justiça Militar

A Justiça Militar Estadual está investigando as acusações de tortura dos envolvidos. Jéssica e Marcos já prestaram depoimento. Porém, de acordo com os registros das abordagens, elas foram realizadas pela Polícia Militar.

Ainda assim, o juiz da 5ª CJM questionou a possibilidade de o exército ter participado das atuações de forma “clandestina”. O promotor de Justiça Militar André Santos não descartou a possibilidade.

O juiz determinou que diligências complementares sejam realizadas, como juntada de documentos que possam reforçar informações já levantadas. A data de uma nova audiência ainda não foi divulgada, mas deve ocorrer entre maio e junho deste ano.


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