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Operação Mensageiro: empresário do Vale do Itajaí entregava propina a prefeito de Itapoá

Envelopes com dinheiro de propina recebida de empresa eram entregues na frente de estabelecimento comercial em Brusque

A reportagem do jornal O Município teve acesso a documentos judiciais e ao depoimento do empresário brusquense Amilton José Reis, réu na operação Mensageiro, no qual ele relata que entregava envelopes com dinheiro de propina ao cunhado Marlon Neuber, brusquense que é prefeito de Itapoá e também réu na investigação.

Segundo o depoimento de Amilton, o dinheiro de propina era entregue inicialmente a ele na frente de um estabelecimento comercial em Brusque. Quem repassava o valor era Altevir Seidel, apontado como “mensageiro da Serrana”, que respondia a Amilton com o nome de Paulo.

A operação Mensageiro já prendeu 16 prefeitos e o caso é considerado o maior esquema de corrupção da história de Santa Catarina.

Amilton é casado com a irmã de Marlon. Ele disse que os dois têm uma “comunhão familiar muito forte”. “O Marlon sempre me viu como um braço-forte, um porto-seguro. No passado, ajudei a pagar a faculdade dele. O Marlon me via com bons olhos e muito respeito”, disse.

Amilton não soube precisar quantos envelopes com dinheiro de propina recebeu, mas garante que recebeu envelopes mais de quatro ou cinco vezes.

“O Marlon entrou na política em 2017 e me disse: ‘cunhado, alguém vai te ligar para você receber encomenda para mim’. Eu falei: ‘ok’. Me ligou uma pessoa se identificando como Paulo e disse que ia me entregar uma encomenda”, relatou.

Entrega dos envelopes

Os envelopes com dinheiro de propina, segundo o empresário, foram entregues até o início de 2021. Amilton relata que não conferia o dinheiro dentro dos envelopes. No entanto, confessa que sabia que se tratava de dinheiro da Serrana Engenharia, empresa investigada pela operação que prestava serviços de coleta de lixo à Prefeitura de Itapoá.

“Os envelopes eram entregues em um estabelecimento comercial em Brusque. Esse tal de Paulo, que depois eu soube que é Altevir, nunca soube o nome e soube agora… Ele saia do carro, isso dava dez segundos, ele me entregava o envelope. Eu não conferia o valor. Eu repassava para o Marlon. Ou o Marlon vinha para Brusque ou eu ia para Itapoá e levava esses envelopes para ele”.

Amilton chegou a ir até a empresa Serrana, de acordo com ele, a convite de Marlon. O empresário detalhou que não sabe o teor da conversa no encontro na empresa. Ele relatou que sequer se recordava com precisão da ida até a Serrana.

“Eu não sei o que realmente conversaram [no encontro]. Eu sei que disseram: ‘Tu vai receber envelopes, tipo mês que vem… daqui dois meses, três meses… vai receber lá em Brusque’. As tratativas de contrato, aditivo, essas coisas… eu não participei de nada. Eu não sabia o valor que eles tratavam”, disse.

“Era um lugar que eu não queria estar. Era um lugar que estava me sentindo fora da realidade. Mas meu cunhado disse ‘vamos juntos’”, detalhou Amilton em outro trecho do depoimento, mas se tratando ainda do encontro na Serrana.

O empresário afirmou, porém, que nunca levou vantagem com o esquema, apesar de reconhecer o envolvimento. Ele relatou que tem imóveis alugados em Itapoá e que tem dívidas com a Serrana, pois, conforme Amilton, os inquilinos às vezes não pagavam.

“Só quero deixar claro que nunca me beneficiei de valores e nem de benefícios da Serrana. Eu tenho dívidas na Surbi (filial da Serrana) e poderia muito bem usar dessa influência dizendo: ‘zera meu imposto’, e eu não fiz”.

O Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) questionou se a atuação de Amilton foi para ajudar o cunhado e prefeito. Ele respondeu: “Somente para ajudar meu cunhado. Além de eu não ganhar nada, olha o que estou passando hoje…”.

Pacote com nome de Marlon Neuber. Foto: Reprodução

Saída do esquema

Amilton relatou no depoimento que, no início de 2021, informou a Marlon que não queria mais dar continuidade ao esquema. Segundo ele, o cunhado e prefeito também reconheceu que precisava parar.

“No início de 2021, eu chamei o Marlon e falei: ‘Marlon, eu tenho uma vida boa, estabilizada, eu tenho rendimentos da empresa, da minha administradora de bens, eu tô me sentindo quase como um traficante, que pega algo escondido e faz algo escondido. Isso é dinheiro de propina. Eu não preciso disso, Marlon. Eu não quero mais’”.

Questionado pelo MP, ele não soube informar se Marlon seguiu ou não no esquema. “Apesar de nós termos um vínculo familiar, o Marlon era demasiadamente reservado. Como ele sabia que eu não compactuava com isso, jamais ele me falaria [se continuou recebendo]”.

“Me corrompi de forma tão nojenta”

Marlon também prestou depoimento ao Ministério Público. O prefeito lamentou a participação no esquema e reconheceu que agiu de forma ilegal.

“Infelizmente eu pequei contra Deus, contra minha cidade, contra meus eleitores, contra minha igreja, contra minha família e me corrompi de uma forma tão nojenta que me causa repulsa. Corrupção é um câncer da nossa sociedade”, alegou.

Marlon falou sobre um acordo que fez em 2017 com Odair Mannrich, diretor-executivo do Grupo Serrana, na sede da empresa, que fica em Joinville, onde foi acertado para os anos 2018, 2019, 2020 e 2021 o pagamento R$ 120 mil anuais referente aos contratos que a prefeitura tinha com a empresa. O valor seria repassado como propina.

“Normalmente, era uma ou duas vezes por ano [o pagamento]. Neste momento, é importante informar ao Ministério Público que eu não recebi esses valores. Quem recebia era o meu cunhado, Amilton José Reis”, disse.

O prefeito relatou que não sabia o número de contatos feitos com Amilton. A justificativa foi que o empresário mora em Brusque, município distante de Itapoá. “Ele (Amilton) recebia e, quando eventualmente a gente se encontrava, ele passava os envelopes para mim”.

“Estou profundamente arrependido de tudo isso e disposto a fazer uma mudança integral de vida, consertar minha vida com Deus e trabalhar ao máximo possível para restituir minha cidade e tudo aquilo que foi lesado”, afirmou.

Envelopes que eram entregues para envolvidos no esquema. Foto: Reprodução

MP apresenta denúncia

O Ministério Público denunciou Amilton e Marlon. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) recebeu a denúncia no dia 2 de maio. De acordo com o MP, aconteceram 31 comunicações telefônicas entre o mensageiro e Amilton, entre novembro de 2017 e outubro de 2020.

A denúncia apresentada pelo MP aponta que a entrada do prefeito de Itapoá no esquema foi ainda antes de ele se eleger para o primeiro mandato, em setembro de 2016.

“Marlon comprometeu-se a usar seu poder de mando para, de modo permanente, colocar a máquina pública itapoaense à disposição dos interesses da Serrana, sempre que o núcleo empresarial assim julgasse necessário”, consta na denúncia do MP. O documento foi assinado no dia 29 de janeiro de 2023.

O que diz a defesa

A reportagem entrou em contato com o advogado Marcelo Peregrino, questionando se a defesa do prefeito e do empresário gostaria de se manifestar. O advogado disse: “O processo está sob sigilo e não posso me manifestar”, respondeu.

No entanto, os autos do processo estão disponíveis no sistema de consulta processual do Ministério Público.


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