Capa: Composição feita com a pintura do artista alemão Heinrich Graf e o postal da Fecularia “Encano” Lorenz e Cia., enviado para servir de “base” para a realização da arte. O artista mudou o local do observador da foto para elaborar seu trabalho, e com isso a imagem não ficou igual.

No momento do lançamento do livro Fragmentos Históricos – Colônia Blumenau – Arquitetura ° Cidade ° Sociedade ° Cultura – Volume 1, em 9 de março de 2023, na cidade de Blumenau, soubemos que o Museu de Arte de Blumenau – MAB estava recebendo a doação de um dos quadros mais incríveis que vimos na cidade e na região. Em 2024 completa 100 anos a obra de arte que mostra a reprodução do local em que estava instalada a fecularia Lorenz e seu edifício, na comunidade de Encano Indaial (Indaial-SC, na década de 1920).

A obra, óleo sobre tela, foi pintada pelo artista Heinrich Graf, nascido na Alemanha. Trata-se, na verdade, de Heinrich von Graf, membro de uma família que fora nobre.

Explicando o “von” do nome do artista Heinrich. A nobreza alemã era formada por um conjunto de pessoas que, até 1919, tinham privilégios em relação às demais pessoas da sociedade, submetidas à legislação de cada localidade das regiões que atualmente pertencem ao território da Alemanha. A partir de 1919, no período da República de Weimar (1919-1933), os privilégios da nobreza foram oficialmente abolidos. A nobreza passa a não ser reconhecida pela República Federal da Alemanha. Antigos títulos hereditários são permitidos como parte de um sobrenome, como o von do nome do artista aqui apresentado.

A obra foi doada ao MAB por Victor Bona, bisneto de Hedwig Lorenz e Johannes Friedrerich Lorenz, irmão de Fritz Lorenz, fundador da Cia. Lorenz e com quem trabalhou. A bisavó de Victor Bona encomendara a obra (pronta em 1924) a Heinrich von Graf.

Em 9 de março de 2023, no MAB – o doador da obra de Graf, Fecularia “Encano” Lorenz e Cia ao Museu de Arte de Blumenau MAB, Victor Bona.
Victor Bona tocando piano no palco do C.C. 25 de Julho de Blumenau.
Os dois irmãos Lorenz. Fritz (Friedrich) fundou a firma Lorenz e Johannes casou-se com Hedwig.
A genealogia das famílias Bona e Lorenz. Leandro e Edda são os pais de Victor Bona.
O quadro pintado por Heinrich Grafa e doado pela família Bona ao Museu de Arte de Blumenau MAB – Cia Lorenz, Encano, Indaial. Em 9 de março de 2023.

Por muito tempo, o quadro esteve com a filha de Hedwig e Johannes, avó de Victor Bona, Hertha Lorenz, casada com Axel Deeke. A família residia na Rua Sete de Setembro, no local em que atualmente está instalada uma clínica. Sua única filha, Hedda Deeke (casada com Leandro Victor Bona), permaneceu com a obra, que, posteriormente, foi herdada por Victor Bona, e por ele doada ao MAB em 9 de março de 2023.

Residência de Axel Deeke e de Herta Deeke (Solteira Lorenz), onde o quadro de Graf doado ao MAB, permaneceu por décadas.
Hedwig Agnes Lorenz que encomendou a obra a Heinrich Graf e sua família.
A filha de Hedwig e Johannes, Hertha Lorenz e o marido Axel Deeke, que herdou a obra de Graf. Avós de Victor Bona.
Casamento de Hedda e Victor Bona, pais de Victor Bona, herdeiro que doou a obra ao MAB.

Em 4 de maio de 2023 retornamos ao MAB, e estudamos a obra, o que despertou em nós a curiosidade de conhecer mais sobre a história do quadro e de seu pintor. Nesse momento, no Museu de Arte de Blumenau – MAB, estavam sendo expostas 28 obras de seu acervo, restauradas, muitas com novas molduras, graças ao projeto proposto por Arian Grasmuk, cujo objeto era a recuperação das obras de arte.

Estas foram transferidas em 2020, do acervo do Museu da Família Colonial para o Museu de Arte de Blumenau – MAB.

Dentro desse processo viabilizado pelo projeto de Grasmuk, as obras também passaram por limpeza mecânica, remoção de chassis e molduras contaminadas por insetos xilófagos, construção de novos chassis e emolduramento. E junto das obras apresentadas estava a obra de Heinrich Graf, doada por Victor Bona ao museu e sobre a qual vamos conversar. A obra mostra a Cia. Lorenz na década de 1920, em óleo sobre tela.

Em 4 de maio de 2023, quando Arian Grasmuk mostra 28 obras de seu acervo do MAB, restauradas, muitas com novas molduras, graças ao seu projeto sancionado pelo Edital Elizabeth Anderle. Entre estas obras, Arian menciona a oficialização da doação efetuada por Victor Bona, da obra de Heinrich Graf, ao MAB.

