Para a 20° artigo do Registro para a História apresentamos, através da evolução da arquitetura de Blumenau, uma igreja que marcou a comunidade de Altona nas primeiras décadas do século XX e também, a história de uma das maiores firmas de Blumenau e que ainda está em operação – a Electro Aço Altona.
Pessoas das gerações do final do século XX e do início do século XXI não conhecem e não conheceram e, talvez, nunca ouviram falar da Igreja da Cruz de Altona, construída dentro do parque fabril da Electro Aço Altona.
“De um ponto elevado, as habitações de Altona, rodeadas de árvores frutíferas e de sombra, emolduradas por cadeias de colinas, oferecem uma imagem aconchegante, cujo encanto seria aumentado pela elegante torre de uma igreja.
A proximidade com Blumenau e o pertencimento à associação da igreja evangélica impediu a construção de uma igreja própria, e provavelmente continuará assim, pois hoje em dia, devido a ligação com Blumenau, a ida dos protestantes e dos católicos às igrejas de lá é muito mais fácil.” Professor Max Humpl – em 1918.
Altona, atual Itoupava Seca foi uma comunidade independente e autossuficiente de maneira sustentável, uma centralidade provida de escola, porto, estação ferroviária, igreja, indústrias e comércio, e muitas famílias protagonistas cuja história pode ser conferida no livro organizado pelo casal Kramer de autoria do Professor alemão Max Humpl, escrito em 1918.
Humpl foi professor da escola Alemã – atual Escola Municipal Machado de Assis. Aparentemente, de tão independente que foi, posicionava-se como um outro núcleo, povoação, sem qualquer ligação com a centralidade da Colônia Blumenau. Para ser leal a sua história, competia com esta centralidade com igualdade e importância.
O pesquisador e erudito, Pastor Hugo Westphal – comentou conosco, um tempo atrás, que os imigrantes assentados na povoação Altona, também não eram da mesma região daqueles que se fixavam na sede da Colônia Blumenau, o que gerava uma certa competição e intrigas, compreensível através da ótica de uma região fracionadas – formada por ducados que disputavam várias questões entre si e que, no período histórico da chegada dos primeiros pioneiros à região, ainda não existia a nação da Alemanha.
Mesmo tão próximos, o próprio professor Humpl apontava a necessidade de uma igreja na povoação de Altona, como era denominada no início do século XX. A comunidade foi fundada em 1866 e os imigrantes, em sua grande maioria, eram originários da região próxima a Hamburg, norte da atual Alemanha (Formada nação em 1871). Altona, no dialeto hamburguês “All-zu-nah”, nome de um bairro perto de Hamburg, na Alemanha. E também assim era chamada Altona da Colônia Blumenau nas primeiras décadas de sua existência – no dialeto hamburguês: “All-zu-nah”.
Posteriormente a região de Altona passou a ser chamada de Itoupava Seca.
No início da povoação – século XIX e início do século XX, haviam duas pequenas fundições. Uma de propriedade de Louis Altenburg Jr. e sócio Gotthilf Grall e outra, fundição de propriedade de Karl Ernst Auerbach. A fundição de Auerbach, que fabricava pequenas máquinas, em 1923 se associou a oficina elétrica do Engenheiro Richard Paul Werner e após 10 anos, passou a se chamar Electro Aço Altona.
Até então, como mencionou o professor Max Humpl, Altona não tinha uma igreja. Quando chegou o engenheiro alemão Richard Paul Werner e atuando na empresa Auerbach & Werner fundada em 8 de março de 1924 como uma pequena fundição e oficina de reparos mecânicos, os sócios perceberam a ausência da igreja na povoação e não se sentiam muito à vontade em frequentar a igreja luterana do Stadtplatz – Igreja do Espírito Santo.
Ao contrário, a igreja católica recebia católicos de todas as partes da Colônia Blumenau e estes, também frequentavam a Casa São José – local onde, atualmente, está o Castelinho da antiga Moellmann, nas imediações da Catedral São Paulo Apóstolo, localizada na Rua XV de Novembro – contribuindo para o desenvolvimento desta região da cidade no início do século XX e responsável pelo início do processo de esvaziamento da centralidade de Blumenau – Stadtplatz, no mesmo período.
