Existe um rio no Alto Vale do Itajaí com o nome Rio Krauel. Em outros tempos, esta região era Blumenau. Alguém nos inquiriu o porquê do nome e quem foi Krauel. Feliz pergunta e pesquisa, pois além de descobrir quem foi Krauel, descobrimos o seu nome completo:  Friedrich Richard Krauel,informação  que não consta em registros publicados da história regional, estadual e do Brasil. Descobrindo um pouco sobre Krauel, também preenchemos uma lacuna da história ferroviária local, que surgiu junto do projeto da colônia agrícola de Hermann Blumenau quando este escolheu o local de sua centralidade – junto a última área navegável do Rio Itajaí Açú.

Mapa desenhado por José Deeke de 1905, onde um rio na região de Ibirama foi batizado com o nome de Krauel em homenagem ao diplomata alemão Friedrich Richard Krauel que viajou pela região em 1897 – trajeto aproximado feito por sua comitiva – em vermelho no mapa alterado por nós. Fonte: Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Carl Hoepecke.

Dr. Krauel foi o primeiro Embaixador da Alemanha que visitou a Colônia Blumenau – região do Vale do Itajaí – chegando à região em 19 de maio de 1897 – em Companhia do governador de Santa Catarina Hercílio Pedro da Luz, do Cônsul Honorário Alemão em Florianópolis Carl Franz Albert Hoepcke (ex colono da Colônia Blumenau) e demais membros das comitivas, encontrando lideranças locais.

O diplomata visitou Blumenau, Indaial, Warnow, Timbó, frente de obras que abriam estradas no Alto Vale – pela equipe de Gottlieb Reif. Foi amplamente festejado, recepcionado pelas sociedades de cada localidade, grupos musicais, corais e de ginástica. Krauel, de acordo com a tese de doutorado de Yokell, enviou relatórios entusiasmados para Berlin, comentando como os colonos foram bem tratados e como eram excitantes as perspectivas comerciais entre os dois países, o que influenciou positivamente os investidores da Estrada de Ferro Santa Catarina – EFSC, cujo trecho foi inaugurado em 1909.

Para isso, fez análises. Mesmo com boas perspectivas comerciais, a seu ver, o comércio estava um tanto carente, pois o fluxo de migrantes alemães para o Brasil estava diminuindo.As colônias alemãs no Sul do Brasil são um rico tesouro que passou despercebido até agora’, escreveu ele a seus superiores. Karl Kaerger, um agrônomo alemão que viajava com ele, compartilhava da mesma opinião.

Durante sua visita, além de checar se seus compatriotas estavam felizes na nova pátria, fez o que Hermann Blumenau deveria ter feito, quando veio ao Brasil como fiscal da Imigração alemã, sondou possibilidades comerciais entre Brasil e Alemanha, através das colônias alemãs.

“In the early stages of the Political Division’s history, Otto von Bismarck (Chancellor from 1871 to 1890) handpicked the its counselors, and they were the only ones who had the privilege of direct access to him.78 Therefore, service in the Political Division placed a special luster on a diplomat when he went into the field, as he had firsthand acquaintance with the highest officials at the Foreign Office. (…) In the mid1880s, Richard Krauel also secured valuable connections and skills in Division I before being appointed as an envoy to Argentina (1890-1894) and later Brazil (1894-1898).” YOKELL
“In southern Brazil in 1895, the German ambassador, Krauel, who was the first German diplomat to visit the German settlements in the south, sent enthusiastic reports to Berlin, commenting on how well the settlers were treated and how exciting the trade prospects were. Nonetheless, as he saw it, trade was somewhat lacking as the flow of German emigrants to Brazil was falling. “The German colonies in southern Brazil are a rich treasure that has been overlooked until now,” he wrote to his superiors.356 Karl Kaerger, a German agricultural expert travelling with him, shared this opinion. He, in concert with Krauel, suggested that promoting emigration to South America would bolster economic penetration.357” YOKELL

Friedrich Richard Krauel

O primeiro Embaixador alemão que visitou as colônias alemãs no Sul do Brasil.

