Uma viagem de férias rendeu mais do que boas lembranças e fotografias para o médico catarinense José Carlos Martins Junior, especialista em pacientes transgêneros, que atende em Blumenau.
Em março, ele aproveitou uma folga na agenda de cirurgias e consultas na Transgender Center Brazil e foi relaxar em Nova York, Estados Unidos, acompanhado da esposa Priscila Silva Martins.
Além dos pontos turísticos tradicionais, o médico, que atende pacientes trans do mundo todo, foi visitar um lugar especial e único no mundo, o primeiro museu dedicado à arte LGBTQIA+.
“Foi uma imersão em arte, uma experiência que recomendo para qualquer pessoa. O Leslie-Lohman Museum traz mais do que obras de arte LGBTQIA+, ele conta histórias de luta, resistência e superação, coisas que a população transgênera enfrenta diariamente. Vale muito a visita”, contou.
Fundado há mais de 30 anos por Charles Leslie e Fritz Lohman, o Leslie-Lohman Museum possui uma coleção com mais de 30 mil objetos de Queer Art de épocas e lugares variados.
Muito mais do que arte, o museu revela um recorte histórico da comunidade queer ao longo de décadas, mostrando a evolução do movimento LGBTQIA+, muito antes da sigla existir.
O projeto do museu
A ideia em fazer um espaço destinado à comunidade LGBTQIA+ veio logo após a rebelião de Stonewall, quando a dupla percebeu a importância de expor trabalhos de artistas da comunidade em um apartamento no Soho, no ano de 1969.
Enquanto o projeto do museu estava apenas no imaginário, Leslie e Lohman recolheram uma grande quantidade de obras de vários artistas que morreram por complicações provocadas pela Aids no ápice da epidemia e tiveram seus pertences descartados no lixo por suas respectivas famílias.
Diante de tanta arte acumulada, em 1987, decidiram organizar os trabalhos para que dessa forma pudessem transformar a coleção em uma fundação. Já naquela época, o preconceito era grande com a comunidade LGBTQIA+, levando em torno de cinco anos para serem reconhecidos como fundação.
O projeto enfrentou preconceito dos vizinhos e discriminação da polícia e autoridades, mas resistiu e só em 2016 recebeu o reconhecimento e credenciamento oficial como museu, e atualmente, o Museu Leslie-Lohman é membro da Aliança Americana de Museus (AMM).
A instituição é financiada por doações e outras fundações, bem como um programa de adesão. A Fundação expande seu acervo principalmente por meio de doações de artistas e colecionadores.
O acervo
Hoje, o museu mantém uma coleção permanente na qual apresenta obras de artistas como Berenice Abbott, Abel Azcona, David Hockney, Ingo Swann, Catherine Opie, Andy Warhol, Tom of Finland, Delmas Howe, Jean Cocteau, David Wojnarowicz, Robert Mapplethorpe, George Platt Lynes, Horst, Duncan Grant, James Bidgood, Duane Michals, Charles Demuth, Don Bachardy, Átila Richard Lukacs, Jim French, Vulcão Del LaGrace, Paul Thek, Peter Hujar, Arthur Tress e muitos outros.
A passagem do médico pelo museu coincidiu com a exposição “Not Me, Not That, Not Nothing Anything”, onde estavam as obras de onze artistas contemporâneos que empregam a fragmentação em pintura, desenho, escultura e mídia baseada no tempo.
Historicamente as estratégias de fragmentação corporal (cortar o corpo em partes, isolar apêndices e distorcer a autoimagem) são reconsideradas por artistas contemporâneos queer como um meio de explorar suas próprias percepções de si fora do olhar cis-heteronormativo.
“Fui muito privilegiado em poder estar em NY no período desta exposição, que muito se relaciona com meu trabalho. A fragmentação do corpo na exposição nos permite explorar nossa percepção além do gênero”, conclui José Carlos Martins.