Capa: Fotografia que pertenceu à Oscar Ewald e seu neto Günther Ronald Ewald. Registro da chegada de oficiais e tripulação da Esquadra Alemã em maio de 1914, no porto fluvial de Blumenau. Chegaram com o Vapor Blumenau I.

Observando a História em uma fotografia do início do século XX

Apresentamos uma fotografia de maio de 1914, que recebemos do blumenauense Günther Ronald Ewald, residente há muito tempo na cidade gaúcha de Gramado, e que de lá acompanha nosso trabalho. Viva o advento da internet!

A histórica fotografia mostra a visita de parte dos oficiais e da tripulação da Esquadra Alemã formada pelos navios de guerra a vapor Kaiser, König Albert e Strassburg, chegando ao porto fluvial (atualmente Praça Hercílio Luz) com o Vapor Blumenau I, onde foi recebido por boa parte da população de Blumenau da época.

De acordo com Günther Ronald Ewald, essa fotografia pertencia aos Schönaus da comunidade Altona, família de sua avó Frieda e que, casada com Oscar Ewald, a herdou. Estava exposta na sala da residência Ewald, em Altona – lembranças da infância de Günther. A fotografia foi herdada, mais especificamente, do bisavô de Günther, conhecido como Fritz Schönau, filho de Catharina Schönau e Wilhelm Schönau.

Catharina era da família Lukas, sobrinha do pioneiro Johannes Peter Wagner, ou Pedro Wagner, filha de sua irmã Dorothea Wagner e de Peter Lukas. Também pioneiros que receberam Hermann Blumenau aqui na região, quando este veio conhecer o lugar para implantar sua colônia agrícola privada.

Dorothea foi irmã de Pedro Wagner e de Alfredo Wagner. Peter Lukas – além de ser marido de Dorothea, foi o melhor amigo de Pedro Wagner.
Johannes Peter Wagner, ou Pedro Wagner – Pioneiro da Colônia Blumenau, 4 anos antes dos fundadores “oficiais”.
No local do Danker tinha um fero velho. Agora não mais.
Rua São Paulo. Fonte: Google Earth.

Frieda Schönau (Ewald), quando solteira, residia e era costureira no Hotel Dancker, localizado ao lado do Salinger – na Altona, onde conheceu seu futuro marido, Oscar Ewald, de Benedito Novo/Timbó. Para quem não se lembra, Altona é o atual bairro de Itoupava Seca, e foi uma comunidade autossuficiente e independente do Stadtplatz da Colônia Blumenau.

Recentemente, foi transformado somente em um corredor, parte de um binário viário de acessos a Blumenau, o que contribuiu muito para sua descaracterização e perda da arquitetura presente na paisagem e seu aspecto bucólico e histórico.

Comercial Salinger – Propriedade da FURB – olhar observação no final do artigo, a qual também é proprietária de outros casarões na vizinhança.
Palavras do fotógrafo: “foto feita em 25 de outubro de 2003. Ruínas do prédio da empresa Gaitas Hering, que chegou a ser a maior fábrica de instrumentos musicais do Brasil, e que acabou falindo em 1990. Este prédio, bem como a pequena Praça Coronel Feddersen, que ficava à sua frente ostentando o monumento ao coronel, e que abrigava em sua base a RN 1400 C, do IBGE, foram todos demolidos no ano de 2008, para a construção da Praça dos Músicos Alfredo Hering, inaugurada em 20 de setembro de 2008”.
Infraestrutura do Sistema viário colocado no bairro, desprovido de reflexão com a paisagem pré-existente.

Oscar Ewald  nasceu em 27 de abril de 1899 em Timbó (faleceu em Blumenau em 28 de janeiro de 1985) e Frieda Schönau nasceu em Blumenau em 10 de setembro de 1895 (faleceu em Blumenau em 9 de fevereiro de 1976).

Cemitério Luterano de Itoupava Norte/Seca. Cemitério em estado ruim de conservação com nomes de personalidades históricas de Blumenau, nascidas na Alemanha na primeira metade do século XIX.
Máquina de Costura de Frieda (Schönau) Ewald.

Oscar trabalhava com um veículo a mola tracionado por animal e transportava cargas e pessoas entre a sua região e Altona. Deixava seu veículo estacionado na frente do Hotel Dancker, enquanto seus passageiros faziam compras no Salinger. Conta, Günther Ronald Ewald, que algumas pessoas aproveitavam, quando compravam peças de tecido, e no mesmo dia já costuravam suas roupas novas e as da família, na sala de costura de Frieda Schönau, localizada junto ao hotel, situação que contribuiu para que a jovem conhecesse seu futuro marido, Oscar Ewald.

