Capa: Joaquim José de Sousa Breves Filho ou Engenheiro Joaquim Breves Filho – Diretor da EFSC e sua residência em Blumenau.
Joaquim José de Sousa Breves Filho foi um engenheiro nascido no seio de uma família poderosa e muito importante do Rio de Janeiro, capital do Brasil, na segunda metade do século XIX. Não por acaso foi uma das personalidades da história de Blumenau e da região do Vale do Itajaí.
Em um primeiro momento, sua aproximação com a história local e regional aconteceu devido a um casamento entre membros da família Konder e Flores, parte da família Breves. Depois, através de um cargo que Breves Filho recebeu, sem muito esforço, viabilizado politicamente, na Estrada de Ferro Santa Catarina EFSC. Tratou-se de um empreendimento regional, projeto alemão, privado, financiado por capital alemão e blumenauense, encampado pelo governo brasileiro, sem qualquer indenização aos investidores, durante a Primeira Guerra Mundial, época em que qualquer tipo de negócio como esse foi inviabilizado para alemães ou descendentes destes.
De acordo com um Relatório da EFSC de 1920, no dia 29 de novembro de 1911, o governo federal brasileiro encampou a linha da S.A. Estrada de Ferro Santa Catarina, por meio do Decreto-Lei N° 9.155. A EFSC, mesmo continuando a ser administrada pela Companhia alemã passava a ser patrimônio do Estado brasileiro, arrendada por 60 anos. Apesar dos projetos e estudos efetuados já estarem prontos em 1918, a verba necessária somente foi liberada para dar prosseguimento à construção da ferrovia no momento do arrendamento desta pelo governo estadual, em 1921, quando do Rio de Janeiro, foi designado para continuar coordenando a obra de construção da ferrovia, o engenheiro Joaquim José de Souza Breves Filho.
Vamos conhecer um pouco mais sobre as atividades e negócios oportunos de Breves Filho no Vale do Itajaí, durante a construção da única ferrovia construída com capital e tecnologia alemãs, no país. As demais construídas, foram ferrovias com tecnologia inglesa.
Joaquim José de Sousa Breves Filho nasceu em 28 de julho de 1878, no Rio de Janeiro, capital do Brasil. Foi filho de Joaquim José de Souza Breves Filho (1846-1912), que foi filho do comendador Joaquim José de Souza Breves (1804 – 1889), conhecido como “Rei do Café” no Império, escravagista e contrário à abolição da escravatura, e de Maria Isabel Frazão de Souza Breves (1816 – 1894), filha do Capitão-mor José de Souza Breves e do Barão de Piraí. O avô do engenheiro possuía uma população de milhares de escravos.
A vida política e a construção da riqueza dos Souza Breves se assentavam em uma base social agrária, que conciliava diversos alqueires de terras, a milhares de escravos. O número de fazendas espalhadas pela província fluminense, e suas respectivas escravarias, são citadas em diversos trabalhos. Viajantes de época se impressionavam com o número de escravos sob domínio dos Comendadores, como Maurício Ternaux-Comapans, diplomata francês a serviço na legação do Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX. Em visita à fazenda do Pinheiro, em 1876, destacou: ‘A família Breves é dona em conjunto de um pequeno número de doze mil escravos apenas! O dono do Pinheiro só por si possui três mil’. Estudos memorialísticos e historiográficos, que se dedicaram a pesquisar o século XIX, apontam que os Breves concentravam as maiores escravarias do Brasil Imperial. LOURENÇO, 2010.
Mudança para Blumenau
Joaquim José de Sousa Breves Filho se casou em 22 de novembro de 1868, em Santa Maria, Rio Grande do Sul, com Adelhaide Fischer, filha de um comerciante de Santa Maria, o imigrante alemão Wilhelm Fischer e de Christina (Solteira Holzbach) Fischer (1849 – 1900).
Na década de 1920 assumiu o comando da construção da ferrovia EFSC, agora encampada e pública, fazendo alterações nos projetos executados durante a segunda parte da construção dela. Muitas dessas alterações resultaram em modificações radicais, que envolveram mudanças do traçado da ferrovia EFSC e aumento das construções de estruturas ferroviárias.
A alteração do projeto original alemão nunca foi muito bem explicada na documentação oficial. Breves Filho, como o denominaremos doravante, assumiu o posto ferroviário, quando este empreendimento foi encampado pelo governo federal brasileiro após o término da 1ª Guerra Mundial. Foi uma indicação política – pois era filho de um político influente da capital do Brasil – Rio de Janeiro e, neto de um dos maiores escravagistas do Brasil, considerado o “Rei do Café” em seu estado.
