Josué de Souza

Cientista social e professor, é autor do livro Religião, Política e Poder, pela EdiFurb.

“Choram Marias e Clarices no solo do Brasil”; compositor Aldir Blanc é vítima da Covid-19

Colunista relaciona conflitos políticos atuais com acontecimentos dos últimos anos

O clima de crepúsculo que vivemos no Brasil não começou agora. Inicia em 2016, 17 de abril, um domingo. A câmara dos deputados votava o impeachment de Dilma Rousseff (PT), como se fosse uma partida de futebol ou uma gincana de programa de auditório.

A acusação contra a presidenta era de ter cometido crime de responsabilidade fiscal, as chamadas “pedaladas”, edição de crédito sem a autorização do Congresso. Dilma contava com uma baixa popularidade, fruto de uma crise econômica global que se encontrava no cenário interno com acusações de corrupção cometidas por ela e por seu partido.

As acusações eram orquestradas por um juiz de primeira instância que mantinha alta a temperatura da opinião pública. Utilizava para tanto, vazamentos para a imprensa de depoimentos e grampos telefônicos. Atropelava regras básicas da constituição e do direito penal. Com o patrocínio da imprensa, não demorou muito para o juiz transformar-se em um herói nacional.

Aquela seção do parlamento brasileiro em um domingo de outono, era o prelúdio do inverno que estaria por vir. As figuras mais apavorantes do parlamento mostraram-se ao país. Gente que se escondia no porão, o chamado baixo clero. Entre eles, um deputado do Rio de Janeiro. Ocupava o parlamento por 25 anos, com apenas dois projetos aprovados. Na justificativa de voto, ele saúda a ditadura militar e um torturador.

Mesmo estando no plenário de uma casa legislativa, não foi censurado. Pelo contrário, seu voto foi saudado por uma torcida organizada espelhada pela galeria da casa e por todo o Brasil. Vestidos de camisas da seleção brasileira, aplaudiam todo e qualquer apoio a derrubada da presidenta eleita. Presidindo o congresso, estava Eduardo Cunha (PMDB). Deputado da bancada evangélica, preso dois meses depois.

Dilma Rousseff nunca mobilizou as instituições, seja qual for, em sua defesa. Respeitou o devido processo legal e deixou para a história o papel de ser absolvida. No seu lugar assumiu o vice presidente. Michel Temer (PMDB) político de carreira, apresentou um projeto de modernização da economia. Chamava “ponte para o futuro”. Na prática o programa era na verdade a supressão de direitos sociais e trabalhistas. A ponte na verdade era um “viaduto caído”.

Sérgio Moro, o juiz herói do combate a corrupção, tornar-se-ia, quatro anos depois, Ministro da Justiça do deputado improdutivo e venerador de torturador. Os vestidos de camisa amarela diziam que era para combater o comunismo e acabar com a corrupção. Estavam juntos no mesmo governo, criador e criatura.

No último domingo, Jair Messias Bolsonaro voltou a atacar a democracia, a imprensa livre e louvar a ditadura. Seu juiz patrono, pediu para sair do governo, acusando e acusado de querer utilizar o Estado para buscar vantagens pessoais. Na verdade caiu, “porque brilhava mais do que a dona do bordel”.

No mesmo dia, o Brasil alcançava 7.106 mortes por Coronavirus. “Choram Marias e Clarices no solo do Brasil”. Entre os mortos, Aldir Blanc, autor da música da Anistia. Mas a música lembra, “sei, que uma dor assim pungente, não há de ser inutilmente”, a democracia e a liberdade irá continuar.

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