Assinatura de Oscar Ewald.

 

 

“Minha vó Frieda fazia calças e camisas no dia, para pessoas que vinham do interior fazer compras no Salinger e já levavam no dia. Quem lhe deu a primeira máquina costura e única, que tinha a vida toda, foi o velho Fouquet.
Destas famílias que tinham terras que começavam na beira do Rio Itajaí-Açu e iam até á Vila Nova, onde depois, a terceira geração, em 1940, começaram a lotear a Vila Nova. As terras do meu trisavô Heinrich Schönau eram onde, na rua Bahia, faz a curva, no local que o trem atravessava, vizinho dos Mathes e Reif. Ele faleceu cedo aí ficou a viúva Catharina, nascida de Lukas, sobrinha de Pedro Wagner.” Günther Ronald Ewald.

Altona – localização do Hotel e do Comercial Salinger, rua São Paulo.

Frieda, sobrinha do pioneiro Johann Peter Wagner/Pedro Wagner, filha de sua irmã Dorothea e de seu amigo Peter Lukas, se casou com Oscar Ewald em 19 de outubro de 1921. Ficaram residindo no Hotel Danker, em Altona, por três anos.

O casal teve 9 filhos: Harry Fritz Otto Ewald (1923– -); Rita Ewald (1924–2000); Gerda Ewald (1926–1988); Annita Ewald (1929–2012); Heinz Ewald (1930–1992); Edith Ewald (1933– – ); Werner Ewald (1933–2013); Elisabeth Ewald (1937 – viva) e Rolf Ewald (1940–2023).

Quando nasceu a filha Rita, em 1924, foi quando adquiriram o terreno de Scheidmantel, localizado entre o início da Rua Gustavo Salinger e o morro em que fica o atual ginásio de esportes da EBM Machado de Assis, onde se localizava a casa do Ewald. O local era conhecido como Morro dos Ewald. A rua de acesso ao ginásio esportivo tem o nome de Oscar Ewald, que foi construtor/carpinteiro na comunidade (construía casas de madeira), e sua esposa, naturalmente, costureira.

Altona na época dos Schönau, também fotografia do acervo da família, que nos foi repassada por Günther Ronald Ewald. Fotografia do acervo de Bruno Kadletz. contribuição de Bruno Kadletz para localização dos pontos focais de Altona do início do século XX.

Detalhes da foto de Altona

Primeira parte da fotografia – parcial de Altona.
Segunda parte da fotografia – parcial de Altona.
Terceira parte da fotografia – parcial de Altona.

A família Ewald, de Altona, tinha uma vida social muito ativa no Clube de Caça e Tiro, e contava com um espaço de destaque nas sociedades de Blumenau. Na década de 1970, o pai de Günther Ronald Ewald teve a presença da neta de Hermann Blumenau em sua Festa de Rei.

A Fotografia

Fotografia muito interessante do início do século XX, onde podemos “ler” a existência da intermodalidade presente em Blumenau nesse período histórico.

Ford T – Blumenau da década de 1920.

Observamos a presença do Vapor Blumenau (navegação fluvial), do automóvel – um Ford T -(fabricados entre 1909 e 1927); e de uma bicicleta de fabricação inglesa; de um cavaleiro e seu cavalo, e de dezenas de pedestres em um mesmo “ambiente”.

Tal quadro destoa da realidade atual, em que quase sempre o espaço prioritário é somente do automóvel, justificando qualquer intervenção mais radical.

Lembre-se que a cidade de Blumenau e outras cidades brasileiras que escolheram o rodoviarismo por opção de política econômica de abertura ao capital estrangeiro, mais especificamente, para a indústria automobilística que teve início no governo de Getúlio Vargas e se consolidou no governo de Juscelino Kubitschek.

Automóvel.
Tração animal.
Bicicleta.
Fluvial.
Embarcações fluviais.
Sobrinho dos irmãos Hering.

Não bastassem esses modais citados na fotografia da família Ewald, existia também a ferrovia. Para o evento da visita dos marinheiros alemães, em especial, a Editora do Jornal Der Urwaldasbote, através de G. Artur Koehler, providenciou e publicou um pequeno catálogo para marcar o momento, contendo fotografias de estações e paisagens locais da Estrada de Ferro Santa Catarina – EFSC, cujo primeiro trecho (Blumenau a Warnow – Indaial) foi inaugurado em 1909. Em 1914, a EFSC, ainda em construção, contava com 5 anos de inauguração do primeiro trecho. Este contexto histórico vem conferir e dar mais legitimidade à intermodalidade existente em Blumenau do início do século XX. Utilizamos parte do material de Koehler, em nosso livro A Ferrovia no Vale do Itajaí – Estrada de Ferro Santa Catarina.

