Capa: Fotografias, em dois momentos históricos, do monumento “Voluntários da Pátria” localizado na praça Hercílio Luz – escultura de Miguel Barba, inaugurada em 5 de outubro de 1965, marcando o centenário da Guerra do Paraguai.

Quando o Brasil entrou em conflito com o país vizinho – Paraguai –, em dezembro de 1864, os colonos da Colônia Blumenau se organizaram e se apresentaram na capital da Província de Santa Catarina – Nossa Senhora do Desterro, para se juntar às tropas brasileiras. A guerra durou 6 anos e terminou no final do ano de 1870.

O fato marcante da vida da Colônia foi a organização, com colonos blumenauenses, de um batalhão de Voluntários da Pátria que, em outubro daquele ano, seguiu para Desterro, de onde rumou para os campos da luta contra o Paraguai… Havia, entre os imigrantes blumenauenses, alguns homens que, na Alemanha, haviam servido ao exército como oficiais…
Grande parte destes voluntários pertencia aos quadros da Sociedade de Atiradores de Blumenau, que fora fundada alguns anos antes. Isso influiu para que no uniforme dos Voluntários da Pátria, constassem características dos tiradores, como seja, o chapéu de aba quebrada para cima ao lado direito, onde, em vez de distintivo social, foi pregado o dos Voluntários da Pátria, distintivo em que constava a coroa imperial, encimado por um laço com os dizeres “Voluntários da Pátria”.  Página 88 – Livro História de Blumenau – José Ferreira da Silva.

Oficiais do pelotão de Voluntários de Pátria da região da Colônia Blumenau.

A lei que convocou os voluntários para a Guerra do Paraguai foi a Lei Imperial n° 3.371, do dia 7 de janeiro de 1865. Nessa época, o líder paraguaio era Francisco Solano Lopez, que invadiu o Estado do Mato Grosso, em 12 de novembro de 1864.

No documento abaixo estão listados 31 homens inscritos e apresentados por Hermann Wendeburg, contrariando registros oficiais de mais homens inscritos. Será que estes nomes surgiram nas listas depois do término do conflito, para constar na lista dos heróis de guerra?  Encontramos um documento publicado em 1976, constando 31 dos aparentes 72 nomes que participaram do conflito. Ao cruzarmos as duas listas, percebemos que há nomes presentes somente no documento original (abaixo) – aumentando, portanto, este número para 76 combatentes.

Abaixo, parte do ofício assinado pelo Diretor Interino da Colônia Blumenau –  Hermann Wendeburg, em 19 de setembro de 1865. Foi encontrado no Setor de Documentos Raros da Biblioteca da Universidade Federal de Santa Catarina.

Fotografia de documento encontrado no Setor de Documentos Raros da Biblioteca da Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC. Muitos nomes de imigrantes alemães foram “abrasileirados”, como, por exemplo: Emil/Emílio; Franz/Francisco; Louis/Luiz; Karl/Carlos; Rudolph/ Rodolfo; Johann/João; Ernest/Ernesto; Willhelm/Guilherme; Heinrich/Henrique; Michael/Miguel; August/Augusto.

Os nomes listados na página encontrada do ofício assinado por Wendeburg (que poderia ter outras páginas de acordo com a publicação do periódico):

1. Emílio Odebrecht – 28 anos – oficial militar
2. Francisco Ewald – 20 anos
3. Luiz Hoffmann – 28 anos – militar
4. Günther Tranche – 30 anos
5. Eugen Kurz – 38 anos
6. Guilherme Mohr – 21 anos
7. Hermann Echelberg –20 anos
8. Henrique Kriegel – 19 anos
9. Conrad Kriegel – 18 anos
10. Fernando Schuhmacher – 28 anos – militar
11. Elias Müller – 29 anos
12. Christiano Müller – 25 anos
13. Henrique Lucas – 23 anos
14. Miguel Kiegel – 32 anos
15. Wendelin Kraemer – 45 anos – Militar
16. Ernesto Richter – 18 anos
17. Carlos Siebert – 18 anos
18. Otto Lobedan – 40 anos – militar
19. Rodolfo Wagner – 27 anos
20. Jacob Jasper – 26 anos
21. Carlos Baucke – 22 anos
22. Christiano Lucas – 25 anos
23. Oscar Kluger – 33 anos
24. Christ Frederico Krüger – 40 anos
25. Augusto Persch – 27 anos
26. Guilherme Hafenstein – 20 anos
27. Fred. Guilherme Grofs – 34 anos – militar
28. Júlio Hartmann – 21 anos
29. João Fred Hafenstein – 47 anos
30. Gottlieb Gnewuch – 27 anos
31. Fred Guilherme Krieger – 24 anos