O engenheiro fez parte da história da construção da EFSC e foi designado pelo governo brasileiro para o cargo de diretor, e também, engenheiro chefe, responsável por várias mudanças no traçado ferroviário original – no Vale do Itajaí.
Descobrimos, ao longo da pesquisa, que Breves Filho, engenheiro formado no Rio de Janeiro, também possuía estreitas relações e laços de família com a família Konder de Itajaí/Blumenau. Nessa época, Victor Konder tinha sido nomeado Ministro de Obras e Viação do Brasil, no Rio de Janeiro. A mãe do ministro Victor Konder foi Adelaide da Silveira Flores (1860 – 1958) casada com o imigrante alemão, Markus Konder (1854 -1898) (casamento realizado em 24 de julho de 1877). Adelaida da Silveira foi irmã de José Henriques Flores Filho (1842 – 1891) – primeiro prefeito de Blumenau.
O que isso tem a ver com o engenheiro Breves Filho, que teria “caído de paraquedas” na região? Talvez, nem tanto, foi obra do acaso, sua mudança para Blumenau.
Os irmãos Adelaide e José Henriques (e mais 6 irmãos) eram filhos de Maria Clara da Conceição Breves da Silveira (1819 – 1907), que era filha de Francisca Clara de Assis de Souza Breves (1788 – ) que era irmã do Comendador Joaquim José de Souza Breves (1802 – ), avô do engenheiro. Portanto, a mãe de Victor Konder e o primeiro prefeito de Blumenau eram netos da irmã do avô do engenheiro Breves Filho, parentes, o que facilitou para Victor Konder, mudar-se para a capital, Rio de Janeiro e Breves mudar-se para Blumenau. Em síntese, o engenheiro Breves Filho foi primo dos Konders.
Em 22 de maio de 2015 – via correspondência eletrônica – recebemos uma mensagem de um descendente do Barão de Piraí, Aloysio Clemente Breves, também primo dos Konders e dos Breves, o qual esclareceu estes laços familiares.
A mensagem de Aloysio Clemente Breves.
Excelente a matéria sobre o Breves Filho. Sou descendente do Comendador Joaquim Breves. Tenho parentes em Blumenau pelo lado paterno – família Beiler de Gaspar. Tirei fotografias da casa quando estive em Blumenau pela última vez. Gostaria de publicar no meu site – brevescafe.net que trata da história da família Breves. Não sei se você conhece, mas os Konder estão intimamente ligados aos Breves. Uma neta do barão de Piraí, ligada aos Flores de Itajaí se casou com o imigrante alemão Marcus Konder. Um abraço, Aloysio Clemente Breves
Em 9 de fevereiro de 1917, recebemos outra mensagem eletrônica esclarecedora do genealogista Renato La Porta Pimazzoni:
“Joaquim Breves Filho foi primo dos Konders, por parte dos Flores. Foi primo em 2º grau de meu bisavô materno, Raymundo Flores. Praticamente toda a família Flores trabalhou na estrada de ferro, na época. Raymundo era neto do coronel José Henriques Flores, o qual era dá família Breves, assim como sua esposa. A família Breves foi a mais rica do império, até a abolição dá escravatura. Tinham o domínio do tráfico de escravos e a maior plantação de café, chegando a responder por 7% dá produção nacional e o maior plantel de escravos do país, com mais de 15.000 negros. “Renato La Porta Pimazzoni.
O pai de Breves Filho, de quem este herdou o mesmo nome, foi deputado e homem influente na capital federal, Rio de Janeiro. Sua formação deu-se nesse cenário da elite nacional do final do século XIX e início do século XX. Sua família foi a maior proprietária de terras e escravos da província do Rio de Janeiro, e de grande influência social e política no país.
O pai de Breves filho, após ocupar o cargo de Promotor da Comarca de São João do Príncipe, ganhou destaque político no Partido Liberal, como Vereador e Presidente da Câmara de sua cidade natal, São João Marcos. Joaquim Breves, foi eleito deputado estadual nos anos de 1876 a 1881, e de 1881 a 1886. O pai do engenheiro Breves Filho abandonou sua convicção monarquista ao perceber que a República era inevitável e passou, então, a trabalhar com os republicanos e para o êxito da República. Por essa decisão, recebeu o convite oficial para a presidência de uma das províncias. Assumiu o mandato de deputado federal na legislatura de 1900 a 1902.
