Em nosso 23° artigo da coluna Registro para a História é momento de observarmos o “espaço” a partir das movimentações históricas sobre este. Para quem ainda não percebeu, alternamos o assunto relacionado ao espaço, sociedade/biografia e as práticas desta sociedade no espaço (cultura, educação, arte, religiosa, etc).
Vamos conhecer um pouco da história da Casa São José – em alemão: Josephshaus, um espaço multiuso que trouxe as interações de uma centralidade urbana para a pacata “Wurststrasse”, rua XV de Novembro do início do século XX, até então, estrada sem grandes movimentações e infraestrutura, exceto pela presença de alguns casarões existentes junto a foz do Ribeirão da Velha – “Alto da XV”, início do caminho fluvial para o interior do Vale da Velha.
Neste local estavam o Colégio Santo Antônio, a edificação da igreja católica e a casa dos padres franciscanos – isolados do Stadtplatz. Até então, local sem muita expressão, mesmo que a igreja tivesse sido projetada pelo renomado engenheiro da época, Heinrich Krohberger, dentro de uma sociedade colonial blumenauense, onde as principais lideranças frequentavam a igreja luterana.
A igreja luterana de Blumenau era Igreja do Espírito Santo, muito bem localizada no Stadtplatz – centralidade consolidada, compondo com elementos estruturais importantes de Blumenau, como o porto de passageiros/carga (porta de entrada da colônia), extremando a outra ponta do Palmenalle – Rua das Palmeiras em simetria com a igreja.
Entre o porto fluvial e a igreja luterana, local valorizado da centralidade – percurso da Palmenalle – Rua das Palmeiras, onde estavam instaladas as principais sedes comerciais, firmas importadoras, hotéis, residências de lideranças locais, consulado alemão, teatro, sociedade de tiro. O centro de gravidade do Vale do Itajaí
O Stadtplatz era o local da centralidade do Vale do Itajaí, até o momento que surgiu a Casa São José, nas proximidades da matriz, igreja católica de Blumenau e do Colégio Santo Antônio, no meio da “Wurststrasse”, rua XV de Novembro.
O Colégio Santo Antônio, fundado pelo Padre José Maria Jacobs e depois ficado sob a administração da ordem franciscana, recebia alunos de regiões distantes do Estado de Santa Catarina, do Alto Vale, da Serra Catarinense, da região da Grande Florianópolis, fazendo com que este local, fosse palco de grandes movimentações de pessoas e de viajantes que estavam politicamente e socialmente afastadas do Stadtplatz – centralidade de Blumenau. Vamos conhecer esta história.
A Casa São José – local histórico que surgiu em torno do espaço gravitacional da Igreja Católica de Blumenau e do Colégio Católico Santo Antônio. Na época de seu surgimento – a Escola Santo Antônio, local criado para os filhos de colonos pobres, fundada pelo Padre José Maria Jacobs, recebia alunos de locais muito distantes, de outras regiões. É conhecido de alguns, mas não suficientemente propagado pela história local e regional, talvez mediante aos muitos entraves existentes entre as religiões católica e luterana, não somente na Alemanha, mas também, no Brasil e, em Blumenau. No início da história de Blumenau, o clima entre ambas era hostil e filhos de famílias de religiões distintas eram proibidos de se aproximarem uns dos outros, e muito menos, se casarem – nos moldes do épico de “Romeu e Julieta”. Também aconteceu em Blumenau. As primeiras lideranças da colônia alemã no Vale do Itajaí somavam praticamente 100% de pessoas que comungavam na religião luterana.Observando a publicação abaixo, fonte de pesquisa da presente postagem, percebe-se que a igreja católica também tinha problemas com a maçonaria.
Começamos a observar esta questão de preterimento da sociedade católica local, a partir da pesquisa sobre a história, que “mereceu” publicações na cidade de Blumenau, feitas nas primeiras décadas. Os feitos e espaços com maior atenção e de autoridades eram ocupados por personalidades luteranas e da maçonaria. Ações, personalidades e espaços católicos não recebiam o mesmo grau de importância que eram ocupados pelos citados.