Em todas as fontes históricas locais, regionais, estaduais e nacionais, não encontramos o nome do diplomata alemão completo, que foi emprestado a um rio no Alto Vale do Itajaí. Também visitou vários locais da Colônia Blumenau com autoridades e pessoas das sociedades regionais.

Despertou a curiosidade de, ao ponto de Vilson Barth de Presidente Getúlio que reside no Vale do Rio Krauel, desejar conhecer esta personalidade ilustre do final do século XIX e início do XX e nos perguntar sobre.
No entanto, ninguém mencionava seu nome completo. Tivemos alguma dificuldade em encontrar esta informação. Nesta pesquisa, não somente informamos seu nome, como também, uma pequena biografia sua.
Encontramos seu nome em uma tese de Doutorado desenvolvida nos Estados Unidos – Texas e depois de obtida esta informação, foi fácil encontrar as demais.

Friedrich Richard Krauel nasceu em 12 de janeiro de 1848 em Lübeck e partiu em 2 de dezembro de 1918 em Freiburg im Breisgau com a idade de 70 anos. Seus pais foram Hans Friedrich Krauel e Emilie Louse Charlotte Du Roi. Exerceu – durante sua vida – o papel de diplomata e historiador alemão. Seu pai foi um juiz. Frequentou a escola Katharineum em Lübeck até terminar o ensino médio em 1867. Depois cursou direito. Na faculdade, tornou-se membro da fraternidade Alemannia Bonn – 1868.

Terminou seu doutorado em 1871 e estabeleceu-se como advogado em Lübeck. Em 1873 ingressou no serviço estrangeiro – iniciando seu trabalho como Cônsul em Amoy, na China. Em 1879 tornou-se cônsul geral em Sydney, Austrália – período da foto da capa desta postagem. Em 1884 mudou-se para o Ministério das Relações Exteriores em Berlim com o posto de conferencista. Com Paul Kayser, Krauel desempenhou um papel fundamental na legislação colonial do Reich alemão. Em 1º de junho de 1890, Krauel chefiou o departamento de política colonial do Ministério das Relações Exteriores com o posto de conselheiro da legação secreta, que mais tarde se tornou o Reichskolonialamt. Em 1890, tornou-se embaixador alemão em Buenos Aires.

De 1894 a 1898 foi embaixador no Rio de Janeiro de 1894 a 1898, quando entrou em contato com o Sul do Brasil e a região do Vale do Itajaí. Nessa época contava com 49 anos. Em 1901 foi nomeado para o Conselho Privado Real Imperial. A partir de 1904 foi professor honorário da Universidade de Berlim. Também trabalhou como publicitário.
Em 1900, publicou o livro o livreto de 30 páginas “Interesses alemães no Brasil” – sua palestra proferida em 9 de janeiro de 1900 em Hamburg, na Sociedade Colonial Alemã. Também publicou livros relacionados com seu trabalho, também em outros lugares do mundo.
Principais publicações de Krauel:

  • “One Belt. One Road” Fallbeispiele in der europäischen Union und neuartige Fernhandelsmöglichkeiten – 2019
  • Prinz Heinrich von Preussen als Politiker – 1902
  • Deutsche Interessen in Brasilien: Vortrag Gehalten Am 9. Jan. 1900 in der Abth. Hamburg der Deutschen Kolonial-Gesellschaft – 1900
  • Graf Hertzberg als Minister Friedrich Wilhelms II. – 1899
  • Prinz Heinrich von Preussen in Paris während der Jahre 1784 und 1788 bis 1789: nach ungedruckten archivalischen Quellen – 1901
  • Die Nord-Ost-Passage im Kontext der Belt-and-Road Initiative. Erwartungen von Logistikunternehmen – 2019
  • Die Bekenntnisse des jungen Bismarck: Rede gehalten in der Aula der Realschule zu Freiburg i. B. am 10. Februar 1901 – 1901

Encontramos um artigo que descreve a passagem de Friedrich Richard Krauel na região com muitos detalhes e nomes, de autoria de Frederico Kilian, publicado na revista Blumenau em Cadernos. Ilustramos o artigo de Herr Kilian, transcrevendo-o em partes. Interessante que Krauel chegou um dia adiantado em Blumenau, prejudicando um pouco os preparativos para recepcioná-lo. Isso foi possível, porque o Cônsul alemão em Florianópolis, Carl Hoepcke, cedeu uma embarcação de sua frota, para o translado da autoridade.