Companhia Lorenz

Companhia Lorenz – uma das beneficiadoras de mandioca da indústria de fécula, com sede administrativa na Rua São Paulo – Blumenau, cujo diretor era Rolf Schindler, que residia defronte, no bairro Itoupava Seca. Outubro de 1962.Friederich Fritz Carl Lorenz.
Fritz Lorenz, foi um visionário. Além de fundar essa fecularia a Cia Lorenz, iniciou outros empreendimentos de sucesso no estado de Santa Catarina, inclusive no Extremo Oeste, Videira. Na região entre muitas iniciativas, e que poucos conhecem, foi a fundação da Porcelana Schmidt, consequência de uma simples ação sua, quando em 1929, patrocinou os estudos de seu sobrinho – Fritz Herwig Schmidt na Alemanha. Embarcou  em 8 de abril deste ano, com 16 anos de idade, para estudar na cidade de Bundslau, onde permaneceu por 4 anos. Em 2 de junho de 1933, Fritz Herwig Schmidt se formou e retornou ao Brasil com o diploma de ceramista. Aí inicia outra história.

O fundador da Companhia Lorenz foi neto de Fritz Müller ou Johann Friedrich Theodor Müller, nascido na Alemanha. Friederich Fritz Carl Lorenz ou Fritz Lorenz nasceu na localidade de Tatutiba, no atual município de Massaranduba, em 16 agosto 1882 – filho de Robert Lorenz e Thusnelda Lorenz (solteira Müller).

Com cinco anos de idade, Lorenz foi morar com os avós, Fritz Müller e Karoline Müller, que foram responsáveis por sua educação e criação, até quando estava com 14 anos de idade. Com 20 anos de idade, Lorenz viajou para a Alemanha. Quando retornou, e seguindo o exemplo de muitos dos pioneiros do Vale do Itajaí, trabalhou na firma de Koehler & Asseburg, no Paraná.

Casou-se em 1909 com Marie e, mais tarde, assumiu, em companhia de seu irmão Johannes Hans Lorenz, a direção da firma de seu meio irmão, Richard Paul, em Timbó, lembrando que todas estas localidades faziam parte do grande território da Colônia Blumenau. Os irmãos Lorenz compraram a firma do meio irmão, Paul, e então fundaram a primeira fecularia de um total de 12, no Vale do Itajaí, na comunidade de Encano, e uma outra em Campo Alegre.

Produziam maisena e fécula de batata. Johannes Friedrich Lorenz, que também é chamado de Johannes Hans Lorenz, se mudou para Blumenau, para se dedicar inteiramente às indústrias de fécula na Altona. Friederich Fritz Carl Lorenz, o Fritz, ficou com a direção da firma em Timbó, adquirindo posteriormente a parte do irmão.

Investiu em produtos e beneficiamento (criação de porcos, banha, fumo, arroz, queijos, conservas e serraria). Mantinha seu centro industrial no bairro Encano (divisa com Indaial) e tinha diversas beneficiadoras. Faleceu em Blumenau, em 22 abril de 1959 e foi sepultado no cemitério luterano de Timbó

Fritz Lorenz, que nasceu em Massaranduba, morou em Blumenau, tinha firma em Indaial e foi sepultado em Timbó. Esta era a Colônia Blumenau do início do século XX.
Lembramos que 1959, quando Lorenz faleceu, Getúlio Vargas já havia retalhado territorialmente a grande colônia, fazendo surgir 31 novos municípios e enfraquecendo politicamente o município fundado por alemães.
A Obra – Fecularia “Encano” Lorenz e Cia .

Contam que a obra de arte foi feita com base em um postal existente com a imagem da construção fabril da Cia. Lorenz de Encano. Se assim foi, realmente, o pintor foi genial, pois conseguiu mudar o local do ponto focal e “retirar” os bloqueios visuais, como árvores e arbustos para enaltecer e destacar o rio Itajaí-Açu e a foz do ribeirão Encano, com sua flora rasteira e sua fauna. Conseguiu isso pintando em óleo sobre tela a partir do realismo de uma perspectiva em dois pontos de fugas, chamadas de exata, com informações matemáticas, como a distância e altura do observador.

A obra e o postal que inspirou a obra estão com alguns cuidados tomados pelo artista que apresenta a Lorenz através de uma ótica melhor.
Foto da obra exposta no museu – MAB. É maravilhosa.
Lorenz e Cia – Fecularia Encano – sagu – dextrina – araruta – goma.

As borboletas às margens do grande rio Itajaí Açu.
Casa enxaimel rebocada com linhas do neoclássico, marcando as construções urbanas com as principais características das casas rurais, que são a varanda e a cumeeira paralelas à estrada, entre outros.