Muitos imigrantes alemães que migraram para esta região, eram oriundos da Baviera, um dos estados mais católicos da Alemanha. Para registrar, era desta região alemã, a maioria das famílias, e mesmo, aqueles que doaram terras para fundar o C. C. 25 de Julho de Blumenau. Estas pessoas e seus descendentes, por certo não tem em sua mesa e na gastronomia: o Rollmops, pão com sardinha, etc, pois viviam nas montanhas e não, no litoral – Mar Báltico, de onde vieram os prussianos e pomeranos para a região e que predominantemente, comungavam a religião luterana, questões resultantes das movimentações sociais na Alemanha – Cruzadas Teutônicas e a mágoa desta região às ações históricas na mesma. Vale uma pesquisa.
Não tomamos partido desta ou daquela religião, mas a história deve ser plena dentro de ambas e apresentamos com o introdutório destaque, para sua compreensão. Alemães e descendentes – culturalmente e etnicamente – não são iguais e seu perfil cultural e histórico tem relação estreito com a região de sua origem e de sua família, no continente europeu- pois Alemanha, como país, somente surgiu em 1871.
A igreja católica em Blumenau fazia circular uma certa movimentação sócio/cultural regional em torno de si, principalmente após a chegada dos imigrantes italianos (católicos) os quais foram assentados em locais específicos do Médio e Alto Vale do Itajaí pela administração da Colônia Blumenau. Neste local estava a paróquia de todo o território da Colônia Blumenau e onde também estava a Escola Santo Antônio, para onde iam os filhos de famílias de toda a região e também, de outras regiões, como da Serra Catarinense e da grande Florianópolis.
Para atender esta demanda e movimentação foi criado o espaço muito conhecido na cidade de Blumenau e no estado de Santa Catarina, pois fazia as vezes de dormitório, hotel, restaurante, teatro, baile, daqueles que frequentavam as instalações da igreja católica. Ficou também, conhecida, como a primeira rodoviária de Blumenau, Casa São José e em alemão – Josephshaus.
Vamos conhecer um pouco sobre esta História…
Foi publicado em 1968, na Revista Blumenau em Cadernos, que a Casa São José estava localizada entre a Casa Moellmann e a propriedade de Carlos Wahle, na Rua 15 de Novembro. Percebemos que a Casa Moellmann “chegou” ao local e “encostou” sua construção na construção da Casa São José, observando os registros fotográficos históricos.
O embrião da Casa São José – Josephshaus
A iniciativa de formalizar este espaço foi do padre José Maria Jacobs, que também idealizou e construiu a escola – primeira da Colônia Blumenau – como o primeiro Vigário da Paróquia São Paulo Apóstolo. A reunião aconteceu em 7 de setembro de 1884, quando se reuniu um grupo de pessoas na casa paroquial e na qual foram apresentados formalmente, os estatutos de uma sociedade beneficente que vinha sendo organizada e se chamou – S. Joseph Manner-Verrein ou, Sociedade de homens – São José. O estatuto foi posto em votação para ser aprovado e o foi. Em seguida, foi eleita sua diretoria provisória:
- Presidente: Michel Schimtz;
- Vice-Presidente: August Sutter e Heinrich Reuter;
- Secretários: Jacob Weiss e Joseph Wamser;
- Tesoureiros: Johann Kluge e H. Zimermann.