A visita do Embaixador da Alemanha à Colônia de Blumenau.
                  Por Frederico Kilian

“No n° 22 de 29 de maio de 1897 e edições seguintes, encontramos um extenso relato sobre a visita do Embaixador da Alemanha, Dr. Krauel, à cidade e zona colonial de Blumenau, que em resumo passamos a consignar em “Blumenau em Cadernos”.
Relata o jornal que no dia 19 de maio do referido ano, veio a Blumenau o Embaixador Dr. Krauel, cuja chegada era esperada somente para o dia 20, conforme programa organizado pela comissão de recepção; porém a firma Hoepke pôs à disposição do embaixador o vapor “Max” e assim antecipou-se sua viagem de Florianópolis a Itajaí, para onde se dirigiram ao seu encontro o cônsul alemão, Sr. Gustav Salinger e mais algumas pessoas. Avisados aqui da antecipação de sua chegada, reuniram-se à hora prevista, no cais do porto algumas sociedades de tiro, uma sociedade de cantores e a sociedade de ginástica; igualmente os alunos das escolas locais e seus professores compareceram ao local do desembarque, o qual se deu pelas 4 horas da tarde. O embaixador e sua comitiva foram recebidos pela Comissão de recepção, chefiada pelo Pastor Faulhaber e saudado com vivas e palmas dos presentes. Em breves palavras o Sr. Probst cumprimentou o Embaixador em nome das sociedades presentes, justificando a ausência das demais, do interior, dada a antecipação havida de sua chegada.”

Porto fluvial do Stadtplatz Blumenau, em dia de festa. Porta de chegada da Colônia Blumenau para aqueles que chegavam do Porto de Itajaí.
Hercílio Pedro da Luz – governador de Santa Catarina na época de recém instaurada República.

“Formado o préstito, dirigiu-se o Embaixador Dr. Krauel, em companhia do cônsul Alemão em Florianópolis, Sr. Carl Hoepcke, mais a comissão de recepção e populares até a residência do cônsul Sr. Gustavo Salinger onde o aguardava o Governador do Estado, Dr. Hercílio Pedro da Luz, que aqui cumprimentou, oficialmente, o ilustre visitante.
Após o desfile das sociedades, o Embaixador Dr. Krauel falou da sacada do prédio, agradecendo a recepção festiva que lhe fora feita neste dia ensolarado que mostrava a natureza em toda a sua beleza, resplandecente nos rostos alegres e confiantes dos presentes, desejando que ‘aos milhares de alemães que para cá vieram e foram acolhidos por uma pátria generosa e dadivosa, venham se unir mais muitos outros milhares, que resolvem emigrar, Por força de circunstâncias várias e aqui sigam o exemplo dos atuais pioneiros, enriquecendo com o seu trabalho e sua cultura este país, tornando-se, mesmo na conservação de suas tradições, como força moral de seu caráter e valor cívico, cidadãos úteis e leais à esta terra que escolheram para sua nova pátria e berço natal de seus filhos'”.

Blumenau, 1900 – Rua Alwin Schrader. Residência e Consulado Alemão – Cônsul – Gustav Salinger.

