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Quem tem medo da gasolina formulada?

Projeto de lei em Blumenau pretende obrigar postos a informar algo que, segundo ANP, postos e especialistas, não existe

O vereador Almir Vieira (PP) apresentou à Câmara de Blumenau um projeto de lei que obriga os postos de combustíveis da cidade a informarem ao consumidor se vendem gasolina formulada ou refinada. A ideia repete uma lei estadual, sancionada em junho de 2017 pelo governador Raimundo Colombo, que faz a mesma imposição aos postos de todo o estado.

Leis do tipo surgiram em diversos estados brasileiros nos últimos anos. Elas respondem a uma preocupação que se espalhou via redes sociais. Segundo a tese, haveria dois tipos de gasolina circulando no país: a refinada (boa) e a formulada (de baixa qualidade). O consumidor poderia estar sendo lesado sem saber.

A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), órgão que regulamenta os combustíveis no país, garante que não há a necessidade da lei porque toda gasolina produzida no Brasil é formulada. Isso acontece porque, para que a gasolina esteja dentro do padrão exigido pela agência, precisa passar por formulação. Toda gasolina vendida nos postos do país tem de seguir as especificações contidas na Resolução ANP nº 40/2013.

Segundo a agência, “não há razão para se falar em gasolina ‘formulada’ ou ‘refinada’ – não há diferença – ou seja, toda a gasolina produzida no Brasil – e no mundo – destinada ao consumidor final é formulada”.

Segundo a ANP, circulam no país a gasolina A, que não tem adição de etanol anidro; a gasolina C, também chamada de comum C, que tem o percentual obrigatório de etanol anidro; e a gasolina aditivada, que é uma gasolina comum C com um aditivo detergente para limpar o sistema de alimentação do veículo.

Como saber qual gasolina tem na bomba?

A questão é o principal problema que o presidente do Sindicato do Comércio de Varejista de Derivados do Petróleo de Blumenau, Júlio César Zimmermann, aponta para cumprir leis como a que está em discussão. Ele explica que os proprietários dos postos recebem na nota apenas a especificação “gasolina Comum C”, que é a gasolina já dentro das regras da ANP.

Quando recebe gasolina nova, o que Zimmermann faz é verificar a quantidade de álcool na fórmula. O presidente do sindicato diz que a categoria já solicitou à ANP informações sobre a composição da gasolina que recebe, mas não obteve resposta.

“Nós também estávamos com essa ideia (de identificar a formulação da gasolina), mas depois que a ANP não respondeu, desistimos. Isso acaba se tornando uma polêmica, porque como eu vou afirmar uma coisa se a agência diz outra?”, questiona Zimmermann.

Para especialista, lei é inviável

O coordenador do Programa de Combustíveis da Furb, Edesio Luiz Simionatto, diz que o projeto de lei é inviável, já que refinarias e distribuidoras sempre fazem misturas para que a gasolina fique de acordo com as especificações da ANP. Ou seja, formulam o combustível.

Hoje, a equipe do professor Simionatto faz o monitoramento do combustível vendido nos estados de Santa Catarina e Paraná. De forma geral, ele diz que a gasolina de Santa Catarina apresenta boa qualidade.

“Aqui em Santa Catarina deve estar na faixa de 1,5% a 2% das não conformidades que aparecem. Mas isso é muito esporádico. É um percentual dentro dos limites aceitáveis. E às vezes essas não conformidades não são tão lesivas ao consumidor, pois variam muito pouco. Por exemplo, ter 28,5% de álcool quando o limite seria 28%”, conta.

Simionatto explica que a quantidade de álcool está diretamente ligada ao desempenho do combustível. Neste caso, uma gasolina com excesso de álcool renderá menos por quilômetro rodado. O professor também explica que a produção nacional de combustível se concentra na Petrobras. Depois que sai da refinaria, tem um longo caminho até chegar ao posto. E, na maioria das vezes, quando acontece, a adulteração é feita neste caminho.

“Dificilmente um dono de posto adultera a própria gasolina. Quando adulterada, ela já foi feita no caminho”, diz.

Projeto precisa de aprofundamento, diz autor 

Questionado sobre a viabilidade e a necessidade da lei, o vereador Almir Vieira afirmou que tem o desejo de se aprofundar no tema ao longo da tramitação do projeto. O autor reconheceu que não estudou a questão da “gasolina formulada” a fundo antes de enviar o texto à Câmara. Ele destacou que a proposta ainda precisa passar pelas comissões. Disse que pretende conversar com os setores envolvidos.

“É uma coisa complicada, porque como eu vou comprar algo que eu não sei. Por isso o projeto ainda vai para discussão”, diz.