Aconteceu uma segunda reunião em 5 de outubro no mesmo ano de 1884. Nesta foi ajustado o estatuto, determinando o valor da mensalidade dos sócios e a eleição, de fato, da Diretoria definitiva que ficou assim composta:
- Presidente: Jacob Schmitt;
- Vice-Presidente: August Sutter;
- 1° e 2° Secretários: Johann Schmitz e Joseph Wamser;
- Tesoureiros: Johann Kluge e H. Zimermann;
- Conselheiros: Valentim Vogel, Heinrich Reuter, Adam Heckmann e Johann Hostert
Em janeiro de 1885, durante a assembleia geral, a diretoria foi confirmada para outro período. Elaboraram uma bandeira da sociedade nomeando Karl Weege como porta-estandarte, com os assistentes: Alexandre Tarnowsky e Francisco Reuter.
Era estranho, mas a sociedade começou a ter atribuições que não estavam de acordo com seus estatutos originais, como por exemplo: fiscalizar o comportamento dos seus associados, tanto assim que, na reunião de fevereiro, seguinte, foi levantada a hipótese de punição para os sócios que não haviam comparecido a uma procissão que ocorreu em 25 de janeiro (festa de São Paulo Apóstolo). Também cogitaram punir aqueles que não participassem das comunhões mensais e, através de multa, puniam os sócios que atrasassem a mensalidade.
Isso não foi bem visto e a sociedade não ia muito bem no que tangia seus propósitos. Este quadro forçou a interferência do Padre José Maria Jacobs, o que resultou na exoneração do Presidente, sendo substituído por Johann Kluge.
O nome do padroeiro e protetor da sociedade era São José e a diretoria determinou que em todos os dias santos, domingos e durante a missa fosse acesa uma vela no altar de São José.
Na reunião de julho de 1890, o Padre Jacobs alertou para uma questão que ficou registrada na História: A Proclamação da República e as novas leis. Padre Jacobs alertou sua comunidade – a partir da sociedade, sobre o “perigo que representavam as novas leis” para a região.
Padre Jacobs sofreu perseguições políticas por defender a monarquia brasileira – esta muito respeitada na Colônia Blumenau e que sofreu um golpe militar no Rio de Janeiro. Nada pôde fazer e sofreu consequências por suas escolhas. Mesmo assim, alertou este grupo e os orientava que votassem nos homens que representavam a repulsão à nova ordem política – Republicana. Leu para os membros da sociedade, um manifesto dos católicos do Rio Grande do Sul que o Deutsches Volksblat reproduzira em língua alemã.
A partir de então, grandes mudanças estavam previstas para Blumenau. No final de 1892 foi decidido que as reuniões da sociedade passariam a ser somente 4 por ano: a primeira em 25 de janeiro na festa de São Paulo Apóstolo, a segunda no dia da comunhão geral, a terceira no dia da Ascensão e a última, no dia 1° de novembro, dia de Todos os Santos. Neste tempo, o Padre José Maria Jacobs havia transferido a paróquia e a escola Santo Antônio para os Padres Franciscanos e, partindo de Blumenau desgostoso, morreu no Rio de Janeiro, no Hospital da Gamboa, com febre amarela. Estava voltando para a Alemanha.
O novo pároco da matriz, Frei Zeno Wallbröhl sugeriu que a Sociedade se fundisse com outra existente na paróquia. A decisão ficou para ser definida na reunião de 18 de março de 1894, onde foi aprovada a proposta de dissolução pura e simples da Sociedade São José.
Quanto ao capital em caixa, foi destinado a uma missa anual dedicada aos sócios vivos e mortos – durante 50 anos e para a construção da igreja de Indaial.
O armário da Sociedade foi doado à Escola São Paulo – Colégio Santo Antônio e o estandarte social deveria permanecer na igreja matriz, até quando sumiu de maneira misteriosa, como foi o caso do busto do Coronel Feddersen, no Bairro Itoupava Seca na atualidade. Alguém registrou à lápis no final da última ata: “Moral da história: todo começo é fácil”.
Mas a ideia não morreu como se presumia. A paróquia possuía ramificações no interior da colônia cujo território abrangia o território atual do Médio e Alto Vale do Itajaí, a sede da colônia, com extensão até Brusque e até as regiões natais de seus alunos, que chegava às regiões de São José e São Pedro de Alcântara – Grande Florianópolis.