Em Altona, Richard Paul Werner chegou da Alemanha, com 27 anos de idade, para instalar a primeira Companhia Telefônica de Blumenau, em 1923. Werner nasceu em Weinböla, condado da Saxônia, na Alemanha. Em 1924, era sócio da fundição de ferro e que não demorou muito para se tornar uma fábrica de máquinas para serrarias, usinas e moinhos. A fábrica foi instalada junto às residências dos Auerbach e dos Werner, família que sempre morou no local. Heriberto Junkes, nascido nas proximidades da Electro Aço Altona, local do período de sua infância, conta que Herr Auerbach, locomovia-se de bicicleta, como muitos residentes, nos primeiros anos de história de Blumenau, realidade muito comum na Alemanha atual, país de sua origem. Roberto Wittmann, filho de um dos funcionários da Electro Aço Altona – Rodolph Wittmann, descreve detalhadamente o local do bicicletário dos trabalhadores, atualmente ocupado pelo Clube Ipiranga. Junkes também lembra que a comunidade, reportava a Richard Paul Werner, década de 1960, como o “Velho Werner”, também confirmado em uma reportagem da NSC+.
Em 1933, a razão social da firma mudou para Electro Aço Altona, uma vez que este metal passou a ser o único trabalhado na mesma. Richard Paul Werner, tornou-se o maior acionista da firma e contribuiu, também, com as construções das sedes dos clubes Ipiranga e América, a Escola Barão do Rio Branco, o Hospital Santa Catarina e o Hospital Santo Antônio.
Mas não foi somente esta sua contribuição. Werner quebrou os paradigmas e por ser muito religioso, não percebeu a situação e “quebrou” a afirmativa do professor Humpl – de que a povoação de Altona/Itoupava Seca não possuiria uma igreja. Em torno da firma havia muito espaço vazio e neste – voltado para estrada, atualmente conhecida como rua Engenheiro Paul Werner, construiu a igreja de Altona/Itoupava Seca, a primeira igreja luterana em Altona – a qual chamaram de Igreja da Cruz.
As atividades da Comunidade Evangélica de Altona, depois, Itoupava Seca iniciaram com a realização do primeiro culto em alemão, na Escola Alemã, atual Escola Municipal Machado de Assis. Depois, foi efetuada a construção da Igreja da Cruz por iniciativa do engenheiro Richard Paul Werner.
A Igreja da Cruz foi inaugurada em 15 de setembro de 1929. Até esta data, a Comunidade de Altona/Itoupava Seca pertencia e frequentava a Comunidade luterana do Centro, o que causava um certo desconforto à comunidade de Altona, questão compreensível pela ótica da antropologia e da origem na Alemanha, dos pioneiros frequentadores de ambas as comunidades que eram oriundos de diferentes regiões.
Para completar esta história, em dezembro de 1949, a comunidade Evangélica, então de Itoupava Seca, adquiriu a casa dos herdeiros de Peter Christian Feddersen , que não existe mais na paisagem. Na época, o local foi designado para a residência do pastor e de sua família, então Pastor Wilhem Scherer.
No local, também, foi instalado um jardim de infância sob a responsabilidade da Sociedade Evangélica das Senhoras de Itoupava Seca, que também tinha sua sede no mesmo local. Em 1953, chegou para residir, o Pastor Richard Laun e família. Nesta época o Jardim de Infância, mantido pelas Senhoras, recebeu o nome de Jardim de Infância Princesa Isabel.
Em todo este período, a Igreja da Cruz era o templo desta comunidade, que iniciava a construir uma estrutura onde, mais tarde foi construída a nova igreja, durante o ministério do Pastor Laun – um ano após a sua chegada na comunidade. Em outubro de 1954, foi lançada a pedra fundamental da Igreja Martin Luther.
