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Policial civil do Médio Vale é condenado por cobrar comissão em venda de carga de fios ilícita

Ele usou o cargo que ocupava para solicitar vantagem financeira indevida a um empresário do ramo têxtil

O juízo da Vara Criminal da comarca de Brusque condenou o policial civil Ariovaldo Dias de Sousa, 42 anos, de Guabiruba, pela prática do crime de corrupção passiva. Segundo a investigação, Ariovaldo usou o cargo que ocupava para solicitar vantagem financeira indevida a um empresário do ramo têxtil. Em contrapartida, deixaria de apreender parte de uma carga de fios furtada.

Além da perda do cargo público, o policial civil foi condenado a dois anos e oito meses de reclusão, em regime aberto, e 13 dias-multa. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas penas restritivas de direito – prestação pecuniária no valor de 10 salários mínimos e prestação de serviços à comunidade.

Ele poderá recorrer da decisão em liberdade, posto que assim se manteve durante toda a instrução criminal, além de não estarem presentes os requisitos para decretação de sua prisão preventiva. A decisão, prolatada em 16 de janeiro, é passível de recuso.

Denúncia

Consta na denúncia do Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) que nos meses de setembro e novembro de 2021, na cidade de Guabiruba, o agente público solicitou R$ 10 mil ao empresário.

Em consequência da vantagem solicitada, o denunciado deixou intencionalmente de apreender parte de um carregamento de fios que havia sido localizado pela Polícia Civil, e infringiu dever funcional de apreender a integralidade da carga furtada.

O que o acusado disse em juízo:

Ao ser interrogado, o acusado esclareceu que esteve cerca seis vezes na empresa citada. Que três vezes foi na empresa por causa do inquérito que foi instaurado para apurar a receptação de fios de origem ilícita.

Disse que a primeira vez foi até a empresa para identificar a carga de fios origem de furtos. Que na segunda vez que foi no local, acompanhado do delegado, ocasião em que o empresário teria dito que os fios originados de furto eram apenas os que estavam encaixotados, não mencionando que os que estavam no tear também tinham a mesma origem.

Continuou narrando que voltou na empresa uma terceira vez, para acompanhar a seguradora retirar a carga de fios objeto de furto. Sustentou que enquanto as caixas de fios eram carregadas pelos encarregados da seguradora, o empresário teria pedido ajuda dele para vender 1.600 kg de malhas, com pagamento à vista, mediante comissão de 10%, que corresponderia a R$ 10 mil.

Afirmou que como estava há dez anos sem receber reposição salarial, resolveu achar um interessado para comprar essa malha. Que teria combinado com o empresário que, caso este vendesse a malha, receberia o valor de R$ 1 mil. Narrou que posteriormente o empresário teria ido até a delegacia para levar informações a respeito da pessoa que teria lhe repassado os fios.

Que depois disso, o empresário teria dito que iria na padaria, ao lado da delegacia, convidando o acusado para ir junto. Disse que na padaria o empresário teria falado que o tear teria estragado as agulhas, e que as agulhas custariam R$ 10 mil. Que o empresário teria dito que iria trocar as malhas que tinha pelo serviço de conserto/troca das agulhas do tear.

Afirmou que depois disso foi mais três vezes na empresa de para fazer e negociação. Esclareceu que teria ido com uma vez com um Fiesta próprio, outras duas vezes com viaturas descaracterizadas. Que foi nessas vezes lá para negociar essa malha.
Disse que não sabe por que o empresário disse que ele teria pedido a quantia de R$ 10 mil.
Por fim, respondeu que tem conhecimento da exclusividade na função de policial, mas alegou que como não recebeu reposição salarial precisava fazer algum “bico” e que viu a oportunidade de “ganhar um dinheirinho”.

Provas

Apesar da negativa sustentada pelo acusado, em atenta análise às provas produzidas nos autos, o TJ-SS entendeu que restou devidamente comprovado durante a instrução processual que ele infringiu o seu dever funcional e ainda solicitou, pessoalmente e por meio de aplicativo de mensagens, a vantagem financeira indevida – que após insistência do empresário em pagar via transferência bancária, fez com que o denunciado desistisse da cobrança.

As mensagens de aplicativo citadas nos autos são as que o empresário utilizou para provar as acusações. Ele apresentou à polícia todas as mensagens trocadas com o policial Ariovaldo via WhatsApp sobre o assunto.

De acordo com o inquérito da Polícia Civil, pelo conteúdo das mensagens de áudio e texto, “ficou evidente que Ariovaldo contatou o empresário por dias seguidos, primeiro para tratar das investigações e depois para impor uma parceria comercial e solicitar valores indevidos”.

“Com efeito, os elementos de prova demonstram que o acusado orientou, propositalmente, o empresário a ficar com a carga que sabia ser produto de crime para que posteriormente pudesse solicitar vantagem indevida a ele com a negociação dos fios, não havendo qualquer indicativo de que (o empresário) tenha falseado os fatos, sobretudo porquê o próprio (policial) declarou em juízo que não sabe quais razões ele (o empresário) teria para imputar-lhe falsamente tais fatos. Por derradeiro, válido mencionar que o crime de corrupção passiva consumou-se com a mera solicitação da vantagem indevida pelo acusado, pois se trata de delito formal, e, portanto, independe do resultado naturalístico para a sua configuração”, cita o magistrado sentenciante.

Resumo do caso

De acordo com o inquérito da Polícia Civil, o caso iniciou em 2021, logo após a investigação sobre cargas furtadas e roubadas em Guabiruba, que resultou na recuperação de toneladas de fios e prisões, incluindo do empresário Jean Carlos Gums.

Com a divulgação do caso pela imprensa, um empresário do ramo têxtil da cidade suspeitou da procedência das mais de 320 caixas de fio que Jean Carlos Gums havia deixado em sua empresa dias antes.

Por precaução, ele entrou em contato com a delegacia de Guabiruba e foi atendido pelo policial Ariovaldo. Ao receber a denúncia, o policial foi até a empresa e constatou que a carga de fios era de procedência ilegal. A maior parte da carga estava encaixotada e uma pequena fração já havia sido colocada nos teares.

Segundo a denúncia, o policial disse ao empresário que as caixas seriam apreendidas, mas que ele poderia ficar com os fios já colocados nos teares e vendê-los.

Após confirmar a procedência ilegal da carga, o policial Ariovaldo entrou em contato com um delegado responsável pela investigação, e informou sobre a localização do material receptado, mas não informou a ele sobre os rolos que já estavam nos teares. Ou seja, para o delegado, toda a carga ilegal havia sido apreendida, o que é o procedimento correto.

De acordo com o inquérito, após a retirada da carga e sem ter mais relação com a investigação, o policial Ariovaldo voltou a procurar o empresário, com a intenção de cobrar parte dos valores que seriam obtidos com a venda dos fios propositalmente deixados nos teares.

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