O resgate e retorno da Sociedade São José – com uma Sede
A paróquia era muito grande, principalmente, após a chegada dos imigrantes italianos. Aumentou a movimentação de pessoas do interior até a sede e também de outras regiões. Alem disso, na paróquia, chegavam pessoas para a missa e também eventos religiosos e festividades em dias santos de localidades afastadas.
Deslocavam-se de carros, carroças, cavalos, de trem, de barcos, bicicletas. Em dias de encontros nos ambientes católicos – em Blumenau, existia muita dificuldade para guardar os veículos, animais, alimentação e descanso para pessoas e animais, entre outras dificuldades. Este cenário fez surgir a ideia de resgatar a Sociedade São José, com outras atribuições, além do lado beneficente.
A repaginada sociedade teria também, uma sede para uso dos católicos que visitavam a matriz e o colégio a partir do interior da grande Colônia Blumenau e também, do Estado de Santa Catarina, atendendo com infraestrutura de hospedagem, alimentação entre outras, durante a permanência destes na cidade, que vinham até a matriz para assistirem as missas e aos demais ofícios litúrgicos e atividades proporcionada pela escola católica – o Colégio Santo Antônio.
Em 1905, o Frei Crisólogo Kampmann, vigário da paróquia, coordenou a nova estruturação da Sociedade, cujo presidente foi eleito Dr. Wiegando Engelke, médico renomado, vindo de Joinville e que residia na comunidade de Salto Weissbach.
Qual a relação do Barracão dos Imigrantes com a Casa São José?
Nesta data, quando houve a decisão para resgatar novamente a Sociedade, o antigo Barracão dos Imigrantes ainda estava no Palmenalee – Rua das Palmeiras. Edificação que atendeu e serviu de abrigo para as primeiras famílias que chegaram à Colônia Blumenau – durante as primeiras 5 décadas de história local.
O Barracão dos Imigrantes encontrava-se sem uso. O Estado pretendia se desfazer da antiga construção. A comunidade luterana centro demonstrou interesse nele, mas devido a interferência do Frei Beda Koch, que tinha laços de amizade com o Coronel Vidal Ramos, governador de Santa Catarina, este foi vendido para a Sociedade São José, para o uso do seu material em uma nova roupagem, a ser construída no chão próximo à igreja católica. O Barracão dos Imigrantes foi desmontado e seu material, usado na construção da sede da Sociedade São José – na frente do Convento Franciscano e à margem direita da Rua XV de Novembro, com fundos para o Rio Itajaí Açu.
Pelo Barracão dos Imigrantes, foi pago ao Estado de Santa Catarina, através da coletoria local, a soma de 1.120$000.
Então, pode-se afirmar que até a década de 1950 – no ano do centenário de Blumenau, tínhamos o material do Barracão dos Imigrantes, aquele que acolheu as primeiras famílias pioneiras de Blumenau, presente na Rua XV de Novembro, nas proximidades da igreja católica.
