Conheça a receita do Kochkäse que fez parte da mesa dos pioneiros e é Patrimônio Cultural de Blumenau
O povo Europeu, entre eles as pessoas que residiam nas regiões que formam a Alemanha atual passaram por diversas guerras, recessões econômicas em alguns períodos de sua história – o alimento era escasso e restritivo e a fome era uma realidade dentro de recortes de tempo histórico.
Também a existência das estações do ano bem definidas, com invernos rigorosos fez com as pessoas necessitassem armazenar o alimento, este quase todo produzido nos períodos quentes e estações intermediárias. Estas situações faziam ressaltar a criatividade e as pessoas criavam formas de manter e de reaproveitar o alimento sem desperdiçar nada, pois, faria falta para alimentar a família nos períodos de estações frias.
Uma destas receitas criadas por estas pessoas é exatamente a receita do Kochkäsa, que significa queijo cozido, onde se aproveitava o leite que passava do ponto de consumo em uma receita que criava um acompanhamento para o pão. Esta receita veio com os imigrantes, principalmente prussianos e pomeranos, que somavam maioria entre os imigrantes que vieram para a Colônia Blumenau – Vale do Itajaí nas primeiras décadas de história. O Kochkäse ainda é muito apreciado pelas gerações que vieram depois – filhos dos filhos.
JESS escreveu: “Eram pessoas humildes, servos dos grandes senhores feudais que vieram ao Brasil em busca do seu pedaço de terra. ”. Não procede. Os imigrantes que vieram para a região do Vale do Itajaí no século XIX, viviam em um ambiente sócio econômico, dotado de uma política, muito diferente do período feudal que começou a entrar em decadência ainda no século XIV. A Decadência do feudalismo iniciou quando a Europa se urbanizou e o comércio ganhou importância, portanto, um período histórico anterior de no mínimo cinco séculos ao da migração de alemães para o Sul do Brasil e para Santa Catarina. Mas isso não significa que não faziam seu Kochkäse, desde aquele período.
Observem o processo atual da produção do Kochkäsa, através do envelhecimento provocado, sendo que, na época dos antepassados, repetimos, era usado o leite que não mais seria consumido por estar envelhecido e não apropriado e comestível nesta situação natural.
Seguindo o mesmo objetivo de não desperdiçar o alimento, surgiram outros derivados para o aproveitamento do leite, como: a manteiga, o queijinho e a nata, esta tirada do leite fresco. Esse procedimento também era válido para preservar, armazenar e reaproveitar outros alimentos, como derivados de carne (embutidos – muito apreciado na gastronomia desta cultura) e frutas, que a partir do alimento natural, produziam geleias (Schimier e mussi), compotas (Doces de frutas em calda guardados em vidros fechados a vácuo), sorvetes, sucos, frutas cristalizadas. Também existem vários tipos de pães e biscoitos que tinham grande durabilidade. Portanto, a necessidade e o não desperdício do alimento fez surgir boa parte das iguarias e alimentos processados pertencentes à gastronomia original e cultural da Alemanha.
Os imigrantes adaptaram as receitas de sua terra natal, usando frutas da região da Colônia Blumenau, como também ocorreu com a forma de construir, de vestir, de plantar, de se divertir, de fazer arte, (…).
Receita Kochkäse – Frau Hammann
Apresentamos o processo de elaborar o Kochkäse através de imagens, pois o acompanhamos, observando a atividade na residência de Frau Hamann, localizada no bairro Asilo, em Blumenau, há mais de 50 anos.
Frau Hamann é natural do interior de Massaranduba, da comunidade Rio Bonito, onde passou a infância com seus pais e irmãos em uma casa enxaimel e é descendente do pioneiro da Colônia Blumenau, Gottlieb Reif. Frau Hamann cozinha o queijo branco, fazendo surgir o Kochkäse, há mais de 6 décadas, tal como aprendeu com sua mãe, que aprendeu com sua Oma e assim, desde a origem da família, na região da atual Alemanha.
Para elaborar a receita nos moldes atuais, basta ter meio quilo de queijinho branco, de preferência adquirido diretamente com o produtor, pois aquele apresentado no supermercado é muito “magro” e uma colher de manteiga ou margarina com um pouquinho de sal (à vontade).
As imagens apresentam o processo da receita de Frau Hamann
Depois de frio, pode ser servido com pão caseiro em fatias. Em Blumenau e região, é muito comum encontrar o Kochkäse, entre outras iguarias do cardápio dos imigrantes alemães e descendentes, em seu Abendbrot, quando há encontro de amigos, convidados e de grupos culturais.
No Serrinha – Vila Itoupava – em datas diferentes – A. C. Freundeskreis
O Kochkäse foi tombado como patrimônio imaterial do município de Blumenau em 28 de novembro de 2015, quando foi assinada a Lei N°8192. Detalhes curiosos do texto da Lei.
Art. 1º É tombado, como Patrimônio Cultural Imaterial do Município, o kochkaese.
Parágrafo único. O kochkaese é uma das características culturais da região e, portanto, um patrimônio imaterial – herança cultural do imigrante alemão no Brasil.
Art. 2º É determinada a inscrição do tombamento de que trata esta lei no Livro do Tombo do Patrimônio Cultural Imaterial do Município de Blumenau.
