Imaginemos que a viagem dos sonhos finalmente se concretizou e o grupo, interessado sobretudo em cultura, embarca para conhecer as maravilhas da Europa. Um dos pontos mais significativos para todos foi o Museu do Louvre em Paris e, claro, sua obra mais famosa, o quadro da Gioconda, ou Mona Lisa, do grande mestre Leonardo da Vinci, no século XVI.
Depois de muita expectativa, diante daquela relativamente pequena, mas extraordinária pintura, o grupo pouco pode apreciar. Alguém, até que muito bem-intencionado, objetivando valorizar ainda mais a ambientação da obra, havia instalado ali, bem diante da Mona Lisa, um exuberante e resplandecente lustre luminoso.
Por mais que as pessoas procurassem um bom ângulo para apreciar a pintura, nunca conseguiam. Sempre havia um reflexo, um feixe de luz ou um jogo de sombra a macular a beleza da obra-prima. O grupo retirou-se dali, naturalmente, por demais frustrado. Mas houve quem gostou e elogiou a beleza do lustre ali instalado.
Partamos agora para outro destino turístico, o Monte Rushmore, em Dakota do Sul, nos Estados Unidos. Ali, durante 14 anos, quatrocentos operários deram forma ao projeto de escultura das enormes faces de quatro presidentes americanos, entre 15 e 21 metros de altura, inauguradas na década de 1940. Com isso, em que pese ter ocorrido a violação do monte sagrado da tribo Lakota, o lugar passou a ter uma atração turística muito
conhecida naquele país.
Acontece que, continuemos nossa imaginação, alguém tão inspirado quanto o instalador do lustre diante da Mona Lisa, resolveu mandar instalar, cravada nas enormes esculturas, uma passarela suspensa, visando propiciar aos visitantes uma visão mais de perto daquelas monumentais faces esculpidas no duro granito da montanha. Claro que isso destruiu e acabou com a possibilidade de apreciação, tanto de perto quanto de longe, daquela obra de arte. No entanto, há quem ache a ideia da passarela, cravada nas orelhas, bochechas, olhos, lábios e nariz de George Washington, Thomas Jefferson, Abraham Lincoln e Theodore Roosevelt, algo muito interessante.
Imaginemos agora um dos recantos mais harmoniosos e encantadores da costa catarinense, o costão das Vieiras, na histórica cidade de Porto Belo em Santa Catarina. Uma sucessão de costão rochoso, cheio de blocos de rocha torneados e de todos os tamanhos, encobertos por densa e variada vegetação nativa, destacada por portentosas figueiras com um sem-número de barbas-de-velho dançando ao vento, penduradas nos longos galhos que avançam sobre o mar.
Tudo isso entremeado por uma sequência de prainhas que competem eternamente entre si, sem se chegar a alguma conclusão, pelo título de mais charmosa prainha do Costão das Vieiras.
Pois bem, imaginemos agora alguém tão bem-intencionado quanto aquele que instalou o magnífico lustre na cara da Mona Lisa ou o outro bem-intencionado que espetou a passarela na cara dos presidentes americanos, resolveu também ali, em Porto Belo, instalar uma gigantesca passarela, cravada justo sobre as rochas e areias desse entrecortado litoral que tanto encanto despertam no visitante embevecido que as aprecia do jeito que são, fruto de muitos séculos e milênios de paciente trabalho que só a natureza sabe fazer e ninguém mais.
Não precisa mais imaginar, caro leitor. Pode esfregar os olhos, trocar de óculos, pedir para beliscar para acordar e certificar-se de que não está sonhando. Essa monstruosidade existe e está em plena fase de implantação e avança, qual insensível serpente devoradora de paisagens e recantos, sobre o Costão das Vieiras, em Porto Belo, Santa Catarina.
Ao contrário do lustre da Mona Lisa ou da passarela do Monte Rushmore, essa obra não é imaginária. Ela existe, tem autor, nomes e sobrenomes dos bem-intencionados que a estão instalando, conforme identifica placa ali instalada: “Infraestrutura turística na orla do Costão das Vieiras … – primeira etapa; valor total R$1.787.338,21; agentes participantes –
município de Porto Belo, Caixa Econômica Federal, Ministério do Turismo e Governo Federal”.
No dizer do respeitado botânico João de Deus Medeiros, por muitos anos perito judicial na área de meio ambiente e presidente do Conselho Regional de Biologia: “é o governo federal financiando obras que descaracterizam e comprometem a sua paisagem natural. O direito à paisagem precisa ser resguardado, garantindo sua fruição pública e é dever do Estado garantir tal direito, mas, não comprometer esse mesmo direito com a dilapidação do
patrimônio paisagístico natural”.
Acontece que, por não resistir a qualquer argumento em contrário, a passarela do Costão das Vieiras, em Porto Belo, Santa Catarina está inegavelmente dilapidando o patrimônio paisagístico natural do lugar. Trata-se, portanto, de obra ilegal, até mesmo inconstitucional.
Conforme um colega da Acaprena: “estão fazendo o modelo de outros municípios, como Bombinhas, que cobra taxa ambiental de entrada, mas nem esgoto sanitário tem”. Ou ainda, direto ao ponto, podemos comentar: nada contra passarelas, mas, ali, maculando naquela paisagem paradisíaca, jamais!
Com um mínimo de bom senso e criatividade, a fruição daquela paisagem poderia ser propiciada ao público sem a atual agressão, como, por exemplo, com alguns mirantes instalados em pontos estratégicos. Mirantes discretos, que permitam apreciação das belezas do lugar, instalados de forma a destacar, mas não obliterar a paisagem. É assim que se faz em lugares de governos inteligentes.
A propósito, a Porto Belo da passarela que pisoteia e fere a beleza natural do Costão das Vieiras, na Santa e Bela Catarina, tem coleta e tratamento de esgotos?
Qual insensível serpente devoradora de paisagens e recantos, a passarela do Costão das Vieiras, em Porto Belo, Santa Catarina (foto de baixo), vai avançando e maculando os mais belos recantos do lugar (foto de cima, onde a passarela ainda não chegou). Matar serpentes não é ecologicamente correto, porém, essa aí, deve ser contida no seu crescimento e eliminada o quanto antes.
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