Achamos pertinente esta apresentação, para melhor entendimento das mudanças nos rumos da construção das novas etapas da ferrovia EFSC. A formação sociocultural familiar do novo engenheiro da equipe de construtores, muito diferente da existente no perfil social e econômico das cidades do Vale do Itajaí, naturalmente teve reflexos nas ações e decisões tomadas durante o prosseguimento da construção da EFSC. Muitas vezes, percebe-se a interferência e as decisões tomadas com base nas estreitas relações políticas na capital federal e nos novos interesses políticos, sociais e econômicos muito bem embasados e justificados em discursos e relatórios bem escritos e articulados.
A história de Carlos Krueger: Um personagem – Carlos Krueger – Tradição e História
Obra ferroviária original comprometida no Alto Vale do Itajaí
O Túnel desmoronado de Atafona – Lontras SC
A ferrovia seguia para o Alto Vale do Itajaí. Breves arrumou um parceiro “comercial” e e que ficou muito conhecido em Südarm, depois Rio do Sul, o engenheiro Gino Alberto de Lotto, sócio e parceiro comercial e político de Ermmembergo Pelllizzetti, igualmente nome da história da região.
Mudanças promovidas por Breves Filho
Projeto original da EFSC
Encontram-se registradas no relatório do Engenheiro Breves Filho, palavras aos seus superiores, como recurso de persuasão da importância da construção do prolongamento da EFSC e, com isto, a liberação de verbas.
O prolongamento desta Estrada é providência que não deve ser mais retardada. Basta considerar-se a vasta e rica região sobre a qual exercerá decisiva influência, o far-west catharinense e o norte do Rio Grande do Sul, dotado de terrenos fertilíssimos, com um clima temperado e salubérrimo, onde se succedem as zonas agrícolas e pastoris, e que, pela variedade de altitudes e de composição do solo, são apropriados a nelles medrarem os productos das zonas tropicaes ora os cereaes e fructas dos climas europeus. Esse prolongamento é uma exigência nacional, de ordem econômica e social, para transportes fáceis à produção agrícola e industrial, que se intensifica, e servir de valioso factor da nacionalização dos elementos heterogêneos, que vão povoando os nossos sertões, além de obedecer a razões estratégicas e, finalmente, financeiras. (BREVES FILHO, 1920).
O engenheiro Breves Filho sugere, igualmente, a mudança do traçado na área central de Blumenau, tendo recebido apoio por meio da justificativa do primeiro diretor da EFSC, Otto Rohkohl. Segundo este, a mudança de traçado da ferrovia na área central de Blumenau seria efetivada pela falta de verbas do município para quitar o montante da obra. Segundo Rohkohl, o custo para fazer o muro de contenção da barranca do rio entre o porto do centro e a estação de Blumenau – se a ferrovia seguisse o primeiro traçado (junto à margem direita do rio Itajaí-Açu) – seria superior ao da construção de duas pontes sobre o rio Itajaí-Açu, um túnel, um elevado e uma nova estação.
Foram estudados vários projetos, um dos quais o de marginar o rio Itajaí-Açu em sua margem direita, até “Vorstadt”, mediante a construção de um muro de arrimo desde a foz do Ribeirão da Velha até “Vorstadt”. Esta obra, por ser bem mais cara do que duas pontes, mas que por sua vez viria a beneficiar a cidade, que com isto iria possuir um cais de vários quilômetros de comprimento, só poderia ser feita com a cooperação do governo brasileiro, federal e municipal. Como o município era pobre e não tinha os meios para cooperar neste plano e o governo federal nenhum auxílio queria prestar para sua realização, foi abandonado este projeto.
O capital para esse trecho da obra fora liberado pelo governo federal; portanto, não deveriam existir problemas quanto ao valor do projeto inicial e a disponibilidade ou não de capital por parte do município. O projeto original poderia ser implantado sem preocupações financeiras.
Desprezando a estação ferroviária de Blumenau já construída – um dos mais belos exemplares da arquitetura ferroviária da região construída com a técnica construtiva enxaimel, o Engenheiro Breves Filho como mencionado, propõe o novo projeto, no qual sugere o deslocamento da ferrovia da área central, por meio da construção de uma nova estação ferroviária de Blumenau, duas pontes sobre o rio Itajaí-Açu, um elevado e um túnel, justificando que seria mais barato do que se fosse construído o projeto original alemão, onde o traçado da ferrovia passava no porto fluvial.
