“Quando evoca o fim do socialismo, Bolsonaro cria um inimigo imaginário”
Para colunista, conceito comum em discussões sobre política é usado de maneira equivocada
Nunca fomos socialistas, tá okay?
O discurso de posse do presidente Jair Bolsonaro (PSL) pautou-se em um equívoco que é muito comum nas discussões sobre política. O presidente afirmou que sua chegada ao poder representa a libertação do Brasil do socialismo. Fico pensando um cidadão estrangeiro, se ler apenas o discurso do presidente, o que imagina do Brasil.
O fato é que no Brasil, o socialismo nunca foi implantado e governo algum nunca pretendeu tal iniciativa. De forma geral, o socialismo é uma ideia política que pretende suprimir da sociedade as desigualdades entre os homens, os conflitos de classe criados pelo capitalismo, o controle dos meios de produção e a propriedade privada.
Bolsonaro assumiu um governo em uma sociedade que possui uma concentração de renda e riqueza brutal. As seis pessoas mais ricas do Brasil concentram a mesma riqueza de que 100 milhões de brasileiros, quase a metade da população do país. Enquanto isso, 43,98% do orçamento público é gasto com o pagamento de juros bancários. Bancos que, só no primeiro semestre de 2018, ampliaram seus lucros em 28,5%, um total de R$ 41,9 bilhões. Isso em meio a uma crise econômica.
Sem pretender esgotar o tema, doutrinar o nobre leitor e muito menos defender qualquer regime político, permita-me apontar alguns autores que podem ser lidos e assim lançar luz sobre o debate.
A ideia de criar uma sociedade sem classe já estava presente na obra de Platão e no cristianismo primitivo. Porém, os maiores expoentes desta ideia são autores do século 18. Saint-Simon, Fourier, Robert Owen e Prourdhon são autores socialistas que antecedem o marxismo, os chamados socialistas utópicos.
Um deles, Saint-Simon é considerado por muitos interpretadores como um liberal e defendia a livre empresa e a manutenção do lucro dos capitalistas. Estes, em troca, assumiriam algumas responsabilidades sociais. As ideias de Saint-Simon, aliás, influenciaram outro francês, chamado August Comte, autor da frase “Ordem e progresso” presente na bandeira que nunca será vermelha, tá okay?
Karl Marx e Friedrich Engels escreveram um livro chamado Manifesto Comunista. Nele, os autores apresentam as contradições internas do capitalismo e propõem um modelo social de superação deste modo de produção. Para eles, a principal contradição interna do capitalismo é ele produzir uma enorme quantidade de bens e produtos que não podem ser consumidos pelos trabalhadores, que vão ficando cada vez mais pobres conforme aumenta a exploração.
Esse fenômeno produz não somente a concentração de riqueza como a queda na taxa do lucro dos capitalistas. Seria o fim do capitalismo. Para os marxistas, o socialismo é uma etapa do capitalismo.
Porém, para esta doutrina, a superação do capitalismo não é apenas um processo gerado automaticamente pela crise econômica ou por um decreto do governo. Ela depende da consciência de classe e da organização política dos trabalhadores.
Na verdade, quando evoca o fim do socialismo, Bolsonaro cria um inimigo imaginário, inexistente, e tenta assim, capitalizar politicamente entre seus eleitores com a ideia de que as liberdades de mercado e o direito à propriedade estavam em perigo no Brasil. Esta estratégia já foi usada pelos militares em 1964 e por Fernando Collor, quando assumiu a presidência.
Acreditar que o governo do Partido dos Trabalhadores estava transformando o Brasil em um república socialista é o mesmo que acreditar que os Bornhausen ou Mário Hildebrandt defendem o fim da propriedade privada e a expropriação dos meios de produção pela classe trabalhadora só pelo fato de serem integrantes do Partido Socialista Brasileiro (PSB).
Josué de Souza escreve sempre às terças-feiras
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