Colônia Blumenau, 19 de setembro de 1865.
H. Wendeburg
Diretor Interino

Há muitos outros nomes além destes. A revista Blumenau em Cadernos, publicada em 1976, apresenta os nomes de 72 colonos alemães da Colônia Blumenau que partiram em 1865 para Nossa Senhora do Desterro – capital da Província de Santa Catarina, de onde seguiram, junto com o 9° Batalhão de Voluntários da Pátria, para a frente de batalha no Paraguai. Cruzando esta publicação com os dados do ofício assinado por Wendeburg, poderiam ser até 76 os combatentes que foram para o campo de batalha no Paraguai, considerando o documento oficial e os nomes presentes somente neste.

Nossa Senhora do Desterro – Atual Florianópolis. Detalhe – Se observarmos, somente homens andavam na rua nessa hora do dia. As mulheres, geralmente descendentes de portugueses, eram muitas vezes “escondidas” atrás dos “muxarabis”, elementos arquitetônicos herdados da secular ocupação oriental na Península Ibérica. (As mulheres “honestas e de família” – cultura latina que também teve origem no berço do Império Romano).

Nomes registrados na publicação da revista Blumenau em Cadernos T17 n°9 – 1976 – dos Voluntários da Pátria oriundos da Colônia Blumenau, com acréscimo de nomes listados somente no ofício de Wendeburg.

1. Capitão Victor von Gilsa – comandante do contingente de Blumenau
2. Tenente Emil Odebrecht
3. Alferes Wilhelm Friedenreich
4. Alferes Sametzki
5. Soldados:
6. Francisco Ewald
7. Luiz Hoffmann
8. Günther Tranche
9. Eugen Kurz
10. Guilherme Mohr (está somente na lista original de H. Wendeburg)
11. Hermann Eckelberg
12. Henrique Kriegel (nome corrigido de acordo com o documento original)
13. Conrad Kriegel (nome corrigido de acordo com o documento original)
14. Fernando Schuhmacher (nome corrigido de acordo com o documento original)
15. Elias Müller (está somente na lista original de Hermann Wendeburg)
16. Christiano Müller
17. Henrique Lucas
18. Miguel Kiegel (nome corrigido de acordo com o documento original)
19. Wendelin Kraemer
20. Ernesto Richter
21. Carlos Siebert
22. Otto Lobedan
23. Rodolfo Wagner (nome corrigido de acordo com o documento original)
24. Jacob Jasper
25. Carlos Baucke
26. Christiano Lucas
27. Oscar Kluge
28. Christ Frederico Krüger
29. Augusto Persch
30. Guilherme Hafenstein
31. Fried Guilherme Gross
32. Júlio Hartmann
33. João Fred Hafenstein (está somente na lista original de H.Wendeburg)
34. Gottlieb Gneewuch
35. Fred Guilherme Krieger (nome está somente na lista de H.Wendeburg)
36. Wilhelm Peters
37. Nicolau Hänche
38. Friederich August Thomas
39. Carl Sänberlich
40. Carl Hinze
41. Gustav Bosse
42. Friederich Giehe
43. Ludwig Helmbrech
44. Francisco Boehmer
45. Albert Marx
46. Carl Jansen
47. Heinrich Engel
48. Guilherme Fischer
49. Jacob Riedinger
50. Fr. Bähr
51. Paul Stahl
52. Christiano Witthoft
53. Johan Weisensee
54. Velentim Blasius
55. Hermann Kühendahl
56. Wilhelm Vogel
57. Fritz Riemer
58. Hermann Grahl
59. Eduard Köchy
60. Hermann Willerding
61. Johan Fischer
62. Hermann Geyer
63. Carl Luchtenberg
64. Ernst Scheefer
65. Carl Kressien
66. Woldemar von Zenschau
67. Fernando Ebert
68. Hugo Praun
69. João Oltmann
70. Isidor Hirt
71. Ricardo Ebert
72. Carlos Geier
73. Gottlieb Zeschke
74. Simon Kreiss
75. Heinrich Hansen
76. Wilhelm Fischer

Página da publicação da revista Blumenau em Cadernos T17 N°9 – 1976.