Heinrich von Graf

O pintor Heinrich von Graf nasceu na Alemanha, no ano de 1859. De seu primeiro casamento com Emmy Graf (1863-1907), naquele país, Heinrich teve duas filhas, Eugenie Rosa (1896) e Elsa (1907). Sua primeira esposa faleceu em 1907. Em 1910, Heinrich, casado com Elizabeth Zimmermann, viajou para o Brasil. Chegou a São José da Terra Firme, Santa Catarina, nesse mesmo ano. Em São José, o pintor produziu várias obras. Entre 1917 e 1918, esteve internado no setor psiquiátrico do Hospício de Azambuja – Hospital Diocesano de Brusque, onde também produziu obras riquíssimas em detalhes; entre elas, pintou uma das obras do arquiteto Heinrich Krohberger, da qual não tínhamos encontrado imagens.
Algumas de suas seis obras feitas na cidade de Brusque.

Ponte Vidal Ramos, retratada por Heinrich von Graf em 1917, quando esteve internado na cidade de Brusque.
Vista de Brusque pintada por Heinrich von Graf em meados de 1917. Local não identificado. Fonte: BRUSQUE MEMÓRIA.
Centro de Brusque retratado por Heinrich von Graf em meados de 1917. Fonte: BRUSQUE MEMÓRIA.
Vista de Brusque a partir do interior da Igreja Luterana, com parte do Colégio Cônsul e da Igreja Matriz do lado direito. Fonte: BRUSQUE MEMÓRIA.
Igreja Luterana de Brusque retratada por Heinrich von Graf em meados de 1917. Fonte: BRUSQUE MEMÓRIA.
Heinrich von Graf e a filha. 1908. Fonte: BRUSQUE MEMÓRIA.

Enquanto esteve em Brusque, Heinrich von Graf produziu seis obras, das quais, três estão no Museu A. Dom Joaquim e as outras três, em um acervo particular.

Em 1919 esteve um período em Blumenau, onde também produziu obras meticulosamente detalhadas, como as duas que retratam a Igreja Luterana Centro – Igreja Espírito Santo, a Casa Rosada, “Pôr do Sol na Velha” e a “Fecularia ‘Encano’ Lorenz e Cia”, a obra doada ao MAB em 9 de março de 2023.

Em 1924, o pintor recebeu a Medalha de Prata da Academia Imperial de Belas Artes, por uma paisagem de Brusque (desconhecida).

Heinrich von Graf é visto em um autorretrato que fez com a filha, em 1908, antes de embarcar para o Brasil.

Croqui do Hospital Santa Catarina em sua inauguração.

 

Uma pintura que veio do Rio de Janeiro. Um presente de D. Pedro II a Blumenau. Igreja luterana Centro e a residência do pastor.
Igreja católica de Blumenau, em que a igreja construída e projetada por Heinrich Krohberger já havia passado por duas revitalizações. Nesse caso, recebeu as capelas laterais, o órgão e a elevação da torre. Aos fundos, o bairro Vorstadt.
1920. “Pôr do Sol na Velha”.
Essa foi uma das obras recuperadas. Foi colocado um vidro e nova moldura. Presente de D. Pedro II.
Fundos da Igreja Luterana Centro Blumenau – Espírito Santo. No cemitério.

Sua obra é composta de aproximadamente 70 pinturas entre retratos, paisagens, miniaturas e cenas diversas. Heinrich von Graf faleceu em Niterói, Rio de Janeiro, em 1934, com 75 anos.

Referências

  • BRUSQUE MEMÓRIA. Acervo: Autorretrato de Heinrich von Graf com sua filha.  Data aproximada: Entre 1917 – 1918.  Acervo: AJOM – Acervo Jornal O Município (Acervo Particular de Doris E. Bartorelli). Disponível em: Disponível: https://www.brusquememoria.com.br/acervo-imagem/1906  . Acesso: 5 de maio de 2023 – 14h19.
  • GERLACH, Gilberto Schmidt. Colônia Blumenau no sul do Brasil.  Gilberto Schmidt-Gerlach, Bruno Kilian Kadletz, Marcondes Marchetti, pesquisa; Gilberto Schmidt-Gerlach, organização; tradução Pedro Jungmann. – São José: Clube de Cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 2 t. (400 p.): il., retrs.
  • MAISTERDRUCKE, Kunstreproduktionen Fine Art Prints. Heinrich Graf. Artistas não classificados – 2 Obras de arte descobertas

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Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
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Agenda:

  • Hoje, dia 10 de maio estaremos lançando o Livro “Fragmentos Históricos Colônia Blumenau – Arquitetura * Cidade * Sociedade * Cultura Volume 1″ no espaço Cultural da Assembleia Legislativa de Santa Catarina – ALESC, Florianópolis.