Opinião: Por que a queda de 32% no preço da gasolina não chega a Blumenau
Em artigo, Marco Alan Rotta discute os motivos de o valor cobrado na bomba não acompanhar a redução nas refinarias
Marco Alan Rotta é gestor de projetos e consultor
Preço da gasolina caiu 32% nos últimos dois meses
Você não leu errado, não. Os preços da gasolina realmente caíram algo em torno de 32% entre os fins de setembro e novembro. Mas no meu bolso – e aposto que no seu também – não percebi nada nem perto deste decréscimo. Quem embolsou essa diferença?
Em 30 de novembro, a gasolina nas refinarias da Petrobras custava aproximadamente R$ 1,50, após uma queda incessante por semanas a fio, puxada pelo preço do petróleo e pelo dólar. Só começou a baixar (lentamente) nas bombas de Blumenau depois de uma pressão de órgãos de defesa do consumidor, mas ainda assim o preço da gasolina comum na maioria dos postos de Blumenau permanece acima dos R$ 4.
Quer mais um dado para pensar? Dia 12 de março abasteci meu carro em um posto do centro de Blumenau por R$ 3,58. Sabe quanto estava a gasolina nas refinarias naquele dia? R$ 1,73. Em uma regra de três simples, o preço atual deveria estar a menos de R$ 3,50.
Certamente que muitos fatores influenciam o preço dos combustíveis, e muita gente jura que existe um cartel do setor em Blumenau. Provar tal acusação é algo complexo. A ANP informa que boa parte das investigações de cartel tem como motivação denúncias de preços semelhantes entre vários postos.
Todavia, emenda a agência, esse fato por si só não é prova suficiente para a caracterização de cartel, pois preços semelhantes podem ser apenas um reflexo da aversão dos postos ao início de uma guerra de preços.
E aqui gostaria de agregar esta informação ao que o Procon identificou recentemente ao investigar o assunto na região de Blumenau: que são as distribuidoras a represar as reduções na sua venda aos postos.
O Sindipetro (que representa os donos de postos da região) reforça indicando que apenas a metade desta queda nas refinarias foi repassada pelas distribuidoras, e que o consumidor final só observou uma redução da ordem de um quinto da redução inicial.
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A raiz do que me parece ser o maior problema se revela: os postos só podem comprar combustíveis de distribuidoras, e três distribuidoras dominam 80% da venda de gasolina no Brasil, segundo dados da ANP. Com tão poucos concorrentes nem é preciso combinar preços, pois eles provavelmente vão acabar se assemelhando pela concorrência limitada.
Em maio de 2018, durante a greve dos caminhoneiros, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) publicou uma proposta contendo nove ideias para aumentar a concorrência do setor e, por consequência, reduzir os preços ao consumidor final.
O Cade conclui que “apesar de o setor de combustíveis ser o principal alvo de denúncias de prática de cartel no Brasil, […] nem todos os problemas desse mercado são provocados por condutas anticompetitivas e que existem questões ligadas ao desenho institucional que poderiam ser melhoradas para aumentar o nível de rivalidade.”
Certamente que existem outras dimensões do preço dos combustíveis a serem discutidas, como a (alta) carga tributária. Mas faço eco às propostas do Cade, e penso que falta concorrência em toda a cadeia do combustível, mas em especial na distribuição e no refino.
E se existe algum cartel de fato, provavelmente o que este cartel mais teme é exatamente o aumento da concorrência.