São nomes que fizeram parte da história regional e nacional, anonimamente. Mas nem em toda região do solo brasileiro foi assim. Após o término do conflito, oficiais domiciliados no Rio de Janeiro, capital do Brasil no final do século XIX, e que igualmente lutaram da Guerra do Paraguai, usaram sua participação no conflito e o resultado positivo para aplicar um golpe de estado no Império brasileiro, assumindo o poder do país, doravante com a implantação da República, em 15 de novembro de 1889.

Após a vitória na guerra entre Brasil e Paraguai, esses militares assumiram o papel de “heróis” que prestaram “grandes feitos” à nação brasileira. Passaram a ideia, por meio de seu comportamento e conduta, de que a nação lhes “devia” alguma coisa. Além do status aos novos oficiais da capital do Brasil – do campo de batalha, também surgiu um clima de grupo político entre os ex-combatentes da tropa, fazendo com que o Exército se tornasse mais homogêneo politicamente.

Para se ter uma noção dos diferentes comportamentos dos oficiais do Exército – do Rio de Janeiro e um do Vale do Itajaí – pós-guerra, o oficial do exército brasileiro – o imigrante prussiano Emil Odebrecht, após retornar do front foi “abrir caminhos” no interior da Província de Santa Catarina.

Correspondência Oficial 1873 – Relacionada aos Voluntários da Pátria – Guerra do Paraguai

Entre alguns documentos relacionados à Guerra do Paraguai e aos Voluntários da Pátria, voluntários da Colônia Blumenau que se apresentaram ao governo brasileiro para lutar pelo Brasil naquele conflito, também encontramos este pequeno ofício, que também estava entre as muitas correspondências oficiais localizadas no Setor de Documentos Raros da Biblioteca Central da UFSC, onde o original se encontra arquivado.

Transcrição ipsis litteris da correspondência

N° 30 Directoria da Colonia Blumenau 20 de maio de 1873.
Illmo e Exmo Snr.
Tendo eu hontem tido a honra, de receber o Aviso d’esjá Presidencia do 8 do corrente, acompanhado de copia de outro do Ministerio dos Negocios da Guerra, em que Va. Exa. Com urgência me comigo esclarecimentos pedidos neste ultimo Aviso aprajo-me apresentar à Va. Exa. A inclusa Enumeração circunstanciada dos habitantes da Colonia Blumenau, que, em conformidade com o Decreto N° 3371 de 7 de janeiro de 1865, se alistarão como Voluntarios da Patria, para fazer a campanha do Paraguai, e dos _____fores de direito d’aquelles que fallecerão na mesma.

Deos Guarde à Va. Exa. Illmo. Exmo. Sr.
Dr. Pedro Affonso Ferreira
Presidente d’esta Provincia
Etc etc etc
O Diretor
Dr. H. Blumenau

Homenagem aos Voluntários da Pátria – Escultura na praça Hercílio Luz – Blumenau

O espaço da Praça Hercílio Luz, antigo porto fluvial, foi a porta de entrada da grande Colônia Blumenau, por durante décadas. E não foi somente porta de entrada, como também foi o espaço de excelência de contemplação de uma das paisagens mais bonitas do grande rio Itajaí-Açu – a curva do rio.

Espaço público do porto antes da inauguração da revitalização do espaço e da inauguração da Praça Hercílio Luz.

Oficialmente, a praça Hercílio Luz foi inaugurada em 2 de setembro de 1900, pela passagem do 50° aniversário de fundação de Blumenau. Em 16 de abril de 1919 recebeu o nome de praça Hercílio Luz, em homenagem a esse republicano por iniciativa das novas lideranças locais que assumiram o poder na cidade a partir da Proclamação da República. Essa personalidade política residiu em Blumenau por um período, e manteve laços políticos com liderança locais, as mesmas que batizaram a antiga praça do Porto.

Praça Hercílio Luz – antigo porto fluvial de Blumenau.
Monumento aos “Voluntários da Pátria” – escultura edificada para relembrar o centenário da participação de blumenauenses que se apresentaram para defender o Brasil na Guerra do Paraguai, inaugurado em 5 de outubro de 1965 com grande solenidade e participação da comunidade.

Após 100 anos desta passagem histórica, a municipalidade de Blumenau, representando a comunidade blumenauense, providenciou uma escultura que ficou conhecida como Monumento aos “Voluntários da Pátria”. Instalaram-na nas proximidades do Monumento ao Imigrante, inaugurado no momento de inauguração da Praça Hercílio Luz.

A ideia do monumento para homenagear os Voluntários da Pátria foi uma sugestão do historiador, criador do periódico Blumenau em Cadernos e ex-prefeito de Blumenau José Ferreira da Silva, e foi materializada pelo então prefeito Hercílio Deeke.