O engenheiro Breves Filho coordenou, então, a construção da ponte de ferro Aldo Pereira de Andrade, no final da década de 1920 do século XIX, ligando nada a lugar nenhum, desconectada do cronograma de obras e não observando o local da Estação de Blumenau, fora do traçado ferroviário que utilizaria, então a ponte.
A ponte permaneceu sem uso até a data da inauguração final do trecho ferroviário, em 1954, tendo, portanto, permanecido sem uso por 23 anos.
Terminada a ponte ligando parte da ferrovia a lugar nenhum, tornou-se necessária a construção de um túnel, de uma segunda ponte e de mais um elevado.
O engenheiro Breves Filho argumentou que a mudança ocorreu para evitar a passagem da ferrovia pelo centro da cidade, que, nessa época, não contava ainda com a rodovia à margem direita do rio Itajaí-Açu (atual Av. Presidente Castelo Branco). Lembramos que em todas as cidades ferroviárias do mundo, até então, o centro e as principais atividades sociais aconteciam em torno da estação ferroviária.
Geralmente, as terras ao longo de uma linha férrea eram consideradas um material de grande especulação no ramo imobiliário, até mesmo antes de a ferrovia ser construída. No Vale do Itajaí, pode-se constatar que ao longo da linha da EFSC surgiram inúmeros núcleos urbanos, e outros se desenvolveram. Portanto, o argumento do engenheiro-chefe da EFSC é infundado sob o ponto de vista técnico, econômico e urbanístico para a época.
Com essa mudança de traçado, a primeira estação de Blumenau ficou sem utilidade para a ferrovia, pelo menos para o uso como estação ferroviária, tornando-se necessário a construção de outra, que foi usada quando da inauguração do trecho Blumenau–Itajaí.
Vale observar, ainda, que a mudança do traçado não aumentou nem diminuiu o trajeto (em torno de 1,5 km). Resultou, entretanto, no fato de que a EFSC construiu, desnecessariamente, a mais, uma estação ferroviária para Blumenau; duas pontes sobre o rio Itajaí-Açu; um túnel; e um elevado de concreto.
Especulações Fundiárias – Prolongamento Ferroviário
Nesta época, antes da efetivação de ferrovia, a região apresentava sérios problemas de transporte.
Segundo Cátia Dagnoni, Diretora do Museu e Arquivo Histórico da Fundação Cultural de Rio do Sul, a região de Subida era até então um grande desafio para o tráfego entre os núcleos do Alto Vale do Itajaí e Blumenau, ao se percorrer picadas no meio da mata, subindo e descendo a serra, e com isto dificultando muito o desenvolvimento local daqueles núcleos para o Stadtplatz da Colônia Blumenau.
A criação do núcleo de Riachuelo-Lontras revelou-se um ato corajoso e audacioso, devido à distância do centro da colônia, precárias condições de transporte e comunicação, difícil assistência médica, em caso de emergência ou acidentes graves. As dificuldades fluíam na medida em que o movimento de tropas aumentava. O transporte era realizado em lombo de burro, num picadão que piorava a cada dia pela passagem das mulas e bois, o qual principalmente nos dias de chuva e nos invernos se tornava intransitável. (DAGNONI , [s.d.]).
Agentes da EFSC envolvidos em negócios fundiários
As condições e o movimento migratório para as terras do Alto Vale aumentaram a partir da segunda década do século XX, coincidentemente com a data de início da construção do trecho ferroviário rumo a Südarm – Rio do Sul.
Entretanto, muitos atribuem tal desenvolvimento ao aldeamento indígena na localidade de José Boiteaux, à presença de colonizadores como Feddersen, Reif e Jensen, e às ações do Kulturverein de Blumenau. Estas empresas colonizadoras faziam parte dos grupos que construíam os caminhos e estradas nessa região, a exemplo do Coronel Feddersen, que se empenhara em trazer a ferrovia para o Vale do Itajaí.
Essas empresas tornaram-se, em geral, concessionárias de terras em pagamento de estradas construídas nessas zonas catarinenses. Devido ao seu esforço, dentro de poucos anos povoaram-se os Vales do Taió, Rio do Oeste, do Trombudo, das Pombas, até o Canoas. E, mais tarde, a partir de 1913, principalmente pelo trabalho de Heinrich Reif, a colonização transformou em florescentes núcleos as terras banhadas pelo Lauterbach, pelo Pacabach, pelo Sandbach, pelo Cotias, até os rios da Batalha e Águas Negras. (PELLIZZETTI apud DAGNONI, [s.d]).
