A Câmara de Vereadores realizou na noite desta quinta-feira, 23, audiência pública visando debater projetos, as possíveis abordagens e ações voltadas às pessoas em situação de rua no município de Blumenau. O debate realizado no Plenário do Legislativo Municipal foi solicitado pelo vereador Almir Vieira (Progressistas) através do requerimento 2001/2023 e aprovado pelos demais parlamentares.
Estiveram presentes o presidente da Câmara, Almir Vieira, e os vereadores Cristiane Loureiro (Podemos), Emmanuel Santos, o Tuca (Novo), João Beltrame (Podemos), Adriano Pereira (PT) e Bruno Cunha (Cidadania).
Além deles, a secretária municipal de Desenvolvimento Social, Patrícia Morastoni Sasse; o coordenador geral do comitê intersetorial de acompanhamento e monitoramento da política nacional para população em situação de rua, do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, Anderson Lopes Miranda; o coordenador estadual do centro judiciário de solução de conflitos e cidadania da Justiça Federal, Dr. Leonardo Muller Trainini; Conselheiro da OAB Blumenau, representando a entidade, Eduardo Creuz; diretor de política sobre drogas e reintegração social, Fábio Ramos; coordenadora técnica de proteção especial do Semudes, Marli Olinda Tomelin; assessora técnica de assistência social da Associação dos Municípios do Vale Europeu, Nayara Brito; presidente do Conselho dec Assistência Social, Maria Eunice Bernerdt Malacarni; coordenadora do centro de defesa dos direitos humanos de Blumenau, Elsa Cristine Bevian; conselheiro do Conselho Municipal de Políticas sobre Drogas, Sérgio Luis Santos; representante do Movimento Nacional Pop Rua, André Schaefer; Padre João Bachmann, Pastor Bill e presidente da CDL Blumenau, Eduardo Soares.
Situação em Blumenau
No início da audiência, a secretária municipal de Desenvolvimento Social, Patrícia Morastoni Sasse, fez uma apresentação sobre o trabalho desempenhado pela pasta e o grande desafio ao lidar com o assunto. Ela destacou que no Brasil temos no momento cerca de 221 mil pessoas em situação de rua, sendo 88 mil apenas em São Paulo. Já em Santa Catarina são cerca de nove mil, com duas mil em Florianópolis, um mil em Joinville, 517 em Itajaí, 390 em Balneário Camboriú e 480 em Blumenau.
“Nos últimos anos estamos passando por mudanças, acompanhamos um aumento significativo e uma mudança grande no perfil dessas pessoas, que agora estão em grande quantidade em todos os municípios”, afirmou.
Patrícia ainda acrescentou que o problema não está apenas nas pessoas em situação de rua, mas sim no comportamento e esta é uma missão que precisa ser trabalhada em conjunto por todos. “Não se faz política pública sozinha quando se fala de pessoa em situação de rua. É preciso debater e dialogar entre todos. O nosso trabalho é dar dignidade e ofertar possibilidades. A violência urbana está cruel, assim como as praticadas dentro de casa. Não é por nada que tenhamos 1,3 mil famílias acompanhadas na mega complexidade. Não é apontar o dedo, não existe metodologia simplista, ou trabalhamos em conjunto, ou vimos esse problema crescer”, complementou a secretária.
A coordenadora técnica de proteção especial do Semudes, Marli Olinda Tomelin, incrementou a fala com mais dados estatísticos da secretaria. Em 2020 foram realizados 23.054 atendimentos e até outubro deste ano já alcançamos 35.712 atendimentos. Quando a variação parte para pessoas com CPF, só em 2023 já foram realizados atendimentos a 2.389 pessoas.
“Precisamos trabalhar de forma mais humanizada, levando dignidade às pessoas em situação de rua. O morador de rua tem direitos, ele pode frequentar os lugares como qualquer um de nós. São muitos usuários que chegam sem nenhum documento e esse é um dos maiores trabalhos. A maior tristeza enquanto assistente social foi ter que enterrar um morador de rua sem um documento. Eu por muitos anos procurei todas as possibilidades de reconhecimento desta pessoa. Localizei a família, a irmã, mas ele não tinha registro. Então, muito tem que ser feito”, comentou.
Em busca de soluções
Um dos convidados a nível nacional foi o coordenador geral do comitê intersetorial de acompanhamento e monitoramento da política nacional para população em situação de rua, do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, Anderson Lopes Miranda, que comentou ter vivido 38 anos em situação de rua e relatou mudanças profundas no seu comportamento, hoje sendo uma referência na luta.
“Não temos que apontar o dedo, temos que executar. Se tem pessoas na rua, nós temos que cuidar. Esse é o papel de todos. Isso está na constituição e as pessoas não podem se omitir do seu papel. Hoje coordeno essa política, já sofri todas as violações que vossas excelências podem imaginar. Defendo uma sociedade humanizada, não podemos aceitar pessoas dormindo na calçada, na minha porta, nós temos que buscar o diálogo. Não é só dar a casa, tem que vir um trabalho, a escola, a saúde, tudo isso temos que fomentar, porque se não amanhã ele vende e volta para a rua”, comentou.
Representante do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania, Dr. Francisco Ostermann de Aguiar, comentou sobre a atuação do Cejuscon. “É um órgão da Justiça Federal, que age buscando soluções alternativas para conflitos. Buscamos resolver as situações de forma pacífica, uma cultura de paz. Percebi nas falas que há dois grandes desafios pela frente. A carência de dados confiáveis pela falta de censo em relação às pessoas que se encontram em situação de rua e o que me parece é a necessidade de se fazer política pública em conjunto. Como foi falado muitas vezes, a falta de documentação torna a pessoa inviabilizada, sem acesso à cidadania. O judiciário se coloca à disposição para qualquer medida relativa aos mutirões de cidadania”, afirmou.