Capa do catalogo produzido por Koehler: Imagens de Blumenau – Como recordação à visita dos Oficiais e Tripulação da Esquadra Alemã em maio de 1914. Adquirido da Editora do Jornal “Der Urwaldasbote”, G.Artur Koehler, Blumenau.
Parte da ferrovia EFSC, cujo primeiro trecho foi inaugurado em 1909. Primeira ponte sobre o rio Itajaí-Açu.
Estrada de Ferro Santa Catarina.
Estrada de Ferro Santa Catarina.
Estrada de Ferro Santa Catarina. Estação de Blumenau e o porto de cargas fluvial de Blumenau.
Salto Weissbach, próximo à entrada da Rua Água Branca.
Ponte do Encano, Indaial. Essa ponte ainda está no local, necessitando manutenção.
A estação do Passo Manso, existiu somente por algum tempo.
Ponte de Granito Rosa – sobre a foz do Ribeirão do Tigre.
Estação ferroviária de Blumenau – Local da atual prefeitura de Blumenau, construída em alvenaria com “ripas coladas na parede”. Atualmente, recebeu um protótipo, também com “ripas na parede”, construído na Praça Victor Konder, próximo a esse local. Uma das arquiteturas urbanas mais imponentes que Blumenau teve em sua paisagem.
Destaque para a estação de Itoupava Seca – antiga comunidade de Altona dos Ewalds.

A visita dos Marinheiros

“Já para eles o mar era o caminho de ligação entre o desconhecido e a terra natal, apesar dos meios de transporte aquáticos simples, e hoje, muito mais que antigamente, o mar é o caminho mais curto para a ligação de países e continentes, para a procura da felicidade no exterior, para o retorno ao amigo e ao irmão no país natal.
As modernas possibilidades de transporte por barco a vapor existem provavelmente há uma geração, pois apenas em 1807 começou a navegação por barco a vapor, de uma forma bastante modesta, com as vigentes de Fulton no rio Hudson. Somente depois da introdução do barco a vapor com hélice, em 1840, é que foi possível pensar em viagens maiores e, assim, a Linha Cunard da Inglaterra empreendeu, em 1842, a primeira viagem ao redor do mundo. HUMPL, 189.

É interessante ler parte do livro do professor Max Humpl, mencionando sobre a contemporaneidade dos vapores, sendo que nesse mesmo século, Blumenau já era dotado de navegação a vapor. Os primeiros imigrantes chegaram a Santa Catarina de veleiros, em uma viagem que variava, em média, em 16 semanas. Isso aconteceu entre os anos 1850 e 1876. Depois disso, as viagens eram feitas de vapores, nos quais as pessoas embarcavam nos portos de Hamburg e Bremen.

Professor Humpl menciona em seu livro que as comunicações eram grandes entre imigrantes alemães e capitães e marinheiros. Frequentemente, navios faziam visitas formais ao governo brasileiro, e também à cidade Nossa Senhora do Desterro. Deslocavam-se até o pequeno porto fluvial do Rio Itajaí-Açu, onde aconteciam grandes confraternizações entre imigrantes alemães e descendências residentes e os marinheiros oficiais do governo alemão.

O primeiro grande navio alemão a aportar no Porto de Itajaí e ter contato com a Colônia Blumenau foi o Albatroz, em 1879. O país Alemanha tinha 8 anos de idade. Depois, o porto fluvial de Blumenau recebeu parte da tripulação do Panther, que também aportou a Itajaí, em 1906. Em 1911, houve uma nova visita, com a vinda de 400 marinheiros no navio Von der Tann, o qual também ancorou no Porto de Itajaí.

Postal da visita dos marinheiros do navio Von der Tann ao porto fluvial de Blumenau.

Visita registrada na foto desta Postagem – 1914.

Almirante Hubert von Rebeur-Paschwitz. Fonte: Wikipédia.

Entre os dias 4 e 6 de maio de 1914, um pouco antes do início da 1ª Grande Guerra (que teve início em 28 de julho), 19 oficiais, entre os quais estavam o Almirante Hubert von Rebeur-Paschwitz e mais 275 marinheiros da tripulação dos navios alemães “Kaiser”, “König Albert” e “Strassburg”. Os marinheiros e oficias estiveram também na comunidade de Altona, o que pode ter despertado o interesse do antepassado de Günther Ronald Ewald que residia na comunidade.