“Frequentei cultos preparatórios para a confirmação nesta Igreja ao lado do Electro Aço Altona, início dos anos 50. O Pastor Wilhem Scherer recém vindo de retorno da Alemanha, onde tinha ficado retido durante a II Guerra Mundial. O retorno do Pastor Scherer foi patrocinado pela Viúva de Adolf Pöttig com recepção em Novo Hamburgo e deslocamento em automóvel OPEL KAPITAN para Blumenau.
EU VI EU ESTAVA LA.” Horst Heinrich Tiedemann.
O projeto da nova igreja foi assinado pelo arquiteto Hans Broos, que substituiu a Igreja da Cruz, cujo edifício foi demolido e muito poucos a conhecem e, ou mesmo, sequer sabem de sua existência. Sua arquitetura era peculiar e de muito gosto, alinhada às linhas do estilo românico, diferentemente das demais igrejas construídas pelos imigrantes e descendentes que construíram, predominantemente, igrejas com linhas góticas, ou neogóticas, estilo preferido na Alemanha e popular nos contos e literatura.
Em 25 de agosto de 2013 registramos a mesma comunidade Luterana Blumenau Itoupava Seca – Igreja Martin Luther comemorando o 30° aniversário de inauguração da igreja nova acabada e 84° anos da implantação da Paróquia de Itoupava Seca (1929).
Neste momento das confraternizações da comunidade, não foi mencionado a história pretérita desta comunidade. Se assim o fosse, saberíamos sobre a existência da Igreja da Cruz construída junto ao parque fabril da Electro Aço Altona, inaugurada em 15 de setembro de 1929 pelo engenheiro Richard Paul Werner, sendo que, em 1918, o Professor Max Humpl, professor da Escola Alemã – atual Escola Municipal Machado de Assis, registrou em seu livro que a comunidade luterana Altona não tinha e provavelmente, não teria uma igreja.
Arquitetura da Igreja da Cruz
Arquitetura da Igreja da Cruz destoa de todas as igrejas construídas por imigrantes alemães e da tradicional igreja alemã, que geralmente apresenta características do neogótico, de certa maneira uma arquitetura nacional do povo alemão, juntamente com o gótico, pois jamais aceitou muito bem as correntes “internacionais”. Seus idealizadores buscaram um estilo anterior que também era construído na idade média, mas não especificamente o gótico ou neogótico.
A Igreja da Cruz, igreja construída por Richard Paul Werner, caracteriza-se pela presença do volume robusto marcado por duas torres de planta quadrada, baixas construídas com pedras, destacando a simetria presente na fachada, centralizada por uma porta acabada por um arco pleno – românico. O telhado é formado pelo característico jogo de duas panos com a inclinação acentuada do imigrante – geralmente superior a 80%.
O conjunto é muito bem-acabado, com aspectos de uma arquitetura de gosto e alto grau artístico. Sem dúvida alguma – um espetáculo aos olhos de comunidade do século XXI, se a edificação religiosa de Altona ainda estivesse na paisagem, como muitas outras tipologias que estão sendo retiradas paulatinamente da povoação de Altona, até o tempo presente, que foi transformado em um corredor de fluxo rápido de trânsito de passagem, dentro a cidade de Blumenau.
Quanto a Igreja da Cruz, ousamos afirmar que possui características da arquitetura românica. Esta arquitetura pode ser definida com características do início do período medieval, dotada de elementos da arquitetura românica – com objetivo de resistir a ataques de povos inimigos e de tribos diferentes. Logo, tanto sua estética, como sua estrutura, reflete força e robustez, inspirada na arquitetura do Império Romano, último período e início do período medieval. Esse gênero não apresenta uma data certa de seu início. Para alguns estudiosos, os seus primeiros indícios datam do século VI. Para a maioria, teve início no século X, na Europa, na região da Normandia. Também foi construída na Alemanha. Muitos castelos medievais apresentam características da arquitetura românica, mas é usado com maior efusão nas igrejas.
O estilo antecedeu o gótico que surgiu por volta de 1100 e caracteriza-se, principalmente pela austeridade e robustez da construção, geralmente com paredes grossas e minúsculas janelas.
