Como evitar dores de cabeça numa comissão de formatura
O meio universitário foi fortemente abalado nos últimos dias com a notícia da aluna do curso de Medicina da USP – Universidade de São Paulo que se apropriou das verbas para custear a formatura da turma e perdeu quase R$ 1 milhão.
Embora seja uma notícia que tenha estampado as páginas policiais, especialistas do meio jurídico e financeiro dão dicas para estudantes de nível universitário não correrem risco de perder suas economias para bancar a formatura na constituição da comissão organizadora.
Para Paulo Akiyama, economista e advogado, sócio do escritório Akiyama Advogados Associados, em primeiro lugar, a comissão de formatura deveria ter um grupo de alunos para auditar toda movimentação financeira feita por quem estava autorizado. Ele compara a escolha do presidente da comissão organizadora à eleição de síndico de prédio.
“Ninguém quer ser síndico, só que na hora que dá problema, todo mundo reclama”, brinca.
Outro ponto que o advogado considera fundamental é ter de duas a quatro assinaturas para autorizar as movimentações financeiras da comissão, evitando que uma única pessoa ao bel prazer faça isso sem destino certo.
“Só o fato da jovem ter transferido os recursos para sua conta corrente particular já está errado”, observa.
Mercado consolidado
Akiyama ainda acrescenta que o mercado de formaturas vem se profissionalizando ao longo dos anos e existem empresas que organizam eventos até para cursos específicos.
“Isso virou um grande negócio e essas organizações elaboram um tipo de contrato no qual eles têm uma empresa que contrata os eventos, outra apenas para receber e fazer os pagamentos, mas são todas do mesmo grupo, do mesmo dono”, aponta.
Por esse motivo, o advogado recomenda uma leitura cuidadosa do contrato pelos integrantes da comissão de formatura para verificar eventuais multas contratuais por quebra de acordos e contratações antecipadas.
“É preciso atentar à possibilidade de ter de pagar o contrato todo, ou a multa rescisória, no caso de já terem sido contratados, por exemplo, a banda, salão de festas, bufê, essas coisas todas. O contrato é o início de tudo, quando se inicia errado encerra-se errado”, alerta.
Thiago Martello, fundador da Martello Educação Financeira, recomenda à comissão de formatura a contratação de uma empresa que faça a gestão financeira do evento, bem como buscar informações sobre se já tem tradição no mercado, se trata de uma agência estabelecida, desde quando está funcionando, se já tem algum processo vinculado, quem são os sócios e se algum deles já foi envolvido em algum escândalo.
Caso não seja possível a contratação de uma empresa especializada, o educador financeiro indica a abertura de uma conta corrente, mesmo em banco digital, específica para essa finalidade e com a assinatura de pelo menos duas pessoas da comissão de formatura para fazer a movimentação financeira.
“A senha de acesso pode ser compartilhada entre os demais integrantes para consulta das movimentações, com o objetivo de tornar o processo mais transparente”, sugere.
“Entretanto, os pagamentos e recebimentos devem ser feitos apenas por duas ou três pessoas, senão vira bagunça”, observa.
Martello ainda recomenda a formalização de um contrato nomeando um aluno como responsável, inclusive prevendo penalidades caso acordos sejam descumpridos para ter uma linha de como começar a reclamar.
Aplicações financeiras
Um dos principais motivos que tornou o caso dos estudantes de Medicina da USP público foi o fato da presidente da comissão de formatura ter utilizado o dinheiro arrecadado ao longo de cinco anos para custear despesas pessoais e usando a alegação de ter aplicado os recursos em investimentos de alto risco, perdido grande parte dos valores e tentado recuperá-los jogando na loteria.
Para o economista Diego Hernandez, fundador da Ativo Investimentos, ao utilizar o dinheiro de forma indevida, primeiramente a estudante de Medicina não respeitou uma premissa do mercado financeiro que é a macroalocação dos recursos alinhada ao perfil de investidor.
“Quando se trata de dinheiro com uma finalidade e um vencimento pré-estabelecido de utilização, ele não deve sofrer nenhum tipo de risco, de modo que o mais indicado seria uma aplicação em renda fixa com prazo pré-estabelecido sem possibilidade de variação de resultado porque esse recurso tinha um período certo para ser resgatado”, analisa.
O consultor financeiro não aconselha investir 100% do capital em risco porque “quando você coloca todo o recurso em risco, você não tem estômago suficiente para aguentar uma volatilidade, que possa gerar prejuízos”.
Hernandez ainda ressalta que quando uma pessoa sofre uma grande perda financeira, não fica numa condição psicológica normal e acaba entrando em desespero tentando recuperar.
“Nesses casos, as pessoas acabam fazendo loucuras, como aplicar o pouco que restou em jogos de azar ou em renda variável ou uma outra forma de investimento cada vez mais arriscada que tem um potencial de ganho maior”, avalia.
Caso a comissão de formatura decida conjuntamente aplicar o dinheiro para ter um rendimento um pouco maior e poder até dar uma incrementada à festa, Hernandez recomenda sempre respeitar que a alocação de portfólio esteja enquadrada ao seu perfil de risco, acompanhar as movimentações da taxa Selic, taxa básica de juros da economia brasileira, verificar se a empresa ou profissional contratado para fazer a aplicação é regulado pela CVM – Comissão de Valores Mobiliários e não operar alavancado, ou seja, movimentar mais recursos do que você tem.
“Sempre siga uma frase que digo aos meus clientes: ‘ganhos rápidos, perdas rápidas”, finaliza.