Mais tarde, também se tornou concessionário de terras às margens do Rio do Oeste (atual Rio do Sul), o engenheiro da EFSC, parceiro de Ermmembergo Pellizzetti na região, o engenheiro Gino de Lotto (mais precisamente na parte alta de Subida e no Ribeirão dos Bugres), e o engenheiro- chefe da EFSC, Joaquim Breves Filho. Estes engenheiros, guardavam para si grandes extensões de terras junto ao traçado ferroviário, para si. Dagnoni também afirma que o Engenheiro Breves buscava no colono, a mão de obra para a construção da estrada de ferro. Os trabalhadores da construção ferroviária ocupavam o entorno da obra e, muitas vezes, recebiam como pagamento terras devolutas. Moravam de maneira inadequada, em barracos próximos à frente do trabalho.
Ainda conta D’Amaral (1950), conforme Pellizzetti (1981), que em 1918 também se tornou concessionário das terras nas margens do Rio do Oeste, mais tarde transferidas ao Dr. Gino De Lotto, na parte alta da Subida e ainda no Ribeirão dos Bugres, o Dr. Joaquim Breves Filho, que localizou nessas terras, ao que parece, os colonos apenas como agregados seus. (DAGNONI, [s.d.]).
Em depoimento dado à revista Blumenau em Cadernos (agosto, 1960, p.154), Heinrich Hacker deixa claro que a interferência do novo engenheiro-chefe da EFSC, Breves Filho, ia muito além dos assuntos relacionados à construção da ferrovia.
Sustentei nas minhas colônias, escolas e construí, por conta de minha empresa, estradas de rodagem de grandes extensões e pontes. Mais tarde (1916), adquiri terras ao lado direito do Rio Timbó… a Colônia Francônia… em frente da colônia São Pedro, e comecei a povoar essa zona, subdividindo-a e parcelando-a. Em virtude da interferência do engenheiro Joaquim Breves Filho nas terras da colônia Francônia, e dos entraves, por ele opostos, aos meus trabalhos, situação que somente mais tarde foi solucionada pelo Interventor general Ptolomeu de Assis Brasil (1931), abandonei a tarefa de colonizar, vendendo as terras pertencentes à firma e à mesma concedidas (com exceção, naturalmente, das terras de Francônia). (BLUMENAU EM CADERNOS, 1960, p.154).
Todas essas movimentações, destacando na linha do tempo histórico, foram efetuadas na segunda década do século XX, durante a construção da EFSC sob o comando de Breves Filho, desde quando o Estado de Santa Catarina se tornou arrendatário, sob o Decreto Federal 15.152, de 2 de dezembro de 1921.
Ficou determinado, em contrato, que o Estado de Santa Catarina daria prosseguimento e viabilizaria a construção da ferrovia na direção de Barra do Trombudo, em torno de 32 quilômetros, e de Blumenau até o porto de Itajaí mais 48 quilômetros, além de reaparelhar o trecho ferroviário existente (linha e material rodante), para promover sua adequada manutenção.
Foi efetuada uma análise sobre qual das opções seria construída em primeiro lugar, tendo-se decidido pelo trecho entre o entroncamento de Hammonia até Barra do Trombudo, pois de Blumenau a Itajaí existia já a opção do transporte fluvial pela Companhia de Navegação, pertencente à EFSC.
Ficou determinado que Breves Filho, além de administrar a EFSC, acumularia também o cargo de engenheiro-chefe das obras do prolongamento ferroviário. Foi formada uma equipe de auxiliares, pois os próximos 22 quilômetros da linha a serem construídos seriam os mais difíceis de toda a EFSC, devido à necessidade de se transpor a Serra do Mar, na localidade de Subida. Este trecho, também seria o local de onde se vislumbrariam as mais belas paisagens de todo o trajeto ferroviário.
Para confirmar o bom relacionamento entre o engenheiro e administrador da EFSC, Joaquim Breves Filho, e as lideranças políticas locais, estaduais e federais, em dezembro de 1922, o governo federal cortou o repasse de verbas para inúmeras obras estaduais no país, argumentando contenção de custos, o que, entretanto, não ameaçou o repasse para as obras ferroviárias no Vale do Itajaí, que teve seu traçado modificado para economizar gastos, que eventualmente não existiam.
