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Quem foi o cônsul honorário alemão que teve rede de filiais na Colônia Blumenau no século XIX

Residência de Gustav Salinger, em 25 de janeiro de 2004. Fotografia de Gilfredo Ballod.

Iniciamos este artigo apresentando a descrição do entorno do casarão Salinger no seu tempo histórico áureo, quando também era a sede do Consulado Alemão em Blumenau, além de ser a residência do cônsul honorário alemão em Blumenau, Gustav Salinger,  feita por Franz Giesebrecht.

Postal da Residência do Cônsul Honorário Alemão em Blumenau e sede do consulado alemão.

“Na Rua do Garcia eleva-se no meio de uma vegetação opulenta a Igreja Evangélica, com a casa paroquial. Um pouco adiante, chega-se à propriedade do engenheiro Odebrecht, que se destaca pelas suas belas árvores exóticas no jardim. O Hospital está situado na rua que vai para Gaspar, bem como o Manicômio e a Loja Maçônica. Numa rua transversal da Rua das Palmeiras está a grande casa comercial de Gustav Salinger & Cia. e a Farmácia de Reinhold Anton. Na próxima rua paralela à Palmenallee, está a pequena cadeia de Blumenau e a bela Vila do Cônsul Sr. Salinger. Escondido dentro da vegetação, na base de uma encosta, está o Schützenhaus (Casa dos Atiradores). Estive muito bem alojado no Hotel Schreep (mais tarde, Lüders, Brasil). Franz Giesebrecht, GERLACH, 2019 – Página 429.

Giesebrecht foi um viajante que veio no tempo da formação da do empreendimento Colonizadora Hanseática – 1897/98 e ficou hospedado na residência do Cônsul Honorário da Alemanha em Blumenau – Gustav Salinger.

Também, se hospedou na residência/consulado alemão pertencente a Gustav Salinger, onde falou com as pessoas de sua sacada, o embaixador alemão Friedrich Richard Krauel, o responsável por ascender o projeto ferroviário   regional – EFSC – aos interessados, na Alemanha.

Blumenau, 1900 – Rua Alwin Schrader. Residência e Consulado Alemão – Cônsul – Gustav Salinger descrito por Franz Giesebrecht.

Gustav Salinger – Cônsul Honorário Alemão em Blumenau

O pioneiro pomerano Gustav Salinger nasceu em 23 de junho de 1848, na cidade pomerana de Greifswald, atualmente parte do território da nação alemã criada em 1871.
Na Europa, Salinger pertencia a uma família de tradicionais comerciantes. De acordo com o Professor Max Humpl, no início do século XX, o primo de Salinger possuía uma importante Casa Comercial em Berlin.
A cidade natal de Gustav Salinger – Greifswald – é a atual cidade co irmã da cidade vizinha de Blumenau – Pomerode SC. A cidade também foi eternizada nas obras do artista alemão Caspar David Friedrichimportante pintor alemão do século XVIII.

O pomerano Salinger chegou ao Brasil em 1876, fixando-se em Brusque. Depois de um tempo, mudou-se para Itajaí, onde foi trabalhar no comercial Asseburg de Wilhelm Asseburg, com filiais na Colônia Blumenau e em Brusque. Quem também trabalhou nesta firma – filial de Brusque – como gerente, foi o genro de Pedro WagnerKarl Christian Renaux.

Depois de um tempo, Salinger adquiriu a firma, quando, em 1881 foi enviado para Blumenau para gerenciar a filial da Asseburg & Cia. Ao adquiri-la, passou a administrar seu próprio estabelecimento comercial, com negócios de importação de mercadorias e exportações de produtos coloniais, excedente das propriedades agrícolas, pequenas indústrias familiares – conforme o projeto e planejamento do fundador baseado no ideário de Quasnay, onde a colônia fundada por Hermann Blumenau, com o perfil de uma empresa agrícola.

Colônia agrícola. Fotografia Arquivo Público e Histórico de Rio do Sul.

As propriedades agrícolas, além de serem autossuficientes, comercializavam o excedente de sua produção familiar, fomentando a indústria alimentícia que surgia no final do século XIX. Muniam as novas indústrias com a matéria prima – produção excedente destas propriedades rurais – que também eram “pequenas fábricas” – para consumo da família. Este processo promoveu o surgimento da indústria no Estado de Santa Catarina. Salinger participou do processo, como exportador, industrial e também, importador de produtos. Simultaneamente distribuía o produto industrializado na região e fora dela. Também, exportava produtos como banha, manteiga e fumo. Sua firma passou a se chamar Gustav Salinger & Cia. A partir desta, surgiram inúmeras filiais no território da Colônia Blumenau, tendo como sócio, seu antigo funcionário, Peter Christian Feddersen.

Comunidade Altona – Atual Itoupava Seca. Esta edificação está em processo de ruinificação. É propriedade da FURB.
filia Casa Salinger – Timbó.
Hansa Hammonia – Construída com a técnica construtiva enxaimel, monumental e com mais detalhes que muitas edificações construídas com a técnica na sede da colônia. Isto se explica porque os pioneiros alemães que chegaram em Hansa Hammonia – atual Ibirama – chegaram décadas depois que aqueles que chegaram à sede da colônia.