As principais características da arquitetura românica, visíveis na Igreja da Cruz:
- a pedra;
- torres quadradas, com a central sendo a mais alta;
- pilares e arcos ornamentados e detalhados;
- harmonia e simetria das formas;
- construções que combinavam funcionalidade com luxo;
- paredes sólidas e resistentes;
- portas estreitas e janelas pequenas;
- interior escuro e luxuoso.
Acervo da Igreja da Cruz – Lembranças históricas
Imagens atuais do local onde estava localizada a Igreja da Cruz
“A Igreja da Cruz da comunidade Altona/Itoupava Seca era maravilhosa e de uma qualidade arquitetônica ímpar.” Arquiteta e Mestre em Urbanismo, história e Arquitetura da Cidade – Angelina Wittmann
Um comentário: Por que se fala tão pouco dos feitos do Engenheiro Richard Paul Werner, na História de Blumenau? Esta personalidade histórica, entre outras coisas, ajudou a construir o Hospital Santa Catarina, Hospital Santo Antônio, Escola Barão do Rio Branco, o Ipiranga e era frequentador assíduo das reuniões sociais de Altona/Itoupava Seca.
Pessoas da Comunidade que frequentaram a Igreja da Cruz
Casamentos
Confirmações
Culto Infantil
Confirmação
Curiosidade
Um Registro para a História.
Referências
- BAUMGARTEN, Christina. A engenharia do sonho: registro histórico dos oitenta anos da Electro Aço Altona S.A. Blumenau: HB Editora, [2003] – 175 p. :il.
- BRANDE. Altona: rumo aos 100 anos com muito orgulho! A empresa está comemorando 95 anos como uma das mais conhecidas globalmente no seu segmento. NSC +.08/03/2019 – 13h24 – Atualizada em: 11/03/2019 – 16h52. Disponível em:https://www.nsctotal.com.br/noticias/altona-rumo-aos-100-anos-com-muito-orgulho. Acesso em: 03 de julho de 2021 – 17:17h.
- Centenário de Blumenau (1850-2 de setembro de 1950). Edição especial – da Comissão de Festejos. Blumenau. 1950.
- GERLACH, Gilberto Schmidt. Colônia Blumenau no Sul do Brasil. Gilberto Schmidt-Gerlach, Bruno Kilian Kadletz, Marcondes Marchetti, pesquisa; Gilberto Schmidt-Gerlach, organização; tradução Pedro Jungmann. – São José: Clube de Cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 2 t. (400 p.): il., retrs.
- HUMPL, Max. Crônica do vilarejo de Itoupava Seca: Altona: desde a origem até a incorporação à área urbana de Blumenau, 1.ed. Méri Frotschter Kramer e Johannes Kramer (organizadores). Escrito em 2018. Blumenau: Edifurb, 2015. 227 p.: il.
- MORETTI, Silvana Maria. Fábrica e Espaço Urbano: A influência da Industrialização na Formação dos Bairros e no Desenvolvimento da Vida Urbana em Blumenau. Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em Geografia, Orientador: Prof. Msc. Luís Fugazzola Pimenta. Florianópolis/SC, janeiro de 2006.
- SILVA, José Ferreira. História de Blumenau. -2. ed. – Blumenau: Fundação “Casa Dr. Blumenau”, 1988. – 299 P.
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- WITTMANN, Angelina. Livro – Centenário de Blumenau (1850-2 de setembro de 1950) e os Personagens da História que foram escolhidos para esta publicação histórica. 23 de janeiro de 2022. Disponível em: https://angelinawittmann.blogspot.com/2022/01/livro-centenario-de-blumenau-1850-2-de.html . Acesso em: 22 de março de 2022 – 13:40h.
- WITTMANN, Angelina. Os ducados – na Alemanha. 28 de junho de 2017. Disponível em: https://angelinawittmann.blogspot.com/2022/01/livro-centenario-de-blumenau-1850-2-de.html . Acesso em: 22 de março de 2022 – 13:40h.
- WITTMANN, Angelina. Peter Christian Feddersen – Revisado em 2017. 9 de abril de 2015. Disponível em: https://angelinawittmann.blogspot.com/2015/04/peter-christian-feddersen-revisada-em.html. Acesso em: 22 de março de 2022 – 15:50h.
Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
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