Na época, o engenheiro Joaquim Breves Filho afirmava que isso somente fora possível devido ao excelente relacionamento entre os governos federal e estadual, e graças ao tráfico de influências, elevando sua moral perante à sociedade de Blumenau e da região.
Variante do Prolongamento
Assim que a obra ferroviária se reiniciou, sob o comando do novo engenheiro, surgiram as mudanças no projeto já existente, particularmente no traçado.
Em 1922, Breves Filho apresentou nova proposta para o entroncamento de Subida, desqualificando o projeto alemão existente. Deixamos o aprofundamento desta questão como elemento de futuras investigações. Qual o verdadeiro e real sentido da mudança de traçado do projeto original sugerida pelo Engenheiro Breves Filho ao órgão federal que à época gerenciava o transporte ferroviário no Brasil, antes da criação do Departamento Nacional de Estradas de Ferro?
No projeto original, o entroncamento da linha já existente fora projetado para se localizar dois quilômetros antes da estação de Hammonia. Breves Filho argumentava, em defesa de sua proposta, que este ponto, mais especificamente no conhecido km 67, ficaria espremido entre o rio e a encosta da Serra, não tornando a estação propícia e apta – devido ao pouco espaço restante – para receber mercadorias e pessoas. Prosseguindo em sua argumentação, dizia o engenheiro que “seria somente uma estação para formação dos trens que seguiriam para o Alto Vale e até Hammonia”. Será visto, posteriormente, que mesmo com a mudança, foi exatamente este papel que o entroncamento cumpriu em outra localização.
A proposta de Breves Filho sugeria que o entroncamento projetado para o km 67 fosse construído no km 63, em plena serra, na estação de Subida, já edificada. Vale esclarecer que esta estação tinha melhor acesso às estradas de rodagem.
O engenheiro afirmava, por meio de números, na tentativa de impressionar com suas justificativas, que na nova proposta o trem poderia subir a serra em aclividade máxima de 1,5%, numa distância de 15 quilômetros, contra 1,8% numa distância de 9 quilômetros do traçado anterior.
Há registros de que no traçado original havia uma exigência a ser cumprida, que era a construção de um depósito para locomotivas que auxiliariam na tração das composições serra acima, não necessária na nova proposta de Breves. Porém a proposta de Breves Filho foi aceita e aprovada pelo órgão federal, passando a se chamar “variante do prolongamento”.
Com isso, engenheiro Breves Filho deixou sua “marca” na única ferrovia construída com tecnologia alemã no Brasil. Terminando sua missão, retornou a sua cidade natal, com sua família, esposa Glória Leopoldina Fischer e seus três filhos: Aida Breves (1906– -), Paulo de Souza Breves (1917–2006) e Romy de Souza Breves. O engenheiro faleceu no Rio de Janeiro em 16 de outubro de 1941, com a idade de 63 anos. Sua residência está localizada na entrada do Stadtplatz de Blumenau, próximo à residência de Gustav Salinger, do Schmidt, Alwin Schrader e ainda podemos fotografá-la, no tempo presente. Vamos observar sua localização e arquitetura. A edificação histórica completou 124 anos de existência no ano de 2024.
Arquitetura da Residência de Joaquim José de Souza Breves Filho – Blumenau
De acordo com informações na placa colocada pela municipalidade para a identificação do patrimônio histórico arquitetônico, esta monumental edificação foi construída em 1900. O engenheiro Breves Filho chegou a Blumenau no início da década de 1920, quando assumiu o posto de Diretor e engenheiro chefe da EFSC. A casa já existia e sofreu uma grande reformulação a modificações, até mesmo no seu estilo arquitetônico, que originalmente tinha muitas características do estilo gótico. Passou por transformação para receber o herdeiro do Comendador Breves da capital do Brasil.
Localização
Antes de termos essa informação, não conseguíamos compreender que as características arquitetônicas fossem de uma edificação da década de 1920 e não do ano de 1900. Concluíamos que pelas características e linguagem arquitetônica, poder-se-ia afirmar seguramente, que a casa, também foi construída na década de 1920, ou seja, que foi feita especialmente para a família do engenheiro Joaquim Breves Filho. Mas não foi exatamente assim.