“Após a Sociedade de Cantores de Itoupava ter cantado o hino alemão e a banda de música ter executado o hino brasileiro, ambos ouvidos com respeito, desfez-se o préstito.
As 7 horas da noite realizou-se um banquete no Teatro Frohsinn, oferecido pela população, em homenagem ao Embaixador Dr. Krauel, ao Governador Dr. Hercílio Luz e seus auxiliares.
Agradecendo a honrosa presença do Governador do Estado e a visita do Embaixador alemão, em seu discurso de cumprimentos a estas personalidades, o cônsul alemão, Sr. Gustavo Salinger encerrou suas palavras com um brinde à casa dos Hohenzoller e ao Imperador Wilhelm II. A seguir falou o Pastor Faulhaber em nome dos blumenauenses, apresentando os cumprimentos ao Embaixador alemão, terminando com um “viva” a este, no que foi correspondido pelos presentes. Agradecendo a estas palavras, o Embaixador cumprimentou os presentes dizendo que já algumas vezes esteve em Itajaí, porém, por falta de tempo não visitara Blumenau, já que ali estivera sempre só de passagem, mas que agora, cumprindo uma ordem expressa do Imperador Alemão, viera a esta cidade para uma visita mais demorada e inclusive conhecer de perto a situação dos colonos no interior da colônia. Disse ter esperança que a imigração em breve tenha novo alento, pois pelas primeiras impressões aqui colhidas, esta terra promete dar aos imigrantes condições propícias para o seu desenvolvimento econômico e bem estar pessoal, finalizando com um brinde ao colono alemão e em especial a Blumenau.”

A Sociedade Teatral criada no ano seguinte ao da fundação da Sociedade de Atiradores (1860) sob a denominação de “Sociedade Teatral de Blumenau”, teve seu batismo oficial em 1885, passando a chamar-se “Theater-Verein Frohsinn” (Sociedade Teatral “Alegria”). Anos depois, adquiriu um terreno na rua das Palmeiras para a construção de uma sede própria, inaugurada em abril de 1896, um ano antes da visita do Embaixador alemão a Blumenau e região. Lembramos que já existia o palco para teatro na Casa São José junto a igreja católica, quase sempre não é lembrada.

“A seguir o Sr. Felippe Doerck, cumprimentando o Governador Hercílio Luz, enalteceu sua figura como Governador do Estado e grande amigo de Blumenau e do imigrante alemão, brindando-o na segurança da continuação destas boas relações entre os brasileiros das diversas origens que aqui trabalham e especialmente entre os governos do Brasil e da Alemanha. Em resposta, o Dr. Hercílio Luz exaltou os méritos do imigrante alemão, levantando sua taça num brinde à Alemanha, a pátria do Embaixador Dr. Krauel. – O cônsul Carl Hoepcke lembrou os méritos e sacrifícios do Dr. Blumenau, que foi o fundador desta colônia, que hoje já se destacava como modelo comunitário no cenário do país. O Sr. Scheeffer levantou um brinde à nação brasileira e o Sr. Luiz Abry proferiu o brinde de honra ao Presidente da República, Prudente de Moraes. Após o banquete o Embaixador, acompanhado pelo Governador, postou-se no alto da escadaria da Prefeitura Municipal para assistir ao desfile e marcha “aux flambeaux” da sociedade de ginástica e aos fogos de artifício.”

Krauel assistiu o desfile da sacada localizada na Mansarda.

“No dia seguinte, 5a. feira, dia 20 de maio, o Dr. Krauel visitou a Neuschule e depois o Colégio Santo Antônio. Pelo meio dia, o Embaixador e o Governador Dr. Hercílio Luz, acompanhados de várias personalidades, dirigiram-se, em carros de mola, ao interior da colônia, notando-se em muitos lugares arcos de triunfos e filas de palmitos enfeitados com ramalhetes de flores, postados de ambos os lados da estrada.”

Meio de transporte usado pela comitiva – semelhante a este.

“Em Indaial, os visitantes foram recebidos sob o espoucar de foguetes por populares e autoridades locais. No Salão Lüders, um coro masculino cantou algumas canções e o Embaixador teve oportunidade de falar com velhos colonos, inteirando-se dos seus problemas, ouvindo nessa ocasião muitos relatos tristes, mas também dos êxitos alcançados após árduas lutas e incessante trabalho. Após tomar ligeiro refresco e petiscos e ter o Sr. Feddersen falado em nome da sociedade de cantores, todos prosseguiram viagem até Warnow, onde houve recepção com foguetes e vivas da população e cumprimentos no estabelecimento do Sr. Hoeschl, em cuja frente achavam-se postadas a sociedade de atiradores e a de cantores e ainda os alunos da escola local, cujas canções demonstraram ao ilustre visitante que além do trabalho na roça e pequenas oficinas, o colono e seus filhos dedicavam-se ainda à conservação das canções populares. Após curta demora prosseguiu-se na excursão, cuja meta nesse dia era a localidade do Neisse, porém uma forte trovoada interrompeu a viagem e tiveram que pousar antes, parte em casa do senhor Schulze e outra parte na morada do senhor Replin, aí pernoitando.”