O Almirante Hubert von Rebeur-Paschwitz, nasceu em Frankfurt em 14 de agosto de 1863 e faleceu em Dresden em 16 de fevereiro de 1933. Em 1899, foi um adido naval alemão em Washington e mais tarde, em 1912, comandou a frota de navios de guerra alemães mencionada, que visitou os Estados Unidos e também, o Brasil.

Fonte: Wikipédia.

“Raramente podia-se ver em Altona um espírito tão festivo tão alegre quanto naqueles dias. Todos competiam para organizar uma recepção cordial e hospitaleira para a querida visita, para mostrar-lhes o modo como vivemos e aquilo que nos longos anos foi feito aqui pelos imigrantes alemães e pelos descendentes. – A maioria das casas tinha recebido alojamentos, e as pessoas empregavam todos os meios para proporcionar aos lobos do mar alguns dias alegres em terra. (…) os dias de visita jamais serão esquecidos por nós, e da mesma forma os oficiais e as tripulações alemãs da marinha também não esquecerão a impressão que eles tiveram do desenvolvimento da colonização alemã e do trabalho de civilização na distante nação brasileira, e com prazer se lembrarão dos alegres dias entre compatriotas de terras longínquas. Provas disso são as numerosas cartas e cartões postais dos visitantes, as quais chegaram aqui.
Nos últimos anos, devido a guerra, todas as notícias tiveram de cessar. Muitos dos queridos visitantes, provavelmente tiveram uma morte honrosa como defensores da pátria, e descansam no fundo do mar. Humpl, 191/192.

Observação

Casarão Salinger é parte do patrimônio da FURB – informação confirmada em uma publicação de sua própria fonte de notícias – de 11 de julho de 2014.

Um Registro para a História.

Referências

  • ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. 4. ed. – São Paulo: Martins Fontes, 2000. 1014p.
  • Arquivo de Notícias – FURB. FURB apresenta proposta para restaurar Casa Salinger – 11 de julho de 2014. Gabinete da Reitoria/Jornalismo. Disponível em: https://www.furb.br/web/1704/noticias/arquivo/2014/07/furb-apresenta-proposta-para-restaurar-casa-salinger/3350. Acesso em: 18 de outubro de 2023.
  • BERNER, J. O. As locomotivas da Estrada de Ferro Santa Catarina. Blumenau em Cadernos, Blumenau, tomo 10, n. 5, p. 91-92, maio 1969.
  • CENTENÁRIO de Blumenau. 1850 – 2 de Setembro – 1950. Blumenau: [s.n.], 1950. – 1v.(varias paginações).il. Edição Comissão de festejos.
  • GERLACH, Gilberto Schmidt. Colônia Blumenau no Sul do Brasil / Gilberto Schmidt-Gerlach, Bruno Kilian Kadletz, Marcondes Marchetti, pesquisa; Gilberto Schmidt-Gerlach, organização; tradução Pedro Jungmann. – São José : Clube de Cinema Nossa Senhora do Desterro, 2019. 2 t. (400 p.) : il., retrs.
  • HUMPL, Max. Crônica do vilarejo de Itoupava Seca: Altona: desde a origem até a incorporação à área urbana de Blumenau; Méri Frotscher Kramer e Johannes Kramer (orgs.). – 1.ed. – Blumenau (SC) : Edifurb, 2015. – 226 p. : il.
  • SANTIAGO, Nelson Marcelo; PETRY, Sueli Maria Vanzuita; FERREIRA, Cristina. ACIB: 100 anos construindo Blumenau. Florianópolis: Expressão, 2001. 205 p, il.
  • SILVA, José Ferreira. História de Blumenau. -2.ed. – Blumenau: Fundação “Casa Dr. Blumenau”, 1988. – 299 p.
  • VIDOR, Vilmar. Indústria e urbanização no nordeste de Santa Catarina. Blumenau: Ed. da FURB, 1995. 248p, il.
  • WITTMANN, Angelina C.R. A ferrovia no Vale do Itajaí: Estrada de Ferro Santa Catarina: Edifurb, 2010. – 304 p. :il.

Leituras Complementares – Clicar sobre o título escolhido:

 

Sou Angelina Wittmann, Arquiteta e Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade.
Contatos:
@angewittmann (Instagram)
@AngelWittmann (Twiter)