Arquitetura do início do século XX
A arquitetura construída na centralidade de Blumenau, na virada do século XIX para o século XX, era uma arquitetura de transição entre a forma de construir com a técnica enxaimel e o novo estilo internacional oriundo da Europa, geralmente autoportante, adotada pelos novos comerciantes e industriais na região (nova elite), tais como o classicismo, o neoclassicismo e o eclético. Por ausência de conhecimento da nova técnica construtiva, autoportante, muitas vezes, edificações com estrutura enxaimel recebiam reboco com elementos decorativos destes novos estilos. Sendo que uma ou duas décadas depois, já se construíam construções autoportantes de tijolos maciços, como é o caso da residência de Joaquim Breves Filho.
Sua planta é irregular, formada por justaposição de vários volumes com elementos utilizadas em edificações construídas em Blumenau nas décadas de 1920 e 1930. Os ambientes estão distribuídos em dois pavimentos, sótão (mansarda) e porão. Originalmente, antes da intervenção da década de 1920, poder-se-ia dizer que a edificação possuía somente um pavimento e uma grande mansarda, com a mansarda francesa.
O conjunto atual se caracteriza pela linguagem eclética, com a presença de novas tecnologias, como ladrilho hidráulico, piso cerâmico queimado tipo sextavado, ferro nos adornos de cercas e outros elementos e estuque, material com origem no barroco alemão, nos muitos elementos de decoração, como forros, cimalhas, perfis, roda-tetos e rodapés. A edificação é dotada de paredes autoportantes de tijolos maciços, rebocadas com um acabamento texturizado – pintado.
Há a presença de estuque nos beirais, e por certo deve ter sido usado no seu interior também. No Brasil, o estuque foi largamente empregado a partir de meados do século XIX até as primeiras décadas do século XX, com decorativismo usado nos “neos”.
“O estuque é uma argamassa à base de cal, areia e, conforme o caso, gesso (este em pequena quantidade, apenas para acelerar a pega), usada para revestir as paredes internas e os forros, servindo de vedação, preenchendo os interstícios de uma armação qualquer, como por exemplo, telas de arame, sarrafos de madeira, fibras…”Centro de Estudos avançados de Conservação Integrada.
A edificação histórica atual possui aberturas de madeira – com janelas de duas folhas – usuais nas edificações dos pioneiros desde sua casa temporária. Também, conta com a presença de um porão construído em pedras aparentes, comuns no território da Alemanha que fez parte do antigo território do Império Sacro Romano. A edificação, na sua fachada frontal, conta com uma monumental varanda localizada ao lado de um grande Bay Window.
A edificação resultante atual, que foi residência do engenheiro Joaquim José de Souza Breves Filho – Diretor da EFSC e engenheiro chefe, é resultado de uma construção feita em três tempos distintos. A primeira e original, próxima ao barranco, mas não encostada. A segunda feita para receber a família, na década de 1920 e a última, nas décadas de 1950/1960 e finalmente houve um aumento da construção sobre o barranco – intervenção recente e nada adequada ao patrimônio histórico arquitetônico. São perceptíveis e distintas, através dos materiais usados, como também, a presença de diferenças nos acabamentos, mesmo que aparentemente, tenha havido alguma tentativa de se fazer semelhante, como por exemplo, a textura do reboco. No material filmado em vídeo, não tínhamos ainda a informação sobre a imagem da casa construída em 1900, alterada, na década de 1920, podendo ter informações orais nossa, desencontradas, mas publicadas com base nas imagens do local.
As imagens Comunicam
Implantação no Terreno
Nesta região do bairro Vorstadt – cidade de Blumenau, a topografia é acidentada caracterizando pelo vale, resultado da presença da montanha e de um curso d’água. O terreno apresenta a configuração de um lote colonial, com uma área maior, denotando uma topografia acidentada e com a presença de um pequeno ribeirão, o que nos fez identificar no antigo mapa, com o desenho dos lotes coloniais. A casa foi locada na extrema esquerda do terreno, para permitir a disponibilidade de uma maior área, para o jardim, paisagismo e o rio.
Tombamento
No registro de tombamento do FCC, está registrado sob número 137, para esta imagem. O número em questão, na verdade, está na casa do antigo Bar Kriado – tipologia enxaimel. O número desta edificação tombada é 89, como mostrado nos detalhes fotográficos. Também o ano de tombamento difere de outro registro de FCC.
Tombamento
P.T. nº: 120/2000 – FCC
Foi tombada pela FCC no ano 2002.
A residência foi construída no início do século XX e se localiza no Centro Histórico de Blumenau.