Ribeirão Neisse – Apiúna. Na época – Colônia Blumenau.

“Sexta-feira, 21 de maio, já cedo prosseguiram na excursão, alcançando o Neisse na parte da manhã, onde, na filial do Sr. Feddersen, lhes foi servido um lanche e depois de curta demora reiniciada a viagem que daqui em diante tornou-se mais difícil e interessante, pois daqui é que partir a nova estrada para o interior da colônia ao longo do Rio Itajaí. Já que esta parte do caminho estava para ser concluída aproveitou-se a oportunidade para mostrar ao Governador Dr. Hercílio Luz o andamento das obras. Ao mesmo tempo, queria-se mostrar ao Embaixador, Dr. Krauel, a zona designada à Companhia Hanseática de Colonização, para colonizar esta região, dando ao Embaixador oportunidade para se inteirar pessoalmente das condições e perspectivas deste empreendimento e assim poder dar a sua opinião a respeito, quando interpelado pelos respectivos órgãos de seu país.

Morro Pelado – Neisse.

Após transposto o Ribeirão Neisse, apenas ainda algumas colônias se achavam ocupadas por imigrantes, havendo ainda alguns moradores brasileiros ali espalhados. O novo caminho corta uma zona ainda não cultivada, que serve de refúgio dos bugres que daqui já efetuaram vários assaltos aos moradores mais avançados. Com a abertura da nova estrada, o perigo irá desaparecer, pois, com o maior movimento, os bugres certamente se recolherão mais para o alto da serra. Aqui o Vale do Itajaí se estreita bastante íngremes paredões de pedra chegam perto das margens do rio. Um morro, sem vegetação, denominado “Morro Pelado” forma uma península banhada em três lados pelo Rio Itajaí.”

Após ter deixado para trás este morro, os visitantes chegaram ao rancho do Sr. Gottlieb (Nome corrigido do original – não estava correto) Reif, empreiteiro deste primeiro segmento da nova estrada. O Sr. Reif, avisado que foi da visita que ia receber, havia providenciado algo de comer a oferecer aos visitantes, porém foi surpreendido com a chegada destes, quando ainda estava no preparativo do frugal comestível. Os ilustres hóspedes tiveram assim oportunidade de conhecer também a vida alimentar que levam os imigrantes e trabalhadores do mato. Para o Governador Dr. Hercílio Luz, esta situação não era novidade, pois tendo exercido por muitos anos o cargo de Comissário de Terras em Blumenau e presidido os trabalhos de medição de terras, já tivera oportunidade de tomar parte em refeições nessas circunstâncias. A bem da verdade deve-se dizer, entretanto, que a refeição preparada e oferecida pelo senhor Reif, nada deixou a desejar quanto à sua quantidade, qualidade e sabor. Às 11 horas, teve prosseguimento a ·excursão para inspecionar a parte mais importante da estrada. O rio forma uma curva transversalmente ao seu rumo principal, num trecho de 2 quilômetros.

Deixando os carros, todos tiveram que vencer esta distância a pé; aqui os operários ainda estavam trabalhando com explosivos, para arrebentar as pedras e abrir uma passagem para a nova estrada e para a construção de muros de arrimo. Um trecho do paredão já estava minado e pronto para a explosão, efetuando-se esta à vista dos visitantes que assim puderam avaliar as dificuldades na construção da estrada. No fim deste pequeno trecho desemboca o rio Subida e como ainda não existisse uma ponte, somente duas carroças atravessaram o rio, para conduzir os visitantes, para os quais a marcha a pé seria muito penosa. A maioria, porém, preferiu seguir a pé. No morro da Subida, que se lhes apresentava adiante, já se via em duas voltas a estrada que se elevava a uma altura de 300 metros acima do nível do rio.

