Especialistas de Blumenau criticam propostas de alteração nas leis de trânsito

Se for aprovada como está, serão mais de 20 artigos modificados no Código de Trânsito Brasileiro

Especialistas em trânsito e bombeiros de Blumenau receberam com críticas o projeto de lei do governo Bolsonaro que altera alguns pontos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Se a proposta for aprovada pelo Congresso como está, serão mais de 20 artigos modificados. Para os sargentos e instrutora de trânsito ouvidos pela reportagem, há, inclusive, contradições no texto.

Entre as ideias propostas estão o afrouxamento na punição de quem não usa a cadeirinha para crianças, o aumento do limite de pontos da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), a ampliação na duração da carteira, a extinção da obrigatoriedade das aulas de direção noturnas nas autoescolas e a eliminação da necessidade de exames toxicológicos para a habilitação e renovação da CNH nas categorias C, D e E.

Cadeirinha 

Crianças com menos de dez anos devem ser transportadas no banco traseiro. Uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), em vigor há mais de uma década, regulamenta o uso da cadeirinha e do assento de elevação. Quem não cumpre as medidas comete infração gravíssima, recebe multa de quase R$ 300 e tem o carro retido.

O sargento do Corpo de Bombeiros de Blumenau, José Carlos, diz que utilizar o item de segurança reduz em 71% o risco de morte de crianças em acidentes, segundo pesquisa do Ministério da Saúde. Ainda assim, no ano passado, no Brasil, cerca de três pessoas entre zero e 14 anos perderam a vida nas estradas todos os dias.

“Não se pode transportar nada atrás sem o cinto, porque se torna uma alavanca. A criança é ejetada, o que pode causar a morte dela e do próprio condutor”, afirma.

O presidente da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, Moisés Cohen, destaca que o cuidado vale inclusive para trajetos curtos e realizados em velocidades baixas e médias, como o percurso da escola para casa. Um acidente em que o carro está a apenas 50 km por hora, uma criança que pesa 10 kg é lançada para frente com um peso equivalente a 500 kg.

O projeto de lei pretende inserir as regras de uso do Contran no CTB, mas a principal mudança está na punição de quem for flagrado infringindo a norma: uma “advertência por escrito”.

Para o sargento do Setor de Trânsito da Polícia Militar de Blumenau, Giovanni Dotti Lemos, a questão deverá ser revista por um choque no texto: no CTB há artigo que diz que advertência por escrito só pode ser aplicada em infrações leves e médias.

“Bate no dispositivo legal que não permite isso. Eu não sei as razões da alteração desse artigo, mas acredito que será revisto porque tem furos, como em outros pontos do projeto”, aponta.

Luz nas rodovias

Um dos “furos” que Dotti sinaliza é o que trata dos faróis acesos nas rodovias. A alteração é que eles continuem sendo usados durante o dia, mas em rodovias de pistas simples (hoje é em qualquer rodovia), em túneis e sob chuva, neblina ou cerração.

A infração para quem estiver com as luzes apagas cai de média para leve e “só erá punida com multa no caso de o proprietário ser pessoa jurídica e não haver identificação do condutor”.

Para Dotti, falta mencionar se a penalidade ocorrerá em todos os casos citados e se a pessoa física também entrará nessa condição.

Pontos na carteira

Atualmente tem o direito de dirigir suspenso quem atinge 20 pontos na carteira. A proposta é aumentar o limite para 40 pontos. Para a instrutora de trânsito Márcia Pontes, elevar esse teto é “passar a mão na cabeça de motorista infrator”.

Ela acredita que os condutores não se preocuparão tanto com o número de infrações cometidas, o que significará mais insegurança no trânsito e, por consequência, mais acidentes:

“Essas medidas vão na contramão da segurança no trânsito. A saúde pública vai ficar ainda mais doente. Os hospitais vão entupir”, lamenta.

Dotti reconhece que quem dirige muito no dia a dia pode atingir o limite rapidamente, mas também reforça que não é uma missão impossível, se o motorista seguir todas as leis de trânsito.

Duração da habilitação

A renovação da carteira deixará de ser a cada cinco anos para ser a cada dez. Nos maiores de 65 anos o intervalo aumenta para cinco anos (atualmente são três).

“Muita coisa pode acontecer na vida de uma pessoa em cinco anos, um acidente que deixa sequelas, por exemplo. Imagina em dez…”, reflete Dotti.

Capacete incompleto

Uma das alterações afeta diretamente os motociclistas. Transportar mercadorias em desacordo com as normas pode passar de infração grave para média e quem usar capacete sem viseira ou sem óculos de proteção cometerá erro médio, não mais gravíssimo.

Isso significa que o motociclista não perderá o direito de dirigir se for flagrado sem a proteção para os olhos.

“Eu tenho moto e digo por experiência própria: é um item muito importante para a visão. Evita a entrada de bichos, areia e até pedra que pode ser lançada no motociclista”, alerta José Carlos.

Dotti critica a proposta. Para ele, o medo de perder a carteira e a multa, que pesa no bolso de muitos, freia a irregularidade – e evita ainda mais acidentes com motociclistas, que já não são poucos.

Fim do exame toxicológico

O único ponto positivo do projeto de lei apresentado, na opinião de Márcia, é a extinção da necessidade de exames toxicológicos para a habilitação e renovação da CNH nas categorias C, D e E. Para ela o exame não garante que motoristas estão conduzindo livres das drogas, já que é difícil haver controle sobre a questão.

A reportagem entrou em contato com representantes do Seterb para debater o assunto, mas a autarquia não quis se manifestar. O órgão repercutirá o assunto apenas depois que a matéria terminar de tramitar no Congresso.

 

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