Endereço: Rua Alvin Schrader, 89. Bairro Vorstadt – Blumenau SC
Imagens do Tombamento FCC
Dados do livro de Tombamento do FCC 2021 –
diferente de dados do próprio FCC do link: Clicar aqui.
Registro do Arquivo Histórico José Ferreira da Silva
Mais registros de 2021
Como era a edificação – antes da revitalização da década de 1920
Recebemos da Equipe de Produção de O Município Blumenau, a qual fez um documentário sobre a residência de Breves Filho em setembro de 2021, imagens da casa, mencionando que as haviam recebido de um membro da família que nela residira. Observando as fotos, poderíamos dizer que a casa foi construída, realmente, em 1900, no estilo Art Nouveau e modificada, descaracterizada, a partir dessa linguagem para a tipologia que conhecemos no momento presente, apresentando algo não muito definido. Isto porque permaneceu com elementos da arquitetura antiga, porém, sem as características do Art Nouveau presentes nas aberturas e na mansarda.
Quem a projetou?
É a pergunta que fica.
Originalmente, esta joia da arquitetura local era ainda mais magnífica, a partir de suas linhas originais do Art Nouveau, expressão rara na região.
Casarão de neto do “Rei do Café” integra arquitetura única à natureza de Blumenau – O Município Blumenau
Nota:
Para acessar o livro – Clicar sobre a capa:
Um registro para a História!
Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
@angewittmann (Instagram)
@AngelWittmann (Twitter)
- Primeiro Diretor da EFSC – Entrevista ao Frederico Kilian
- O Edifício América – Centro Histórico de Blumenau – Dossiê para a História.
- Engenheiro Joaquim Breves Filho – Diretor da EFSC e sua residência
- Um Passeio pelo Bairro Victor Konder
- Primeira Estação Ferroviária de Blumenau foi demolida e deu lugar a edificação da Prefeitura Municipal de Blumenau
- Engenheiro Joaquim Breves Filho – Diretor da EFSC
- Um Passeio pelo Bairro Victor Konder
- EFSC – Antigos artigos publicados sobre a ferrovia inspiram novas publicações
- A Ferrovia – EFSC
- Estrada de Ferro Santa Catarina – Há 45 anos que foi erradicada da paisagem do Vale do Itajaí
- Da Estrada de Ferro Santa Catarina à Ferrovia da Integração
- Um passeio no Trem da EFSC – Estrada de Ferro Santa Catarina
- Primeiro Diretor da EFSC – Entrevista ao Sr. Frederico Kilian
- A Ferrovia – EFSC
- Ferrovia da Integração – Pauta em Florianópolis
- Santa Catarina teve única ferrovia brasileira construída com tecnologia e capital alemães
- Passando por Warnow/Ascurra – Comunidade Centenária – Ilse
- A Ponte Lauro Müller
- Comissão Pró Ferrovias do Vale do Itajaí
- O retorno da ferrovia ao Vale do Itajaí
- Pessoas e a Ferrovia na região
- A Ferrovia no Vale do Itajaí
- Friedrich Richard Krauel – O primeiro embaixador alemão que visitou a região do Vale do Itajaí – Século XIX – então Colônia Blumenau
Referências
- BREVES CAFÉ. José Joaquim de Souza Breves, ou José Breves – O dono do Pinheiro e Bracuhy. História do Café no Brasil Imperial. Disponível em: http://brevescafe.net/josejoa.htm. Acesso em: 23 de abril de 2024 – 19h34.
- FCC. Patrimônio Edificado tombado pelo Estado de Santa Catarina. Disponível em: https://www.cultura.sc.gov.br/a-fcc/patrimoniocultural/patrimonio-material/listagem-de-bens-tombados#blumenau. Acessado em: 5 de agosto de 2021 – 23:34h.
- LOURENÇO, Thiago Campos Pessoa. O Império dos Souzas Breves nos Oitocentos: Política e escravidão nas trajetórias dos Comendadores José e Joaquim de Souza Breves. Pós-Graduação em História na Universidade Fluminense – Dissertação de Mestrado. Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Sociais – Área de História. Niterói, 2010.
- WITTMANN, Angelina C.R. A Ferrovia no Vale do Itajaí – Estrada de Ferro Santa Catarina. -Blumenau : Edifurb, 2010. – 304 p. :il.
- WITTMANN, Angelina C. R . A estrada de ferro no Vale do Itajaí: Resgate trecho Blumenau-Warnow . Blumenau : Edifurb, 2001. – 145p. :il.