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“Milhares de vítimas como as de São Sebastião seriam poupadas com simples respeito a lei de uso do solo”

Atender alguns, prejudicar todos

O que diria o leitor se os responsáveis pelas normas de segurança de voos de aviões passassem a afrouxar cada vez mais essas mesmas normas? A resposta é simples: o transporte aéreo deixaria de ser o modal mais seguro de todos os transportes, muita tragédia iria acontecer e muita gente iria morrer. Se existem normas para a segurança dos voos é porque existem razões técnicas que as exigem e que devem ser rigorosamente cumpridas nos mínimos detalhes.

O que diria o leitor se os responsáveis pela segurança dos passageiros da nave espacial Terra, ou seja, todos nós, tendessem a afrouxar cada vez mais as normas de segurança dessa mesma nave? Pois é exatamente isso que tem acontecido nas últimas décadas, no Brasil e em nosso Estado.

“Por que o agricultor não pode plantar só por que a declividade do seu terreno é de 45 graus?” gritaram alguns deputados federais em Brasília, sem ter a menor noção do que isso significa. “Pra que esse absurdo de áreas de preservação permanente?”,  vociferaram deputados estaduais e diversas outras autoridades catarinenses.

Não é de hoje que existem normas que visam disciplinar a correta ocupação e uso dos solos visando o bem-estar e a segurança da população. Para as áreas rurais, temos o Código Florestal Brasileiro, por exemplo e para as áreas urbanas, a antiga Lei 6.766, de 19/12/1979.

Reza esta última Lei, no seu Artigo 3º, parágrafo único que:

“Não será permitido o parcelamento do solo: (…)
II – em terrenos com declividade igual ou superior a 30% (trinta por cento), salvo se atendidas as exigências específicas das autoridades competentes;
IV – em terrenos onde as condições geológicas não aconselham a edificação;
V – em áreas de preservação ecológica (…)”.

Sob as vistas grossas, portanto, criminosas, de autoridades mais interessadas nos votos das próximas eleições que na segurança da população, a quase totalidade dos danos materiais e de vítimas fatais dos desastres chamados falsamente de “naturais”, como o recentemente acontecido em São Sebastião (SP), têm ocorrido justamente nos locais ocupados em áreas desse tipo, com declividade elevada e fragilidade geológica ou por pessoas que avançaram nas áreas de preservação permanente como as margens de rios. Milhares de vítimas e bilhões de reais em despesas teriam sido poupados com o simples respeito a leis como essa, aqui exemplificada.

Na enorme pressão dos anos recentes para afrouxamento das normas ambientais, os legisladores ouvem mais os apelos da minoria que se sente prejudicada por essas normas e menos as recomendações técnicas que determinaram o estabelecimento delas para o bem de todos. Já pensou se os legisladores agissem da mesma forma em relação à segurança do transporte aéreo, mais ouvindo os leigos que representam maioria dos seus votos e menos os técnicos que são minoria nas urnas?

Nem os mortos descansam em paz quando os vivos não cuidam bem do meio ambiente. A erosão estava tomando conta do Cemitério do Progresso, em Blumenau, pelo simples fato de que a relva entre os túmulos era capinada, deixando o solo exposto.

Sem gastar um centavo a mais com mão de obra, a relva poderia ser mantida roçada, ao invés de capinada. Com o tempo e as chuvas levando a terra, vários túmulos tombaram e outros estavam quase caindo, como nesta imagem. Foto Lauro E. Bacca, em 20/05/1979.


– Assista agora:
Vice-prefeita de Blumenau, Maria Regina Soar, conta sobre sonho de ser dentista e perdas na família