A Construção da Sede da Sociedade São José
Em 31 de agosto de 1905, o bispo diocesano de Curitiba, onde a paróquia de Blumenau era sufragânea, D. Duarte Leopoldo e Silva, em viagem por algumas cidades de Santa Catarina – passou por Blumenau, para uma visita pastoral. Fazia parte da programação desta visita, o lançamento da pedra fundamental da Casa São José – Josephshaus, como seria chamada, a partir de então. O ato foi solene e foi registrado em documento oficial com o seguinte teor:
“No ano da graça de 1905, no dia 8 de dezembro, na data da Natividade de Nossa Senhora, no pontificado do Papa Pio X, gloriosamente reinante, sendo Bispo da Diocese de Curitiba Dom Duarte Leopoldo e Silva, sendo Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil, o Conselheiro Rodrigues Alves, sendo Governador do Estado de Santa Catarina o Coronel Vidal Ramos Junior, sendo Guardião do Convento de Santo Antônio em Blumenau e vigário da Paróquia de São Paulo Apóstolo e diretor da Associação de São José o Padre Crisólogo Kampmann OFM, sendo juiz de direito desta comarca o Dr. Aires d’Albuquerque Gama e Superintendente Municipal Alwin Schrader, presentes a Diretoria e membros da Associação de São José, foi lançada a primeira pedra e benta pelo Exmo. e Revmo. Sr. Bispo desta Diocese de Curitiba, Dom Duarte Leopoldo e Silva, do edifício destinado aos fins da Associação de São José. Em fé do que se lavrou esta, na presença das pessoas abaixo assinadas. (Assinados) Dom Duarte,
Bispo Diocesano. Frei Crisólogo Kampmann OFM. Frei Herculano LimpinseI. OFM., ex-Minister Provo Frei Marcelus Baumeister.OF:\1., Dr. Wiegand Engelke, Presidente. Jacob Schmitt, Vice Presidente, Rodolf Bngado. l °.secretário, o coletor Francisco Cunha Silveira. Pedro Kieser. 2° Secretário, Rodolf Ferraz, José M. Marsch, Heinrich Herkenhoff, Johann Koehler, Karl Ostmann e duas outras ilegíveis”.
A sede da Sociedade São José foi inaugurada em 1° de novembro de 1906. O “Blumenauer Zeintug” noticiou:
“União de São José. Quinta feira, 1°. de novembro de 1906. Às 11 horas. inauguração da sede da Sociedade e às 19 horas, no mesmo local, Teatro com peças em alemão e português. Entrada 1$000. Para os sócios $500”.
O evento iniciou com uma missa solene, seguido da bênção do edifício, e foram servidos comida e bebida aos presentes. Foi inaugurada a Casa São José, construída com o material do Barracão dos Imigrantes.
Às 19:00 horas, dentro da programação festiva, iniciou a representação teatral no palco do salão, que sempre estava com espetáculos mencionados em textos históricos, a partir desta data, por mais 5 décadas, quando foi demolido. A primeira apresentação foi de uma peça em português apresentada em dois atos, seguida de uma peça em alemão, de um ato e para terminar, uma peça em alemão de cinco atos. Após as peças teatrais, foi exibido um ato cômico que representava uma escola pública do começo do século XIX. Registrando, que todos os atores participantes destas peças teatrais, como sempre foi no início da Colônia Blumenau e até bem pouco tempo, no C.C. 25 de Julho de Blumenau, eram atores amadores. As pessoas praticavam e tinham a cultura como parte de seu entretenimento e formação.
A nova Casa São José era administrada por um ecônomo que provia do necessário e fazia as despesas necessárias para o funcionamento das hospedagens e atendimento dos associados que vinham do interior da colônia, pagando determinada quantia – como aluguel e recebia parte dos lucros – tal como funciona parte das sociedades atuais, em Blumenau. O primeiro ecônomo foi Heinrich Wahlbröll. O segundo foi Joseph M. Flesch, que permaneceu até 1909, ano da inauguração do primeiro trecho ferroviário da EFSC. Wloch assumiu e ficou ecônomo até 1911 e Scharff até 1912, Jean Michael até 1917 e, o último foi Ricardo Bürger, até 1927.
Justificando a decadência do local, em detrimento de outras casas de hospedagem que surgiram no entorno seguindo a iniciativa, e também, mediante a dissolução da Sociedade São José – esta foi vendida para Heinrich Michels que a manteve até o ano de 1952, quando a lei municipal n° 318, de 19 de março, declarou que esta edificação era de interesse público e foi desapropriada, pelo valor de 500 mil cruzeiros. O valor foi pago em partes de 200 mil em apólices da Dívida Pública Municipal e os 300 mil restantes em 3 prestações.
