Gincana Cidade de Blumenau: gincaneiros relembram provas e momentos inusitados da competição que é referência no Brasil

Ex-integrante da Comissão de Provas conta como são elaborados os desafios

A Gincana Cidade de Blumenau (GCB) é muito reconhecida pelas provas realizadas, que costumam fugir do padrão e surpreender os gincaneiros e toda a cidade.

Os principais objetivos da disputa por meio dos desafios são promover uma integração de pessoas, dar um retorno para a sociedade através das provas filantrópicas e resgatar a história do município.

Gincaneiros reunidos em 2011. Foto: Arquivo pessoal.

Como funcionam as provas

Apesar de o grande evento da gincana acontecer apenas no mês de setembro, as provas percorrem praticamente o ano inteiro. Nesta edição de 2022, os gincaneiros já estão cumprindo desafios mensalmente, desde abril. Eles são enviados através do WhatsApp para todas as equipes, que possuem um tempo determinado para decifrar as charadas.

Além disso, as provas sociais da GCB também acontecem e mobilizam as equipes durante todo o ano. De acordo com o vice presidente da Liga dos Gincaneiros, Ricardo Caresia, essas provas prévias que ocorrem servem como um aquecimento para os participantes.

Entretanto, o momento mais aguardado pelos gincaneiros é o fim de semana próximo ao aniversário de Blumenau, quando as principais provas acontecem. O evento começa no início da tarde de sábado, passa pela Prova da Madrugada, reinicia no domingo e finaliza no início da tarde.

Cada equipe possui seu “QG”, em locais distintos na cidade, com estrutura montada para decifrar os enigmas. As provas são liberadas por um sistema e as entregas variam, podendo ser através de uma plataforma, em algum local que precisa ser decifrado durante a disputa, ou na sede da Comissão de Provas.

Comissão de provas e gincaneiros reunidos. Foto: Arquivo pessoal.

Sobre as provas

Normalmente a gincana conta com um número entre 35 e 40 provas por edição, elaboradas pela Comissão de Provas. Conhecida como “CP”, a comissão é contratada pela Liga dos Gincaneiros e fica responsável por organizar as provas de forma independente das equipes ou da própria Liga.

O estilo dos testes é variado e não segue um padrão específico. Há desafios que vão desde a contagem de letras ou palavras num texto, até um áudio ao contrário para que os participantes descubram uma música.

No entanto, o sucesso de determinados tipos de provas fizeram elas se consolidarem na competição. As provas mais comuns da gincana são as: filantrópicas; culturais e históricas; artísticas; esportivas; de buscas e de lógica; além da famosa prova da madrugada.

Organização da gincana. Foto: Arquivo pessoal.

Elaboração dos desafios

Para que seja possível fazer as provas darem certo, principalmente as que envolvem informações sobre a cidade, é necessário que a comissão realize uma pesquisa histórica.

André Mrozkowski, que fez parte da CP por mais de 20 anos, conta que em outubro de cada ano, um mês após a finalização da gincana, a comissão inicia as pesquisas para a formulação dos desafios da edição seguinte. Segundo ele, grande parte do estudo acontece no arquivo histórico, em busca de informações raras em livros e jornais antigos como “A Nação” e “A Cidade de Blumenau”.

“Nós não queremos que eles apenas desvendem as provas, desejamos que cumpram os desafios aprendendo sobre a história de Blumenau. Porém, se queremos trabalhar com a história da cidade, não basta apenas pegar um fato que está na internet, porque isso todo mundo faz, então a gente realiza um trabalho de pesquisa”, explica André.

Comissão de provas da GCB. Foto: Arquivo pessoal.

Provas culturais e históricas

Quando a pesquisa finaliza, o processo de desenvolvimento das provas de fato inicia. Ao invés de fazerem desafios no estilo pergunta e resposta, a organização pede para equipes desvendar enigmas de forma criptografada, ou seja, através de códigos e charadas.

Como as provas culturais e históricas visam testar os conhecimentos dos gincaneiros sobre a cidade de Blumenau, os enigmas geralmente apontam para documentos, locais ou personalidades que marcaram de alguma forma o município.

“Em todas as provas eles precisam trabalhar muito para encontrar as soluções, afinal, as charadas são complexas, envolvem criptografia e são baseadas na história da cidade”, enfatiza André.

Gincaneiros fantasiados para uma prova da competição. Foto: Arquivo pessoal.

Provas de buscas 

As provas de busca geralmente contam com um tempo limite para que as equipes  apresentem o que foi solicitado pela CP. Normalmente eles precisam entregar coisas como objetos exóticos, animais, fotografias, raridades etc. Porém, na 16ª edição, as equipes tiveram que ir em busca de seus próprios integrantes.