Em 1881, Salinger se naturalizou brasileiro e assim poderia ocupar funções públicas, o que não tardou a acontecer. Casou-se com Dorothea Reich. Não tiveram filhos no casamento. Adotaram a menina Olga Müller (nascida em 5 de maio de 1887), o que, talvez, explique a forte presença do sócio Coronel Feddersen nos negócios da firma. Sua filha adotiva Olga se casou com Victor Probst.

Em 5 de janeiro de 1884 foi eleito 1º Suplente na subdelegacia e em 18 de novembro de 1885, suplente de Juiz Municipal.

Em 1887 fez parte da Sociedade da Imigração e ocupou o cargo de Cônsul Honorário da Alemanha em Blumenau, por 25 anos. 

Em 1888 foi eleito titular e suplente de Juiz de Órfãos entre os anos de 1885 e 1887.

Presidiu a Câmara Municipal de Blumenau, que era a mesma função atual de prefeito – 3° prefeito de Blumenau (pleito de 1889 a 1890).  

Gustav Salinger foi um dos grandes incentivadores da Neue Deutsche Schule fundada em 1889 e da Sociedade Teatral Frohsinn.

Neu Deutsche Schule – no Boulevard Wendeburg. Fotografia de Alwin Seeliger, 1862-1907, fotógrafo morador de Altona/Itoupava Seca, filho de Karl Friedrich Seeliger. Registro  aproximadamente do final do século XIX, que foi editado no “Der Urwalsbote Kalender” para o livro de comemoração dos 50 anos da Colônia de Blumenau. Eugen Currlin utilizou a foto e a editou para usar em um postal de 1904 sob número 17. Quando a ‘Édition de la Mission Brésilienne de Propagande’, contratada no governo de Affonso Penna para fazer a propaganda da Exposição Nacional de 1908 – Rio de Janeiro, em comemoração ao centenário da abertura dos portos por D. João VI, esta usou a foto sem atribuir a autoria aos seus verdadeiros autores. Bruno Kadletz
Contribuição de Marcos Schroeder.

Em 25 de outubro de 1887, Salinger recebeu da Assembleia Legislativa Provincial de Santa Catarina concessão, por 30 anos, para a construção de uma estrada de cargueiros entre Curitibanos e Blumenau. Em 1890, tornou-se diretor da Companhia Construtora da Estrada Blumenau-Curitibanos.
Durante o II Império, fazia parte do Partido Conservador e depois do golpe da Proclamação da República em 15 de novembro de 1889, ingressou no Partido Federalista. Em 1891 foi eleito Suplente de Deputado Estadual com 2.249 votos, e, convocado, tomou posse à 1ª Legislatura, no mesmo ano.
Com surgimento das classes sociais a partir de uma mesma base que formava o Kulturverein, fez parte de toda esta movimentação, a partir da separação dos colonos, industriais e comerciais. Foi sócio fundador da Associação Comercial e Industrial de Blumenau – ACIB e em 1898 foi eleito o seu primeiro presidente com mandato entre 1898 e 1917.
Também fez parte do grupo de lideranças locais responsáveis pela construção da Usina Hidrelétrica do Salto, em Blumenau, em 1912, localizada no Rio Itajaí-Açú, entre eles: Paulo Zimmermann, Pedro Cristiano Feddersen e Carl Jensen.

Usina Hidrelétrica do Salto – Bairro do Salto – Blumenau SC.

Gustav Salinger partiu em 9 de fevereiro de 1920, completando 100 anos de sua partida, em 2020.

Cemitério luterana Centro – Blumenau SC

Gustav Salinger foi homenageado, emprestando seu nome a uma das ruas da cidade de Blumenau, localizada no bairro Itoupava Seca.

Residência de Gustav Salinger – Consulado Alemão em Blumenau no final do século XIX –   Arquitetura

A residência de Gustav Salinger e também, sede do Consulado Alemão no final do século XIX, estava localizada no casarão da Rua Alwin Schrader, sob o N°44, construído na segunda metade do século XIX.

A edificação ainda se encontra no local no momento presente, mesmo tendo passado, no mínimo, por três grandes revitalizações, em tempos históricos distintos, perceptíveis nos registros fotográficos existentes. Sua construção original foi feita no estilo neoclássico -comum neste período nas áreas urbanas da colônia Blumenau a partir da efervescência comercial e industrial. Edificação com estrutura autoportante original demonstrando o alinhamento e importância de Salinger.

Muitos dos membros da nova classe social emergente da Colônia Blumenau da virada do século XIX para o século XX, negando a arquitetura local pioneira, adotavam o decorativismo cênico – quase o fake atual – sobre edificações com estrutura enxaimel, existentes, ou novas construídas. Muitas edificações da rua XV de Novembro, por exemplo, são dotadas de estrutura enxaimel, rebocadas e dotadas do decorativismo neoclássico. Um destes exemplos é a edificação da filial Salinger construída sob coordenação de Peter Christian Feddersen na Altona – atual Itoupava seca.