A sede da Sociedade São José, construída com o material do Barracão dos Imigrantes foi demolida em 1952. Um local de encontros, de cultura, de chegada, de festividades e com a áurea do início da história de Blumenau. A Casa São José, historicamente, deslocou o eixo da centralidade urbana de Blumenau, até então localizada no seu Stadtplatz, para a Estrada da linguiça – “Wurtstrasse” – Rua XV de Novembro . Com isto, despertou, pioneiramente neste local, o valor imobiliário e suas consequentes especulações fundiárias, no local. A Casa São José foi retirada do espaço, porque a municipalidade (formada pelos representantes das lideranças mencionadas no início deste artigo) decidiu, que neste lugar, só neste, iria ser construída uma ponte sobre o Rio Itajaí Açu. Haviam outros lugares para construir a ponte, inclusive próximo ao próprio e original Stadtplatz de Blumenau (que estava esvaziando) – centralidade formal de Blumenau e que também, tinha ligação com o caminho histórico que ligava ao Garcia e que precisava de algo novo na paisagem da cidade, para manter seu statos de centralidade e assim não foi feito.
A municipalidade de Blumenau, a partir de atos sequenciais, historicamente é responsável pelo esvaziamento do Stadtplatz de Blumenau – o próximo ato histórico, e não resistimos e não mencionar para a história, foi a mudança do local da Prefeitura e a ocupação da praça do porto – Praça Hercílio Luz, que poderia continuar a ser um porto com praça. E, recentemente, em 2021, esta mesma administração pública de Blumenau estava avalizando a construção de uma loja de departamentos, com arquitetura Kitsch – Loja da Havan, em uma das extremidades da Palmenalle – Rua das Palmeiras.
Quanto a Casa São José – neste momento decisivo, a movimentação de um grande número de pessoas em torno da mesma, oriundas do interior do Vale do Itajaí e também, de outras regiões do Estado de Santa Catarina e do Brasil, pode ter despertado o interesse de investidores (ligados às lideranças locais), promovendo o aumento do valor imobiliário do local e o interesse de novos investidores do comércio.
O Stadtplatz de Blumenau não foi mais o mesmo – depois da existência da Casa São José no meio da Rua XV de Novembro. A localização para a construção de uma ponte poderia ser um argumento material para a retirada do edifício histórico do local, sem causar desconforto e polêmicas, deixando um local urbano, agora de grande valor imobiliário, consequência da própria existência da Casa São José nesta região.
Este local adquiriu tanta força e valor imobiliário, que a centralidade original – nos anos que se seguiram (menos de 100 anos a partir de) ficou com o papel coadjuvante, correndo riscos de se descaracterizar mediante, também, a ação de forças invisíveis e até mesmo, correndo risco de receber a construção de uma edificação com grão bem maior e dotado de uma arquitetura Kitsch de gosto duvidoso em uma de suas extremidades – no tempo presente, sob a base do morro onde está a centenária Igreja luterana Espírito Santo, como já foi mencionado
Demoliram o espaço sede multiuso da sociedade católica de Blumenau, denominada na época por Josephshaus – Casa São José, construída com o material do Barracão dos Imigrantes, alegando que necessitavam do chão para acessar a nova ponte sobre o Rio Itajaí. Menos de duas décadas após, a loja existente ao lado da Casa São José, construiu sua expansão em direção a este chão.
Uso da Casa São José
Além de hospedar pessoas oriundas do interior de Blumenau, do Vale do Itajaí e de outras regiões do Estado de Santa Catarina em seu ambiente, mensalmente, eram realizadas festas e reuniões. As festas de casamentos e batizados terminavam com música, cerveja e dança. Também eram apresentadas peças de teatro. Houve um período em que foi instalado um cinema com uma programação semanal, dentro de alguns dias, caracterizando a primeira sala de cinema de Blumenau. Quando passou a ser propriedade dos Michels, permaneceu somente como hospedagem, mas havia espaço para gastronomia, restaurante e café, principalmente frequentado pelos visitantes de outras localidades, e ainda com espaços para eventos.