Esta parte da estrada também já estava pronta, com um ângulo ascendente de cerca 6%, proporcionando uma fácil ascensão, mesmo para veículos de pesada carga. Foram construídos vários muros de arrimo e feitos cortes de passagens. Já vencido pelos andantes um bom trecho desta estrada, eis que de repente há um incidente imprevisto. Um tropeiro aparece e anuncia a chegada de uma tropa de bois bravos, aconselhando aos pedestres a procurarem um lugar seguro, afastado da estrada, o que não era tão fácil assim, entre aquelas encostas, muros de arrimo e abismos. Subindo uma parte desbarrancada, todos conseguiram contornar o perigo, aceitando o Embaixador, com muito humorismo esta cômica situação. Como a passagem da tropa não queria ter fim, o deputado, Sr. Luiz Abry, que estava a cavalo, assumiu por curto tempo a função de tropeiro e auxiliou os peões a acelerar a marcha da manada. Vencido este obstáculo, todos continuaram a marcha, num trecho de cerca 5 quilômetros, chegando então ao ponto culminante, de onde uma magnífica paisagem se abre às vistas, premiando em seu esplendor todo o cansaço da fatigante caminhada. Daqui, com o céu límpido daquele dia, os visitantes avistaram o marco inconfundível dos marujos, o ‘Morro Baú’, como também o “Morro Cachorro” a leste e, para o norte, e oeste as vastas zonas dos vales dos rios Itajaí do Sul e do Norte, a ‘terra incógnita’ que a Companhia Hanseática pretende colonizar com imigrantes alemães. Do cimo do morro, o trecho da estrada é da responsabilidade do empreiteiro Frederico von Ockel e foi percorrido numa extensão de cerca 2 quilômetros, porém não foi possível atender ao convite do Sr. von Ockel para ir até ao rancho deste, onde ele havia preparado uma ligeira merenda, já que o tempo era muito curto e os visitantes ainda pretendiam alcançar, em sua volta, os alojamentos encomendados. Retornando, foi feita uma breve parada na ‘Boa Vista’, onde foi servida um refresco e apreciado novamente o belo panorama.”

“O Governador Dr. Hercílio Luz e sua comitiva da capital, acompanharam com grande interesse os trabalhos da construção da estrada e elogiaram-na muito, mormente quando o Governador lhes informou que as despesas não chegam nem à metade da quantia por eles estimada. Durante a excursão, o Governador teve um diálogo com o engenheiro Odebrecht, no final do qual este foi encarregado pelo Governador em prosseguir nos estudos para a continuação das obras da estrada até ao planalto, já que esta estrada era uma necessidade imprescindível para o desenvolvimento e progresso do Estado.
A construção da estrada não oferece maiores dificuldades do que as já vencidas até agora, conforme declaração dos senhores Odebrecht e Krohberger que já atravessaram a região por diversas vezes.
Em menor tempo foi realizada a descida até ao ponto onde os carros estavam à espera. Tomados estes e encetado o regresso, chegaram, já antes do cair da noite, ao ribeirão do Neisse, onde na filial do Sr. Feddersen, foi servido um lauto jantar aos excursionistas, reinando grande satisfação e alegria entre os presentes por tudo que puderam ver neste dia. Principalmente o Embaixador Dr. Krauel e o Cônsul Sr. Carl Hoepcke manifestaram-se entusiasmados com o que viram, achando que valia a pena morar nesta região propiciosa.
Na manhã seguinte, sábado dia 22 de maio, todos, ocupando os carros, regressaram a Blumenau, fazendo parada em Warnow, onde o Sr. Hoeschl mandou servir um farto almoço, preparado à moda da colônia, que agradou a todos, dado à variedade dos pratos servidos. Na localidade do Warnow o embaixador e demais excursionistas assistiram ainda a uma demonstração de ginástica dos alunos da escola local e disputa de um prêmio em dinheiro que foi instituído pelo Embaixador, que ainda tomou contato com moradores, para saber de suas situações e modo de vida, a fim de ter uma noção exata das condições em que se acham os colonos.”

Residência e comércio do 1° Cônsul do Império Austro-Húngaro na Colônia Blumenau – Leopold Franz Hoeschl – em Warnow – Indaial SC.