O sequestro

Em 2008 a Comissão de Provas decidiu organizar um sequestro. No dia 2 de setembro daquele ano, seis dias antes da gincana, houve uma reunião atípica formada pela comissão e um integrante de cada equipe da gincana. Nessa reunião, os gincaneiros foram, na verdade, raptados.

Gincaneiros raptados na gincana de 2008. Foto: Arquivo pessoal.

Os participantes foram vendados e direcionados até um ônibus, que tinha destino para um sítio na cidade de Gaspar. Os participantes ficaram uma semana no local, onde precisavam ir atrás do próprio alimento, realizar alguns trabalhos “forçados”, e aprender um alfabeto alienígena, criado para interpretar a prova da madrugada.

Gincaneiros realizando “trabalho forçado” no sequestro de 2008. Foto: Arquivo pessoal.

Os competidores tinham a possibilidade de voltar para casa, porém, a consequência seria que as equipes dos desistentes perderiam pontos. Na época, André Mrozkowski ainda integrava a CP e, por isso, possui muitas memórias relacionadas ao sequestro. Ele conta que foram dias muito engraçados, porém, os familiares dos sequestrados entraram em desespero.

“Tinha gente que era até diretor de empresa, só que o pessoal é tão alucinado pela gincana que não estão nem aí se iam perder o emprego ou assustar a família. Nessas horas o que vale é o jogo”, diz André.

Gincaneiros após conseguirem alimento durante o sequestro em uma área rural de Gaspar. Foto: Arquivo pessoal.

Devido à preocupação das famílias, foi permitido que eles se comunicassem através de uma carta diária, que era lida publicamente para todo o grupo de reféns. André conta que as cartas eram muito engraçadas, principalmente as escritas pelas mães preocupadas.

Gincaneiros reunidos para a leitura das cartas dos familiares. Foto: Arquivo pessoal.

Prova da madrugada

Conhecida por mesclar assuntos históricos, culturais, buscas, muita lógica e um pouco de terror em um único grande desafio, a prova da madrugada é a prova favorita dos gincaneiros.

A prova nasceu em 1994, na segunda edição da gincana, com o objetivo de trazer uma novidade para a competição. No estilo de “caça ao tesouro”, a prova da madrugada é dividida em sub-etapas, e cada fase traz uma pista que leva à próxima. Devido a isso, uma das principais características do desafio é fazer com que os participantes andem pela cidade.

“Muitas vezes as equipes precisam decifrar a prova parados dentro do carro e sem muita luz ou espaço para que possam ganhar tempo. Por isso, acredito que a unanimidade de preferência é a prova da madrugada, tanto pela dinâmica e pelo estilo, quanto pelo nível do desafio”, comenta o vice-presidente da Liga, Ricardo Caresia.

Gincaneiros na prova da madrugada. Foto: Arquivo pessoal.

Ao mesmo tempo que vencem os obstáculos construídos propositadamente para assustar as equipes, os participantes seguem em busca das dicas necessárias para desvendar os enigmas e chegar ao final do caso.

O idealizador da gincana, Fabrício Wolff, conta que algumas pistas da prova da madrugada eram plantadas em cemitérios, para provocar uma tensão maior nos participantes.

“Acontecia das equipes virem um homem todo de preto no cemitério, que provavelmente era o zelador do local, mas por conta do contexto levavam um susto e saíam correndo”, comenta ele, aos risos.

Integrante da Comissão de Provas durante a prova da madrugada. Foto: Arquivo pessoal.

Nas primeiras edições, a prova durava aproximadamente das 22h até 2h, entretanto, André Mrozkowski e os outros sucessores de Fabrício fizeram com que a disputa durasse  literalmente a madrugada inteira.

Cada edição possui um enredo específico e conta com uma produção pensada propositalmente para deixar a prova mais assustadora e complicada. Em 2017, o tema era coulrofobia, ou seja, o medo de palhaços.

André conta que para formar uma narrativa para aquela prova, foram gravadas aparições de “palhaços assassinos” nas cidades e os vídeos foram postados na internet, na forma de notícia alarmista. Todavia, as postagens tiveram mais repercussão do que o esperado e acabaram rendendo reportagens até mesmo na televisão, para alertar a população.

Naquele ano, André planejou e vivenciou sua última prova da madrugada. Para finalizar a participação na gincana em grande estilo, o elaborador de provas se fantasiou de palhaço assassino.

Antigo participante da Comissão de Provas, André Mrozkowski, fantasiado de palhaço assassino em 2017. Foto: Arquivo pessoal.