Em síntese, originalmente, a residência de Gustav Salinger seguia a tendência internacional do neoclássico, com a presença do decorativismo nas cimalhas, simetria das fachadas, janelas munidas de duas folhas – comum nas edificações locais, desde as construções com a técnica construtiva enxaimel. Apresentava a mansarda com o Dachgaube, cuja fachada frontal era munida somente de uma janela. No pavimento térreo havia uma grande escada frontal, e um porão. Esta tipologia durou muito pouco tempo sem o acréscimo de outros elementos visíveis em fotografias do início do século XX, portanto, supomos que não permaneceu com o aspecto original, por mais de 25 anos, partindo do pressuposto que Salinger chegou em Blumenau em 1881, a fotografia de 1898 apresenta a edificação no local e na fotografia de 1906, a edificação já contava com alterações na fachada e com a presença de novos elementos arquitetônicos.

As imagens, por ordem cronológica

Residência com a tipologia e estilo originais.
Postal datado de 25 de maio de 1905. Observar os detalhes clássicos no decorativismo em cimalhas e frisos, arcos plenos, simetria da fachada, arabescos e balaústras.
Observar a monumentalidade da construção ao lado de tipologias simples construídas em madeira, material abundante e barato no local e região – na época. Ao lado da casa de madeira, havia uma edificação enxaimel com fechamento de tijolos maciços aparentes.
Janelas na linguagem Art nouveau.

Em uma fotografia de 1906, a edificação apresenta ampliação de área, acréscimos e mudanças de janelas na mansarda – Dachgaube, fachada frontal assimétrica em função de acréscimo de área e elementos do Art Nouveau nas janelas laterais – fachada esquerda – ampliação. Demais modificações, destacadas nas fotografias a seguir.

No primeiro semestre de 2021, a edificação histórica está passando por um processo de restauro e recuperação. Lembramos – através de anotações nas fotografias – que a residência de Gustav Salinger sofreu inúmeras modificações de seu aspecto e tipo original.

Registros para a História – 1987, 2015 e 2021 (3° intervenção na residência de Gustav Salinger)

Levantamento 1987 – Projeto Mermovale – Vilmar Vidor.

2021

Ficha Técnica

  • Construção: Final do século XIX.
  • Arquiteto:
  • Estrutura: Autoportante de tijolos maciços
  • Fechamento: Tijolos maciços rebocados
  • Estrutura de Telhado: Madeira
  • Telhado: Telhas de barro tipo rabo de castor ou germânicas.
  • Aberturas: De madeira com vidraças
  • Piso: Madeira – assoalho de tábuas.

Um registro para a História!

Referências

  • Arquivo Histórico José Ferreira da Silva. Memória Digital: Gustav Salinger. postada em 22/06/2015 08:29. Disponível em: https://www.blumenau.sc.gov.br/secretarias/fundacao-cultural/fcblu/memoria-digital-gustav-salinger12. Acesso em: 28/08/2021 – 16:30h.
  • GERLACH, Gilberto Schmidt. Colônia Blumenau no Sul do Brasil, pesquisa; Gilberto Schmidt-Gerlach, organização; tradução Pedro Jungmann. – São José : Clube de Cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 2 t. (400 p.) : il., retrs.
  • HUMPL, Max. Crônica do vilarejo de Itoupava Seca: Altona: desde a origem até a incorporação à área urbana de Blumenau; Méri Frotscher Kramer e Johannes Kramer (orgs.). – 1.ed. – Blumenau (SC): Edifurb, 2015. – 226 p.: il.
    Memória Política de Santa Catarina. Gustav Salinger. Disponível em: http://memoriapolitica.alesc.sc.gov.br/biografia/358-Gustavo_Salinger. Acesso em: 28/08/2021 – 17:14h.
  • WITTMANN, Angelina C.R. Fachwerk: A Técnica Construtiva Enxaimel – 1.ed. – Blumenau, SC : AmoLer, 2019. – 405 p. : il.

Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
@angewittmann (Instagram)
@AngelWittmann (Twitter)

Em breve – Estaremos lançando o livro: “Fragmentos Históricos – Colônia Blumenau” – inspirado nos artigos desta coluna. Aguardem.

Estamos ingressando em um período de férias, ao longo do mês de dezembro. Agradecemos a oportunidade de, ao longo de 2022, poder ter tido a oportunidade de compartilhar nossas pesquisas movidas pela curiosidade de uma arquiteta e também, agradecemos sua silenciosa leitura, fomentando uma comunicação motivadora.
Boas festas e feliz Natal com promessa de um ano novo melhor e tranquilo para todos.
Em 2023, continuaremos registrando para a História. Até lá e um abraço amigo.
Arquiteta Angelina Wittmann
Email: angewitt@hotmail.com