Dom Angélico Bernardino: “Eu não estava apoiando coisa nenhuma”

Bispo emérito de Blumenau afirma que participou de ato ecumênico em homenagem a Dona Marisa, e não de evento político

Primeiro bispo da Diocese de Blumenau, dom Angélico Sândalo Bernardino envolveu-se em polêmica no último sábado ao subir num palanque para uma celebração ecumênica em homenagem à ex-primeira-dama Marisa Letícia. Criticado internamente, pelo arcebispo de São Paulo, e externamente, Bernardino foi acusado de instrumentalizar politicamente a religião.

Na entrevista abaixo, o bispo emérito nega que tenha apoiado o Partido dos Trabalhadores ou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no evento em São Bernardo do Campo (SP). Diz que foi atender a um pedido de uma família amiga. Confira:

O Município Blumenau – Política e religião podem se misturar?
Dom Angélico Sândalo Bernardino – Todo ato é político. Agora, não é partidário. A religião exerce a missão de ser o cristianismo, uma presença do amor de Deus no mundo. Jesus pregou que Deus é nosso pai, e portanto somos irmãos. Qualquer diferença de religião, de raça, de condição… Se somos irmãos, precisamos nos amar. E o amor no concreto, que todos tenham trabalho, ganhem remunerado, tenha educação, saúde, habitação, transporte, terra para trabalhar, todos os bens que Deus destinou a toda humanidade devem ser usufruído por todos, e não por poucos.

O cardeal dom Odilo Pedro Scherer criticou o uso político do ato religioso em homenagem à ex-primeira-dama Marisa Letícia. O que tem a dizer sobre isso?
Ao que me consta, e quem quer ouvir o discurso que se seguiu após o ato religioso, o ato religioso já tinha se encerrado. O presidente Lula não fez referência nenhuma ao ato religioso e nem à igreja. Eu já tinha declarado à imprensa aqui em São Paulo que não era um ato promovido pela CNBB. É um ato ecumênico, como tantos outros atos. Quantos atos ecumênicos eu tive aí na minha querida Blumenau. Inclusive na Catedral, em que no meu tempo era a pastora Mariane (Beyer Ehrat, pastora sinodal da Igreja Evangélica de Confissão Luterana). E outros pastores queridos de Blumenau, tanto na igreja católica quanto na de confissão luterana. Não precisou do aval da CNBB.

Foi algo que partiu de um convite pessoal do Lula, então?
Partiu do convite da família do Lula e da aceitação da minha parte daqueles religiosos que lá estiveram. O que é normal, é comum. Aqueles que acham que foi um ato instrumentalizado devem ter argumentos para provar isso. Porque quando padre ou um bispo cumprimenta um político, aperta a mão, pode ser julgado um ato político. Essa programação não foi para apoio do Lula, foi uma programação que a família pediu pelo aniversário de Marisa. Que outros instrumentalizam a favor ou contra, é da ótica de cada um.

Qual a opinião do senhor sobre a prisão do Lula?
Aí acho que compete à defesa dele ter plena liberdade até o fim para expor a defesa, e aqueles que exercem a Justiça que o façam firmados nos atos. É esse o meu voto. Eu não adentro a juízos.

Até mesmo por essa relação pessoal e familiar com o Lula…
Eu quero o bem dele. A casa do Lula, o apartamento dele em São Bernardo é muito simples. É uma família que luta.

Tendo formação em Jornalismo, o senhor acredita que a imprensa persegue o ex-presidente Lula?
Não gosto de falar em perseguição, mas o que eu sei, e todo mundo sabe, é que os grandes meios de comunicação não estão a serviço do povo, estão a serviço do poder econômico. Não é novidade para ninguém. Basta que a gente abra os jornais diariamente, veja televisão, e veja se eles estão, por exemplo, andando pelas favelas, pelos cortiços, defendendo os direitos daqueles que não têm terra para trabalhar, daqueles que são moradores de rua. A gente precisa ter um mundo onde a pessoa humana seja respeitada. E respeito e amor significa alimentação, casa, escola, saúde para todos. A grande imprensa está lutando para que isso aconteça?

O senhor sofreu algum tipo de retaliação ou ameaça pelo apoio ao ex-presidente Lula?
Aqui eu preciso antes, e peço que você no seu jornal preste essa colaboração: em primeiro lugar, não foi uma missa, foi um ato ecumênico. E por que aconteceu? Eu sou muito amigo da família do Lula, e essa amizade vem de longa data. Antes de ele ser político, quando ele era do sindicato dos metalúrgicos la do ABC, eu era bispo responsável pela pastoral operária em SP. Quando a mulher dele ficou doente, eu fui o bispo que foi ao hospital porque a família me chamou. Quando morreu, a família me pediu para ir ao velório. E agora era o aniversário dela, a família me convidou para uma oração lá no sindicato. Eu falei: ‘vou’. Quando eu cheguei lá era uma multidão. A data do aniversário da mulher dele coincidiu com a prisão. Nós fizemos o ato ecumênico do qual participou inclusive uma pastora luterana. Em determinado momento nós terminamos o ato religioso. Eu me afastei, e os outros religiosos se afastaram. Começou então o pronunciamento do ex presidente. E aí certa imprensa, certos movimentos e partidos disseram que o ato foi instrumentalizado pelos políticos. Eu não fui lá para apoiar nenhum partido político. Eu não tenho partido político. Fui como ministro religioso e rezamos junto com o povo. Depois do ato houve muita gente que é solidária a mim. A imensa maioria é solidária. Mas também, minha irmã, muita gente está dizendo que ficou escandalizada de ver um bispo lá, apoiando. Eu não estava apoiando coisa nenhuma. É a mesma coisa que dizer que Jesus quando foi até alguma pessoa que foi considerada perdida estava apoiando. Ele estava solidário com o sofrimento. Então eu sou um bispo que opto decididamente por aqueles que sofrem. Pelos trabalhadores, pelos que estão marginalizados, e quero que haja nesse país, a aqueles que corrompem, grandes indústrias que corrompem políticos e políticos corrompidos, que sejam julgados com ampla defesa e se foram culpados devolvam aquilo que roubaram, mas que não queiram fazer mistura indevida. Mas não tenho sofrido ameaça, não, viu? Tem pessoas que me apoiam claramente, e outros que acham que não deveria ter estado lá.

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