Para dar forma à obra, foi contratado o escultor Miguel Barba, natural de São Paulo, que vivia em Blumenau.
O contrato para execução do monumento foi assinado em 19 de julho de 1965, e inaugurado no dia 8 de outubro na praça Hercílio Luz, em Blumenau. Moldado em cimento, representa quatro voluntários da Pátria, dois em atitude de ataque, enquanto o terceiro, ferido, leva a mão ao peito, tendo estampado no rosto espanto e sofrimento. O quarto soldado, perfilado, está em posição de sentido sobre pequeno pedestal.

Praça Hercílio Luz.
Praça Hercílio Luz.

Monumento localizado na praça, compondo com seu paisagismo e equipamentos urbanos – área pública.

Imagens do monumento – na última década de 2020.

Construção sobre a praça do “Museu da Cerveja”. Tipologia e volumetria alinhadas à casa do imigrante e com distanciamento do monumento.
Fotografia da vista, a partir da praça em direção ao edifício da antiga Prefeitura de Blumenau – atual Fundação Cultural de Blumenau.
Monumento dos Voluntários da Pátria – Situado na praça Hercílio Luz – Antiga praça do Porto, da Colônia Blumenau – Foto de Robinson Witte.

Sobre a praça atual, além do paisagismo e equipamentos urbanos, estão: um restaurante privado, o porto fluvial de Blumenau, o Museu da Cerveja, o monumento em homenagem à fundação do município, e o monumento “Voluntários da Pátria”.
No ano 2022, uma pessoa nos encaminhou registros fotográficos, inquirindo-nos o que estava acontecendo na praça Hercílio Luz e junto ao monumento. Guardamos os registros e não soubemos responder.

Obras privadas sobre a praça Hercílio Luz e junto ao monumento “Voluntários da Pátria”.Rua entre a praça e o edifício América.
Onde está o monumento “Voluntários da Pátria”?

Em 2 de setembro de 2023, foi reinaugurado sobre a praça Hercílio Luz o privado Museu da Cerveja, com “nova roupagem”. De acordo com a reportagem de Rodrigo Vieira, em ND+, o local passou por “obras de melhorias” após a entrega do espaço, pela prefeitura, à iniciativa privada. Com essa ação, o museu deixou de ser gratuito. Na época de sua inauguração, ainda de acordo com a matéria de Vieira, o ingresso de visitação custa R$ 60,00.

Praça Hercílio Luz e o monumento “Voluntários da Pátria”, em junho de 2023.
Praça pública Hercílio Luz e o monumento “Voluntários da Pátria”, em junho de 2023, com um museu sobre si, que cobra $60,00 o ingresso.

Um registro para a História.

Referências

  • IBGE. Biblioteca. Catálogo. Tipo de material: fotografia: Monumento Voluntários da Pátria: praça Hercílio Luz: Blumenau, SC. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?id=446663&view=detalhes . Acesso em: 27 de junho de 2023 – 00h18.
  • FERRAZ, Paulo Malta. Pequena História da Colonização de Blumenau – 1850 – 1883. Blumenau em Cadernos – Tomo XVI, maio de 1976, n°5. Blumenau.
  • GERLACH, Gilberto Schmidt. Colônia Blumenau no sul do Brasil.  Gilberto Schmidt-Gerlach, Bruno Kilian Kadletz, Marcondes Marchetti, pesquisa; Gilberto Schmidt-Gerlach, organização; tradução Pedro Jungmann. – São José : Clube de Cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 2 t. (400 p.) : il., retrs.
  • HUMPL, Max. Crônica do vilarejo de Itoupava Seca: Altona: desde a origem até a incorporação à área urbana de Blumenau 1.ed. Méri Frotschter  Kramer e Johannes Kramer (organizadores). Escrito em 1918. Blumenau: Edifurb, 2015. 227 p.: il.
  • SILVA, José Ferreira. História de Blumenau. -2. ed. – Blumenau: Fundação “Casa Dr. Blumenau”, 1988. – 299 P.
  • VIEIRA, Rodrigo. Museu da Cerveja vai reabrir e com cobrança de ingresso; veja a data e o valor. ND+. 30/08/2022 ÀS 18h11. Disponível em: https://ndmais.com.br/turismo/museu-da-cerveja-vai-reabrir-e-com-cobranca-de-ingresso-veja-a-data-e-o-valor/. Acesso em: 27 de junho de 2023 – 11h30.

Leituras complementares – Clicar sobre o título escolhido:

Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
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