Provas esportivas

As provas esportivas são aquelas em que os participantes praticam algum esporte tradicional, porém de uma forma adaptada. Em 1993, por exemplo, o desafio era uma corrida com equipamentos de mergulho, e contava com nadadeiras estilo pé de pato e máscaras de mergulhador.

Corrida com equipamentos de mergulho em 1993. Foto: Arquivo pessoal.

Em 2012 houve a prova da retroescavadeira. O objetivo era que as equipes conseguissem utilizar o braço hidráulico da máquina para retirar bolas de basquete que estavam em cima de cones e colocá-las em barris. De acordo com André, o teste parece fácil mas não é, e rendeu muitas risadas.

Prova da retroescavadeira em 2012. Foto: Arquivo pessoal.

Artísticas

As provas artísticas possuem o intuito de colocar em evidência a criatividade dos gincaneiros. No teste, eles precisam apresentar coisas como apresentações de teatro, construções de maquetes, imitações e produções de vídeos.

Em uma das edições da gincana, as equipes produziram uma galeria de arte no Norte Shopping, onde reproduziram obras famosas. No entanto, a maior graça e diferencial da prova foi o fato de os integrantes terem se caracterizado como os personagens e fazerem parte das pinturas.

Veja abaixo as reproduções

Prova do vídeo

O desafio que mais chama atenção dos gincaneiros na categoria de provas artísticas é a prova do vídeo. Um tema relacionado à Blumenau é estipulado pela Comissão de Provas e a partir disso, cada equipe precisa fazer uma produção audiovisual sobre um assunto específico ligado ao tema geral.

Confira registros de gravações

Por também possuírem um caráter histórico relacionado à cidade, algumas produções costumam ser apresentadas em escolas, como material de apoio para o ensino dos alunos. Um exemplo é o “Funk do Doutor Blumenau”, produzido pela equipe Amigos do Barney na 19ª edição da gincana.

O vice-presidente da Liga diz que é necessário um grande estudo para realizar a prova do vídeo. Ele relembra uma de suas edições, na qual os participantes precisaram ler algumas cartas que os imigrantes de Blumenau enviaram para os parentes na Alemanha. Ricardo conta que isso agregou a eles muito conhecimento sobre a cidade.

As produções de vídeos das equipes podem ser conferidas na página do Facebook da GCB.

Festa do Oscar

Depois que as equipes produzem os vídeos, é preciso apresentá-los. Porém, a entrega não acontece de forma simples, pelo contrário, existe uma cerimônia chamada Festa do Oscar, para prestigiar o trabalho realizado pelos gincaneiros e premiar a equipe vencedora.

Festa do Oscar. Foto: Arquivo pessoal.

Momentos engraçados

Apesar de ter seu nome consolidado e ser reconhecida como uma gincana profissional, muitas situações atípicas já aconteceram durante as provas da GCB e entraram para a história de momentos mais engraçados da competição.

Segundo Ricardo Caresia, em determinada edição, durante uma prova, sucedeu de esquecerem um integrante em um local bem distante e precisarem voltar para buscá-lo. Numa outra ocasião, as equipes estavam à procura de pistas para desvendar as charadas e encontraram provas escondidas de edições anteriores.

Em outro ano, ocorreu de uma equipe interpretar errado uma pista de prova e se deslocar para o Presídio Regional de Blumenau, pensando que lá haveria alguma outra pista. Com a situação, os policiais acharam que era uma invasão no presídio e os participantes quase acabaram a brincadeira encrencados.

Também já aconteceu de os participantes terem que econtrar um Fiat 147 e levarem para a CP; irem até a fonte da loja Havan, localizada da rua XV de Novembro, fantasiados de sapo para tirar fotos; cozinharem um prato típico de outro país e trazerem uma pessoa da nacionalidade; entre outras inúmeras histórias que marcam a trajetória dos participantes e transformam a gincana em uma ferramenta para construção de amizades, além de um grande acervo de bons momentos.

Momento de comemoração em uma edição da GCB. Foto: Arquivo pessoal.

Referência no Brasil

Pelo nível das provas, que se dá devido a competência e dedicação dos elaboradores, e também pelo comprometimento dos gincaneiros com a disputa, a GCB é referência para outros lugares do Brasil.

André Mrozkowski relata que diversas cidades já vieram procurar os organizadores da gincana para pegarem dicas e realizarem suas próprias gincanas. Um caso específico foi o de Barueri, cidade localizada na Grande São Paulo, que frequentemente mandavam pessoas de lá para estudar a GCB. A CP até prestou assessoria para eles e revisaram provas da competição paulista durante um ano.

“Isso me enche de orgulho, ter participado de uma gincana que cresceu tanto. Fico muito feliz por ela continuar ativa depois de tantos anos”, afirma André.

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