Art. 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 5º O Queijo Kochkäse deverá apresentar os seguintes requisitos sensoriais:
I – consistência: mole;
II – textura: compacta e lisa;
III – cor: amarelada;
IV – sabor: característico, podendo ser levemente ácido e salgado, e/ou de acordo com outras substâncias alimentícias utilizadas em sua elaboração;
V – odor: característico;
VI – formato: variável conforme embalagem utilizada. (Redação acrescida pela Lei nº 8925/2020)
Art. 6º Os requisitos físico-químicos do Queijo Kochkäse são os seguintes:
I – matéria gorda no extrato seco: desnatado, contém menos de 10,0% (dez por cento) de gordura;
II – umidade: não inferior a 55% (cinquenta e cinco por cento). (Redação acrescida pela Lei nº 8925/2020)
Art. 7º As características distintivas do processo de elaboração do Queijo Kochkäse são as seguintes:
I – o leite cru ou pasteurizado desnatado é coagulado naturalmente, aquecido entre 40ºC (quarenta graus Celsius) e 45ºC (quarenta e cinco graus Celsius), coalhado, dessorado em sacos de nylon ou de tecido de uso próprio para alimento, cujas propriedades são exclusivas para essa finalidade, originando uma massa esfarelada para fermentação, adicionada de sal;
II – o tempo de fermentação deverá ser de 2 (dois) a 7 (sete) dias, até que a massa adquira coloração amarelada e os grumos estejam agregados;
III – a massa fermentada é cozida, até completa fusão atingindo a temperatura de 80ºC (oitenta graus Celsius) por no mínimo 1 (um) minuto, adquirindo a aparência de um queijo cremoso e uniforme, seguido de resfriamento;
IV – acondicionamento: embalagens ou envoltórios bromatologicamente aptos;
V – armazenamento: deverá ser conservado a uma temperatura entre 4ºC (quatro graus Celsius) e 8ºC (oito graus Celsius);
VI – transporte: acondicionado em embalagens próprias para transporte de alimentos. (Redação acrescida pela Lei nº 8925/2020)
Art. 8º Os contaminantes orgânicos e inorgânicos não podem estar presentes em quantidades superiores aos limites estabelecidos pela legislação. (Redação acrescida pela Lei nº 8925/2020)
Art. 9º Deverão ser observados os seguintes requisitos relacionados à higiene:
I – as práticas de higiene na elaboração do produto devem estar de acordo com as Boas Práticas Agropecuárias (BPA) e as Boas Práticas de Fabricação (BPF);
II – critérios macroscópicos: o produto não poderá apresentar impurezas ou substâncias estranhas de qualquer natureza; (Redação acrescida pela Lei nº 8925/2020)
Art. 10. Para o Queijo Kochkäse deve ser utilizada a medida de massa expressa em quilogramas ou gramas como parâmetro para peso do produto. (Redação acrescida pela Lei nº 8925/2020)
Art. 11. A rotulagem deve estar de acordo com a legislação de rotulagem de alimentos embalados, apresentando a denominação Queijo Kochkäse ou Kochkäse, devendo ser indicado no rótulo o tipo de tratamento da matéria-prima (leite cru ou leite pasteurizado) e demais ingredientes utilizados.
Em junho de 2020, o Governo do Estado de Santa Catarina, através da Secretaria de Estado da Agricultura, da Pesca e do Desenvolvimento Rural, regulamenta a produção do Queijo Kochkäse no Estado.
A regulamentação foi embasada em pesquisas desenvolvidas pela FURB e a partir do trabalho conjunto da Secretaria da Agricultura, Epagri, Cidasc, e Associação dos Municípios do Médio Vale do Itajaí (Ammvi). O processo de regulamentação teve início em 2016.
Referências
- Balanço Geral. Kochkäse: iguaria pode virar patrimônio cultural.
- Canal Rural. Governo de Santa Catarina regulamenta produção de queijo kochkäse. São Paulo. Publicado em 13/06/2020. Disponível em: https://www.canalrural.com.br/noticias/pecuaria/leite/governo-de-santa-catarina-regulamenta-producao-de-queijo-kochkase/. Acesso em: 02 de agosto de 2022 – 21:12h.
- FURB. Pesquisa – Projeto Queijo Kochkäse. FURB TV.
- JESS, Jeferson. Kochkäse, o queijo patrimônio do Vale Europeu brasileiro. Gastronomia. 31 de maio de 2017. Caixa Colonial, disponível em: https://caixacolonial.club/blog/kochkase-o-queijo-patrimonio-vale-europeu-brasileiro-1020/. Acesso em: 02 de agosto de 2022.
- Leis Municipais Blumenau. LEI Nº 8192, DE 18 DE NOVEMBRO DE 2015. Disponível em: https://leismunicipais.com.br/a/sc/b/blumenau/lei-ordinaria/2015/820/8192/lei-ordinaria-n-8192-2015-tomba-como-patrimonio-cultural-imaterial-do-municipio-o-kochkaese-2020-09-28-versao-consolidada. Acesso em: 02 de agosto de 2022 – 21:12h.
- Redação NSC. Kochkäse é patrimônio cultural imaterial de Blumenau. 21/10/2015 – 04h04. Disponível em: https://www.nsctotal.com.br/noticias/kochkase-e-patrimonio-cultural-imaterial-de-blumenau. Acesso em: 02 de agosto de 2022 – 23:02h.
- WITTMANN, Angelina. Gastronomia – Kochkaese. 3 de janeiro de 2014. Disponível em: https://angelinawittmann.blogspot.com/2014/01/gastronomia-kochkaese.html
Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
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