“Em Indaial o grupo se dividiu, pois o Embaixador, em companhia do Cônsul Sr. Carl Hoepcke e destacados membros da colônia, atravessaram, de balsa, o rio Itajaí para visitar Timbó, enquanto que os demais acompanharam o Governador Dr. Hercílio Luz e sua comitiva até Blumenau.
Em Timbó aguardavam o Embaixador, a sociedade de atiradores, em formatura e a Sociedade de cantores em frente à casa do Sr. Frederico Donner, em cujo salão a Sociedade de Cantores apresentou várias canções alemãs. Ao convite para um jantar o Embaixador teve que declinar, pois a exiguidade do tempo forçava ao regresso, que foi feito pela outra margem do Rio Benedito até Indaial. Numa parada para troca de cavalos na volta, o Embaixador ainda teve oportunidade de participar, por curto tempo, de uma festa de casamento de colonos, alcançando os visitantes Blumenau ao cair da noite, após três dias de excursão pelo interior da colônia.”

“No dia seguinte, domingo, dia 23 de maio, o Embaixador assistiu ao culto na Igreja Evangélica, externando louvores ao coro misto da comunidade que abrilhantou o ato religioso.”

“À tarde houve uma festa popular nas dependências da Sociedade de Atiradores, com apresentação de números de ginástica rítmica e em aparelhos, pelos ginastas da sociedade de ginástica e alunos da Neuschule. A noite houve uma apresentação teatral no Teatro Frohsinn com a peça “Madame Flott” e exibição de números de magia pelo Sr. Pamplona, de Florianópolis, e ainda apresentações de números de cantores pelos coros masculinos e o coro misto das sociedades de cantos locais, cujos repertórios foram muito aplaudidos e mereceram elogiosas referências por parte do Embaixador. Após estas apresentações realizou-se ainda um animado baile que durou até altas horas da madrugada. Na segunda-feira, 24 de maio, o Embaixador fez uma excursão ao Rio do Testo e Pomerode.”

“Não obstante ter externado este desejo somente domingo à noite, sua chegada àquela localidade foi aguardada pelas sociedades de atiradores ali existentes, que estavam formadas festivamente em frente à residência do Sr. Luiz Abry. Na entrada da localidade e no centro desta havia arcos de triunfo e a rua achava-se ornamentada com palmitos e bouquês de flores. No Salão do edifício, o Embaixador foi cumprimentado pelo deputado estadual Sr. Luiz Abry e atendeu, por mais de 4 horas a todos que o queriam cumprimentar, mantendo com eles animado diálogo e ouvindo os seus pedidos e desejos, pois os colonos, nas suas simplicidades, achavam que o Embaixador poderia solucionar todos os seus problemas ou satisfazer os seus desejos.

À noite, o Embaixador regressou a Blumenau e no dia seguinte, terça-feira, deixou Blumenau e dirigiu-se a Brusque onde foi festivamente recepcionado à entrada da cidade pelas autoridades locais e sociedade de atiradores e, sob os acordes da banda de música conduzido até ao Hotel Bauer. À tarde visitou a fábrica Renaux, escola e a igreja e no dia seguinte fez uma excursão ao interior da colônia, seguindo à tarde para Itajaí de onde regressou ao Rio de Janeiro, tendo antes ainda enviado um ofício ao Cônsul, Sr. Salinger exprimindo os seus agradecimentos às autoridades e população blumenauense, pela cordial acolhida e cavalheiresco tratamento que aqui teve, reafirmando as ótimas impressões que levava de Blumenau e sua gente.

O Governador Dr. Hercílio Luz, por sua vez, viajou na segunda feira, dia 24 de maio, para Massaranduba, para inspecionar as obras da construção da estrada que liga Blumenau a Joinville, passando por Massaranduba e Bananal (hoje Guaramirim), da qual se achava já pronto um trecho de 27 quilômetros a contar do lote N°. 58, faltando apenas mais 7 quilômetros para alcançar a ligação para Joinville.