Arquitetura
A arquitetura, a partir de material reciclado, reporta ao eclético, com a presença da mansarda, repleta de Dachgaube, por certo, criado para promover a iluminação e ventilação dos quartos localizados no sótão. A fachada principal era marcada pela simetria, sendo que as extremidades eram marcadas por elementos volumétricos que possuíam dois pavimentos e na parte central, havia somente um pavimento com a presença da mansarda. Quem criou a arquitetura teve muita sensibilidade e a fez com esmero e um toque artístico dentro de suas limitações materiais e espaciais. Observamos somente, que se poderia aproveitar melhor a paisagem do rio, que recebeu os fundos da edificação. Não conseguimos definir a técnica construtiva usada, mesmo parecendo ser uma edificação autoportante de tijolos maciços. A fachada, que está voltada para o rio, tem somente um pavimento com um grande Dachgaube no meio do edifício, munido a mansarda de aberturas, todas em madeira envidraçadas. Curioso é a janela pivotante com desenho da janela guilhotina açoriana usada no litoral do estado, colocadas na mansarda.
Arquitetura com belíssima plástica, cheia de lastro histórico, construída no início do século XX e que forneceu vigor imobiliário para este trecho da Rua XV de Novembro, tanto que pode ter sido este o motivo para sua célere demolição em 1952.
Heinrich Michels
Último proprietário da Casa São José – nasceu em Indaial em 8 de julho de 1883 e era filho de Johann Melchior Michels e neto de Peter Michels que, viúvo, migrou para o Brasil/Blumenau com 6 filhos, em 1863. Heinrich se casou com Maria Catharina Theiss. Tiveram 15 filhos.
A Memória da Casa São José nos Depoimentos de quem a conheceu
Meu pai falava de Josef Haus , um tipo de alberge, naquele lugar, seria essa construção, na foto? São lembranças do tempo de criança. Silvio Uhlmann
Nos registros que encontrei, esse espaço foi a primeira rodoviária de Blumenau. Ricardo Conceição
Eu conheci como hotel São José. Elvira Brueckheimer Falaster
Conheci o Hotel São José, no ano de 1949, o qual também abrigava os ônibus dos municípios da região, servindo como se fosse rodoviária, tudo isto antes da criação da rodoviária de rua 7 de Setembro. Agenor de Aguiar
Uma surpresa ver a foto. Nos anos 50 eu e meus colegas estudávamos no colégio Santo Antônio. Para ir a Testo Salto, diariamente, pegávamos o ônibus da empresa Andorinha que fazia a linha Corupá / Blumenau. A Casa São José ( Josef Haus) foi derrubada para a construção da ponte de ligação à Ponta Aguda. Manfredo Bubeck
Depoimento de Berta Kerger Humpl – filha do Professor da escola Alemã de Altona, o bávaro, portanto, católico Professor Max Humpl. Os dois frequentavam a Casa São José, como é perceptível no texto de Berta retirado do livro Colônia Blumenau no Sul do Brasil. Interessante que Max Humpl e a filha iam à missa na igreja do centro, de Altona até a XV, à pé e depois almoçavam na Casa São José, como também visitavam outros pontos focais de Blumenau do início do século XX.
