Uma das pioneiras, sempre na busca por melhores condições de trabalho
Reportagem: Natiele Oliveira e Alice Kienen
Há 17 anos atuando no transporte coletivo de Blumenau, Marlene Satiro, 57 anos, foi a segunda mulher a atuar como cobradora de ônibus na cidade e uma das fundadoras do Sindicato dos Empregados do Transporte Coletivo Urbano (Sindetranscol). Apaixonada pela atividade, ela agarrou todas as oportunidades que encontrou pela frente na busca por melhorar as condições de trabalho dela e dos colegas.
Em 2006, enquanto ainda era uma das únicas mulheres no ramo, Marlene não aceitou a cobrança de taxa na conta salário dos trabalhadores do transporte coletivo da cidade. Junto de outros motoristas e cobradores, ela se movimentou para formar o sindicato e lutar pelos direitos dos funcionários.
“Antes da fundação do Sindetranscol, trabalhávamos até 15 horas por dia sem regramento de turnos e folgas. Hoje, trabalhamos 7 horas por dia com uma folga semanal no sábado ou no domingo, alternando semanalmente, e temos uma folga casada, ou seja, sábado e domingo”, explica.
Fama de durona, mas fonte de inspiração e de elogios
Antes de entrar no transporte coletivo de Blumenau, Marlene trabalhou no comércio. “Confesso que detestava. Entrar como agente de bordo (cobradora) foi difícil por conta do machismo. Era como matar um leão por dia. Mas também me sentia realizada e orgulhosa pelas mulheres de Blumenau, uma cidade tão conservadora”, ressalta.
Marlene comenta que a atenção exagerada ao fato de ela ser mulher a incomodava no início. Havia muita desconfiança, por parte dos usuários do transporte público e até de colegas, da capacidade que ela teria para desempenhar as tarefas da função. Entre os desafios do dia a dia, ela teve que enfrentar episódios de assédio sexual e psicológico.
“Acabei usando as ‘armas’ que dispunha para combater o julgamento. Por exemplo, quando trabalhava com um motorista novo, já deixava claro: ‘Eu vou te respeitar se você me respeitar. Você faz seu trabalho e eu faço o meu. Se tentar me ferrar por ser mulher, ferro você com a chefia’”, recorda.
Com o tempo, a fama de durona de Marlene se espalhou e ela não precisou mais convencer os colegas. Além disso, receber elogios das usuárias do transporte coletivo a inspirava. “Eu me sentia e me sinto muito à vontade, pois amo o que faço”, enfatiza.
Mais oportunidades para as mulheres
Na avaliação de Marlene, o espaço conquistado pelas mulheres no transporte coletivo de Blumenau abriu espaço para novas oportunidades. Especialmente após a representação sindical feita por ela a partir de 2006. Entre as conquistas desde então, está a possibilidade das mulheres também atuarem como motoristas dos ônibus.
Questionada se teria, ela própria, interesse em ser motorista, Marlene explica que nunca teve vontade de assumir esta função por perceber o estresse que os colegas passam. “Não foi falta de oportunidade, nem de incentivo. Nós, agentes de bordo, já sofremos junto, mas com menor intensidade”, acredita.
No dia a dia da profissão, os cobradores enfrentam os mais diversos desafios entre um sacolejar e outro de ônibus. Para Marlene, a importância desta função está relacionada com o apoio que o cobrador dá na hora de controlar a abertura de portas e na atenção aos passageiros, auxiliando no controle do serviço e garantindo que o motorista fique focado no trânsito.
“Isso inibe a ação de ladrões e o assédio às mulheres. Também auxiliamos os usuários no que está ao nosso alcance, dando atenção especial às pessoas idosas, mães com crianças, etc. Fazemos o possível para garantir segurança e comodidade para todos”, detalha.
Após ter atuado em quase todas as linhas de ônibus de Blumenau, Marlene trabalha atualmente na bilheteria do Terminal da Fonte. Entre o trabalho nesta função e a atividade sindical, ela usa o tempo livre para cuidar da irmã com a ajuda do filho, hoje com 31 anos.
Entre os planos que tem para o sindicato, Marlene reforça a importância de continuar batendo nas teclas de levar informações e conhecimento sobre consciência de classe, melhorar e conscientizar em relação a preconceitos que possam existir entre os trabalhadores e que envolvam gênero, raça, cor, orientação sexual, entre outros tópicos. “A luta é diária”, conclui.