A viagem de Blumenau a Massaranduba o Governador fez de carro de mola, em apenas duas horas e meia o que demonstra o excelente estado desta estrada. O último segmento faltante de 7 quilômetros da estrada foi logo dado em empreitada, com prazo de 5 meses para a sua conclusão. Quarta-feira, dia 26 de maio, na parte da manhã, o Governador visitou ainda as escolas em Blumenau, embarcando pelo meio dia no vapor “Blumenau” com sua comitiva, rumo a Itajaí, de onde regressou à capital do Estado.”

Mapa alterado e completado com informações (como usamos atualmente) pelo engenheiro alemão Dr. Phil Wettstein contratado pela Colonizadora Hanseática. Trabalhava na região, mais ou menos neste período. Ele usou como base, o mapa feito pelo engenheiro José Deeke em 1905, com as informações acrescidas. Aliás, vimos este mapa publicado no livro Colônia Blumenau no Sul do Brasil sem esta informação. Muita coisa. Fica aqui, portanto, o esclarecimento. No link, no final da postagem, você poderá ver todo o trabalho de Wettstein.

Mapa completo – e com legenda.

Poderíamos fazer muitos comentários, a partir do artigo de Frederico Kilian, o qual ilustramos, que enriqueceria postagens anteriores da história regional, mas poderia esta, ficar uma postagem muito grande, sendo que durante a pesquisa, esta já foi transformada em duas. Foi bom que durante esta pesquisa resgatamos o nome inteiro do diplomata alemão, Friedrich Richard Krauel  citado em teses americanas e alemãs e autor de diversas publicações acadêmicas, sendo que fez parte do corpo docente da Universidade de Berlin, mas desconhecido em publicações locais. 

E para terminar, concluímos que depois de sua visita na região – através dos bancos e empresas alemãs – foram disponibilizados recursos para a construção da única ferrovia, em solo brasileiro, construída com a tecnologia e capital alemães. As demais foram construídas com tecnologia e capital ingleses. Indiretamente este investimento na ferrovia, Estrada de Ferro Santa Catarina – EFSC, desenvolveu toda a região visitada por Friedrich Richard Krauel, comprovando a boa impressão que lhe causou. Faltava este nome na história ferroviária regional – o padrinho: embaixador alemão que visitou a região e foi muito bem recepcionado em 1897 e isto rendeu posteriores investimentos alemães na região.

Referências

  • JÚNIOR, Peter Pauls. Urwaldpioniere: persoenliche erlebnisse mennonitischer siedler aus den ersten jahren am krauel und von stolzplateau, S. C. Witmarsum: Herausgegeben im Auftrag der Festkommission der Jubilaeumsfeier, 1980.
  • IPatrimônia. Síntese da Imigração em Santa Catarina. Santa Catarina Século XIX Disponível: http://www.ipatrimonio.org/wp-content/uploads/2019/03/dossi%C3%AA-imigra%C3%A7%C3%A3o-SC_volume-1-parte-3.pdf . Acesso: 03/06/2022 – 1:45h.YOKELL, Marshall A.
  • Alemanha e América Latina – desenvolvimento de Infraestrutura e Política Externa 1871-1914. Universidade A&M do Texas. Direitos autorais 2018 Marshall Allison Yokell, IV. Disponível em: https://oaktrust.library.tamu.edu/bitstream/handle/1969.1/174596/YOKELLIV-DISSERTATION-2018.pdf?sequence=1&isAllowed=n. Acesso em: 03/06/2022 – Acesso em 2:26hWinter, Heidelberg 1999, ISBN 3-8253-0865-0, pp. 161-162.
  • GERLACH, Gilberto. Colônia Blumenau no Sul do Brasil. Gilberto Schmidt-Gerlach, Bruno Kilian Kadletz, Marcondes Marchetti, pesquisa; Gilberto Schmidt-Gerlach, organização; tradução Pedro Jungmann. – São José: Clube de Cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 2 t. (400 p.) : il., retrs.
  • SILVA, José Ferreira da. História de Blumenau. 2.ed. – Blumenau: Fundação “Casa Dr. Blumenau”, 1988. – 299 p.
  • WETTSTEIN, Phil. Brasilien und die Deutsch-brasilieniche Kolonie Blumenau. Leipzig, Verlag von Friedrich Engelmann, 1907.

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