Aos domingos, meu pai e eu íamos à Igreja Católica, a pé; depois, à Casa São José, para almoçar, voltando para casa mais tarde. Passeávamos muito pela cidade. Na Confeitaria Katz, sempre tomávamos café com bolo. Outras vezes, tomávamos o trem até Blumenau (de Itoupava para o centro de Blumenau, N.T.). Por muitos anos ainda eu continuei a acreditar no coelhinho da Páscoa, que me presenteava com ovos cozidos ou recheados, o que para a época era bastante. Meus vestidos estavam se estragando ou ficando pequenos, o que dificultava os nossos almoços no Hotel Franke. A Sra. Büchner tentava recuperar as minhas roupas, o que com o passar do tempo tornava-se complicado. O casal Büchner aconselhara papai a casar-se de novo. Na escola tínhamos um quarto; papai preparava bolinhos num fogareiro e comíamos com salada, o que provocava saudades da Alemanha. Papai não gostava dos feijões servidos no hotel. Cozinhar em casa sempre era muito mais divertido – quem conhece a vida de solteiro sabe do que estou falando. Possuíamos somente um lampião ou uma vela. Certa vez, meu pai me falou que seria melhor que houvesse mais alguém na nossa casa. Eu mesmo gostava da Marie, que morava na Alemanha. Seguiu-se uma troca de cartas entre o Brasil e a Alemanha, até que meu pai decidiu viajar e buscar a Marie.
Durante a sua ausência eu fiquei aos cuidados de uma professora viúva que tinha dois filhos, e que havia se alojado no Hotel Franke, todos os três extremamente antipáticos. Meu pai havia deixado uma boa soma de dinheiro em mãos do Sr. Abry, para o caso de ocorrer algum imprevisto na sua viagem e eu ter que voltar mais tarde para a Alemanha.
Na despedida ele me disse: “cuida bem para que nenhuma cobra te pique”; já que havia muitas delas em torno da escola. “Quando escurecer, vá dormir sem deixar a luz acesa”. Berta Kerger Humpl – *26.2.1903 + 29.1.1967 – Morava na Comunidade Altona e foi filha do Professor Max Humpl
Um registro para a História!
Referências
- Blumenau em Cadernos. A Casa São José. Tomo IX. Fevereiro de 1968 – N°. 2.
- HUMPL, Max. Crônica do vilarejo de Itoupava Seca: Altona: desde a origem até a incorporação à área urbana de Blumenau, 1.ed. Méri Frotschter Kramer e Johannes Kramer (organizadores). Escrito em 2018. Blumenau: Edifurb, 2015. 227 p. : il.
- FROTSCHER, Méri. Da Celebração da Etnicidade Teuto-brasileira à Afirmação da Brasilidade: Ações e discursos das elites locais na esfera pública de Blumenau (1929-1950).Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História, da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito parcial e último para obtenção do grau de Doutora em História Cultural, sob orientação da professora Doutora Maria Bernardete Ramos. Florianópolis SC, 2003. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/85390/191344.pdf?sequence=1 . Acesso em: 29 de maio de 2021 – 23:32h.
- SCHMIDT-Gerlach, Gilberto. Colônia Blumenau no Sul do Brasil. Gilberto Schmidt-Gerlach, Bruno Kilian Kadletz, Marcondes Marchetti, pesquisa; Gilberto Schmidt-Gerlach, organização; tradução Pedro Jungmann. – São José : Clube de Cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 2 t. (400 p.) : il., retrs.
- SILVA, José Ferreira da. História de Blumenau. 2.ed. – Blumenau: Fundação “Casa Dr. Blumenau”, 1988. – 299 p.
- WETTSTEIN, Phil. Brasilien und die Deutsch-brasilieniche Kolonie Blumenau. Leipzig, Verlag von Friedrich Engelmann, 1907.
- WITTMANN, Angelina. História – Prússia e Alemanha – Com Ecos no Vale do Itajaí. 18 de outubro de 2013. Disponível em: https://angelinawittmann.blogspot.com/2013/10/historia-prussia-e-alemanha.html
- WITTMANN, Angelina. O Centro Histórico de Blumenau – Seu papel na cidade de Blumenau dentro dos períodos Históricos. 12 de março de 2021. Disponível em: https://angelinawittmann.blogspot.com/2021/03/o-centro-historico-de-blumenau-seu.html
- WITTMANN, Angelina. Padre José Maria Jacobs – Primeiro Pároco de Blumenau. 20 de fevereiro de 2015. Disponível em: https://angelinawittmann.blogspot.com/2015/02/biografia-padre-jose-maria-jacobs.html
Eu sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
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