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Suposto projeto de doação de marmitas em Blumenau gera suspeitas nas redes sociais

Foto falsa, imagens antigas e quantidade de histórias que engajam causaram acusações de pessoas que contribuíram

Um suposto projeto de entrega de marmitas para moradores em situação de rua em Blumenau está gerando suspeitas de golpe nas redes sociais. Diversas pessoas que fizeram doações e outras que seguiram o “Alimentando Necessidades” começaram a desconfiar após um grupo de pesquisa autônomo publicar uma espécie de “dossiê” sobre o caso.

A desconfiança começou pela quantidade de fios (expressão usada no Twitter para contar histórias em uma sequência de postagens) que engajaram nos perfis das duas coordenadoras do projeto, que se apresentam como Duda Poleza e Taynara Motta.

Ambas publicaram prints de conversas que tiveram milhares de reações e divulgaram ainda mais o projeto. Em um dos casos um rapaz pede fotos nuas em troca de doação, já em outro uma pessoa oferece carne vencida para que seja utilizada nas marmitas.

Duda conta sobre uma amiga que queria doar carne vencida ao projeto. Foto: Reprodução/Twitter

Num caso mais antigo e grave, Taynara conta sobre uma experiência de estupro que teria sofrido. Em todas as publicações o perfil do projeto é divulgado, juntamente com uma chave pix para doações.

Perfil de Taynara conta sobre o estupro. Foto: Reprodução/Twitter

O perfil que publicou as contradições iniciou destacando a possibilidade de Taynara não existir. Ele mostra por exemplo, que o perfil criado em outubro de 2021 não traz informações pessoais da jovem e atua apenas como divulgador do projeto. Além disso, que a foto do perfil de Taynara no Twitter era de outra pessoa, chamada Larissa, usada no Pinterest, um site de imagens.

Outra incongruência é que Taynara não é encontrada em nenhuma outra rede social. Aliás, uma pesquisa de dados de sistemas do governo do estado não conseguiu encontrar nenhuma Taynara Motta morando em Blumenau.

Vídeo deletado

Pela pressão sofrida nas redes sociais pela desconfiança, as duas coordenadoras resolveram fazer vídeos para provar que existem. O de Duda permanece no perfil, informando ainda que uma live será feita nesta segunda-feira, 26, às 21h.

Entretanto, o vídeo de Taynara foi publicado e logo deletado. Ele possuía muitos efeitos de imagem e áudio, o que trouxe ainda mais desconfiança. Muitos acreditaram que se tratava da própria Duda.

Desconfiança com o projeto

Seguindo as pesquisas, o grupo partiu para o projeto em si. Descobriram que antes do Alimentando Necessidades, Duda já tinha um outro perfil de auxílio, o Absorvendo Necessidades, que arrecadava dinheiro para comprar e distribuir absorventes para mulheres em situação de pobreza menstrual. O projeto não existe mais.

O “dôssie” mostrou que as fotos publicadas pelo Alimentando Necessidades são as mesmas desde o ano passado. Elas aparecem, sem muita diversidade, em todas as publicações de divulgação – seja nos fios engajados, ou em pedidos de doações. As únicas imagens “diferentes”, são de Duda fazendo as marmitas.

Aliás, foi possível observar que uma das únicas duas fotos mostrando a entrega das marmitas, aconteceu em Pomerode, em frente ao restaurante do padrasto de Duda, proprietário do restaurante Temperos do Mika.

Contato com Duda

Nossa reportagem entrou em contato com Mika, que nos atendeu e confirmou a ligação de Duda com o projeto. Ele afirmou “auxiliar” em algumas compras, mas disse não ter mais informações sobre o projeto, porque é a enteada que cuida de tudo.

“É dificil encontrar alguém que, com 18 anos, faz o que ela faz nesses projetos. Ela vive nisso, o tempo todo”, afirmou Mika por telefone.

Ele ainda confirmou que moram em Blumenau, mas explicou que Duda estava viajando para “São Paulo ou Rio de Janeiro” e que tinha mudado de número de telefone, por isso, não saberia repassar.

A equipe do jornal O Município Blumenau tinha um número de contato de Duda, por tentar entrevistá-la há algumas semanas sobre o projeto, antes de toda a suspeita. A ideia era fazer uma matéria divulgando o Alimentando Necessidades. Entretanto, ela respondeu as primeiras mensagens e depois desapareceu, não atendendo mais as perguntas e ligações.

Ao falar com Mika, nossa equipe deixou o contato para que Duda pudesse retornar. Até a publicação da matéria, não conseguimos contato com nenhuma das representantes do projeto.

Repercussão nas redes sociais

Nas últimas horas, a suspeita de golpe se tornou um dos assuntos mais comentados no Twitter. Diversos perfis conhecidos comentaram sobre a questão, denominando o caso como “Marmitagate”. Até o perfil do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que atua fortemente na doação de alimentos nas periferias do Brasil, citou a polêmica.

Durante toda a repercussão, muitas pessoas que fizeram doações comentaram sobre a revolta de terem possivelmente sido vítimas de um golpe. A reportagem do jornal O Município Blumenau conversou com uma delas, que contou sobre como foi o contato com o projeto.

“Primeiro vi o projeto do absorvente, apareceu na minha timeline, e fiz a doação, em janeiro/22. Em abril apareceu de novo na timeline e dessa vez, sobre a distribuição das marmitas, e doei também. E sempre divulgava aqui. Na época não achei estranho. Só agora parei pra refletir, depois que você doa elas, se são duas de verdade, ignoram você por completo. Sinalizei as doações e nunca responderam. Eu já doei em outros projetos e na mesma hora a pessoa te responde e etc”, relatou Isabel Cristina Alves da Silva, do Rio de Janeiro.

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