A vereadora Cristiane Loureiro (Podemos) comentou sobre a importância no acompanhamento da saúde das pessoas em situação de rua, bem como destacou uma tramitação de projeto no Senado Federal. “É um tema importantíssimo no sentido de querer ajudar. Já fizemos várias abordagens e aí o que eu digo é que só vivenciando a gente consegue saber o que pode ser melhorado. Eu sei que o Amblu, Centro Pop dão assistência social, mas não podemos segmentar os serviços, todos os apoios precisam estar juntos. Dentro do abrigo precisa ter um médico também. Uma pessoa com dependência química ninguém está livre de ter na família e como vamos tratar? Está sendo discutido um projeto no Senado, um estatuto sobre a pessoa em situação de rua. Existe um comitê dentro desse estudo para acompanhamento, pois se não tiver, não teremos políticas públicas efetivas”, afirmou a parlamentar.
O Conselheiro da OAB Blumenau, Eduardo Creuz, falou sobre a abordagem e a dignidade das pessoas. “A moradia em condição de rua diz também sobre saúde, trabalho, dignidade do ser humano. Nós precisamos ter um levantamento dessas pessoas e as condições que se encontram, mas precisamos a partir daí, independente do que for, interceder em benefício dessas pessoas. A pessoa que está em situação de rua não tem mais condições de se autodeterminar. Essa pessoa não irá sozinha procurar o atendimento, ela precisa da abordagem, de alguém para interceder por ela. Todos temos uma parcela de culpa nessa situação”, comentou o conselheiro.
Visão do comerciante
O presidente da CDL Blumenau, Eduardo Soares, defendeu a causa dos lojistas e mostrou preocupação com o assunto. “O principal da audiência é o conhecimento sobre o tema, pois muitas vezes lá fora não chegam essas informações. Todo dia vêm situações que precisamos fazer algo. É muito complicado na visão do comerciante, mas hoje aqui começamos a enxergar com outro olhar, entendendo assim um pouco mais. Mas trago também o outro lado, pois os lojistas têm as suas angústias e tudo isso atrapalha uma cidade que tem um grau de empregabilidade altíssimo e falta mão de obra. Talvez o maior desafio desta casa seja descobrir uma solução local para não esperar alguma decisão de Brasília”, afirmou.
Liderança religiosa, o pastor Bill falou sobre o Instituto Edificando Vidas e os projetos que transformam a vida das pessoas. “Um dos motivos da criação do instituto foi uma inspiração nos momentos de dificuldades. Fui inspirado a levar bíblias e conversar com as pessoas que vivem nas ruas. A principal situação que identifiquei era a falta de documentação e era um empecilho. Muitas vezes eles não conseguem ser atendidos por falta de documentação. Hoje quem mantém o instituto são as igrejas, inclusive com apoio da igreja católica e luterana. É preciso mais discussão, mais conversa e não podemos perder mais ninguém para as drogas”, afirmou.
O presidente da Câmara falou na necessidade de ações que defendam o interesse das pessoas e busquem tratamento a todos que assim necessitarem. “Nós temos que agir. Precisamos tomar providências. A política demora muito, os conselhos demoram muito, os estatutos levam anos. Enquanto isso o cidadão está na rua e acontece a criminalidade. Enquanto pessoa que viu isso de perto em minha família não concordo em ficar dando dinheiro para ONG, para isso ou aquilo, concordo sim em fazer o cadastro para acompanhar o tratamento do início ao fim. Para que ele possa ter a melhor recuperação, se necessário for, e colocar para trabalhar. Façam cursos profissionalizantes, existem pessoas que não tiveram oportunidades e não concordo em querer dar casa, comida, se for assim, a sociedade não precisa mais trabalhar e vamos todos entrar nesse ritmo. Tem que agir, independente da forma que vai acontecer, modificando as responsabilidades, pois é algo referente a todos, entidades, governo, judiciário, todos com um papel para exercer na sociedade. Como sempre disse meu pai: dê a vara para pescar, não dê o peixe”, afirmou Almir.
Relato pessoal
O diretor de política sobre drogas e reintegração social, Fábio Ramos, fez um depoimento emocionante relacionado a sua vida pessoal. “Senhores e senhoras, seguro nas minhas mãos o atestado de óbito do meu pai. Dependente de álcool, o homem que foi o meu exemplo. Naquele dia que velava dentro de casa, eu dizia que não queria ser igual a ele. A droga que lhe matou fez parte também da história da minha vida. Aos 14 anos já bebia, usava drogas e os meus heróis eram os traficantes da rua da minha casa. Tentei sozinho e não dei conta. Aos 27 anos cheguei em Blumenau e fui acolhido dentro de uma comunidade terapêutica. Hoje, se estou nessa situação, sendo um pai de família, é porque essa cidade tem um potencial grande de transformar a vida das pessoas”, afirmou.
Lideranças comunitárias e de classe também fizeram uso da tribuna para falar sobre o assunto, onde foram apresentadas muitas ideias e iniciativas que poderão contribuir quanto ao tema, sendo unânime a relevância do assunto na visão de todos, abrindo amplo diálogo e reforçando a participação do Legislativo de Blumenau na defesa da sociedade.
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