Por Gabriel Langaro

Na batalha contra o vírus que matou mais de 700 mil brasileiros, Vilmar Augusto Minozzo, emergiu como um farol de esperança e resiliência. Gaúcho, nascido em Veranópolis e criado em Nova Prata, vive no Vale do Itajaí há pelo menos 37 dos seus 56 anos de existência – mudou para Blumenau em fevereiro de 1986.

Formado em Jornalismo pelo antigo Instituto Blumenauense de Ensino Superior (Ibes), chegou a concluir a graduação em Publicidade e Propaganda pela Universidade Regional de Blumenau (FURB).

A trajetória no rádio começou muito cedo, antes dos 18 anos, ainda no estado vizinho, quando narrava jogos de futebol local e fazia alguns trabalhos como freelancer. Em Blumenau, teve passagem pela antiga rádio Blumenau, pela União, Menina, Nereu Ramos e ainda na primeira emissora de Santa Catarina, a rádio Clube.

Mas foi na rádio CBN que o “tigre” – como ficou conhecido – ganhou o seu espaço em Blumenau. Nos anos 1980, quem tinha agilidade com a informação era chamado pelos radialistas de “Tigre da Notícia”. Isso pegou e Minozzo carrega o apelido até hoje. Passou a integrar a equipe dirigida por Carlos Alberto Ross na década de 1990. Radialista e comentarista esportivo, Minozzo é um jornalista do tipo perfeccionista, exigente, e também dinâmico.

A rotina começava cedo: em incontáveis edições do programa Notícia na Manhã, a certeza era de que em todas elas o esporte e as suas entrevistas sempre tinham destaque. Perto das oito horas, a primeira gravação do dia eram as manchetes do que seria noticiado ao longo da manhã.

“Olá amigos do esporte”, era assim que a maioria das suas participações esportivas começavam. Com uma linguagem simples, trazia as principais informações de campeonatos locais, estaduais e nacionais. Em vários momentos, saia da redação e ia até o estúdio na mesma hora em que a abertura do programa já estava tocando. Não precisava de nenhuma preparação antes, sempre teve domínio do assunto, habilidade garantida pela dedicação e acompanhamento do tema inclusive nas horas vagas.

Uma das técnicas que os anos de prática no radiojornalismo, sobretudo na cobertura de campeonatos esportivos, fizeram com que Minozzo domine é o improviso. Sem nenhuma anotação, dedicava duas horas do dia para as duas entrevistas que entravam na grade: uma sobre política e outra de assuntos gerais. É do tipo de entrevistador que rende tudo na hora, sem nunca anotar uma pergunta se quer. Além disso, também tem a capacidade de deixar o entrevistado à vontade, revelando muitas vezes passagens e momentos particulares de sua vida ao público.

Além do rádio, o jornalista gaúcho também passou pela TV. Imagem: Lucas Prudêncio. Foto: Vilmar Minozzo/Arquivo Pessoal

Em todas as pautas, uma palavra fazia parte das produções: a simplicidade. Enquanto jornalista atuante, procurava dar visibilidade a voz de todas as pessoas envolvidas.

Porém, nem só sobre esporte e política que o “tigre” produzia materiais. Durante bons anos, foi o repórter referência de Blumenau para a rede nacional. Em casos como o da enchente de 2008, Minozzo mostrou seu trabalho de cobertura para a CBN no Brasil inteiro.

A cobertura jornalística da tragédia de 2008 foi marcada por desafios. As emissoras da FURB foram as únicas que conseguiram manter as transmissões enquanto todas as outras estavam fora do ar. A FURB TV e a TV Galega passaram a difundir as informações em simultâneo com a programação gerada pela TVL.

Com isso, Minozzo mais uma vez foi a campo. Contribuiu ativamente com materiais produzidos em tempo real, emplacando conteúdos nacionalmente e na rede local, formada em caráter emergencial. Para enriquecer as informações, ele foi um dos repórteres que sobrevoaram toda a região, junto com profissionais da rádio Gaúcha, Rede Globo e a imprensa local.

Essa cobertura ficou para a história. E por falar nisso, tanto no trabalho quanto na roda de amigos, sempre tem uma boa e longa história para contar. Foram quase 600 programas “Nossa Gente” produzidos para a TV Legislativa de Blumenau. Lá, entrevistava pessoas e mostrava detalhes da vida de personagens importantes para a cidade.

Com a chegada da pandemia, a sua rotina teve alterações. O esporte e as entrevistas passaram a ser feitas de casa, já as reportagens externas se tornaram inviáveis. O gaúcho apresentava o Notícia na Manhã aos sábados, dividindo com Denise Bichling que sustentava a programação durante a semana.

O jornalista apresentou o programa ao vivo aos sábados. Foto: Vilmar Minozzo/Arquivo Pessoal

Um desafio

Em 13 de março de 2021, no auge da pandemia, um novo desafio dava os primeiros sinais em sua vida. Ele seguia o cotidiano normal, na CBN e na TVL, quando alguns sintomas começaram a se manifestar.

De uma forma muito rápida, em cerca de uma semana após a confirmação da contaminação pelo coronavírus, Minozzo precisou ser internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) destinada aos pacientes com a doença e, após dois dias, veio a intubação.

Apenas 5% do pulmão não estava comprometido. Todos os amigos de profissão e da vida aguardavam ansiosos pelos boletins diários repassados pelo irmão, Leomir Minozzo, que mantinha contato direto com médicos e compartilhava as informações pelas redes sociais.

Com 20 dias fazendo uso do tubo de ventilação mecânica, o “tigre” recebeu a traqueostomia – procedimento de abertura frontal na traqueia para facilitar a passagem do ar até os pulmões.

Nesta complexa batalha travada pela vida, as complicações só não eram maiores que a fé da família, amigos e ouvintes que diariamente, às 21h30, se reuniam virtualmente para fazer correntes de orações. Foram mais de 100 dias de luta contra a Covid-19 e pelo menos 25 quilos a menos.

– “Você foi e voltou seis vezes”.

Essas palavras, anunciadas pelo médico que o acompanhou na UTI, acentuaram os momentos em que o fio da vida foi tênue. Entre os quatro meses de internação, Minozzo passou por hemodiálises, duas cirurgias e chegou a ficar sem sequer mexer os dedos, por conta da fraqueza muscular.

Quem acompanhou o processo todo foi a esposa, Mara Minozzo, que pediu licença do trabalho para cuidar do marido. Foram meses difíceis. Segundo ela, os médicos disseram que ele estava em sepse – grave infecção por todo o corpo – e que os rins estavam em colapso.

“Achamos que ele iria morrer. Disseram que nós teríamos que estar preparados para o pior”, disse Mara.

No dia 8 de abril, sem transmitir mais o vírus, ele passou a receber visitas na UTI geral, capítulo da história que antecedeu a infecção por uma nova bactéria que o colocou novamente em isolamento.

A esperança

Os pulmões finalmente começaram a dar os primeiros sinais de funcionamento novamente. Todos aguardavam a diminuição da sedação para poder fazer o procedimento de extubação – retirada do tubo para estimular a respiração espontânea. Foi no dia 22 de abril, por volta das 07h30, que o irmão mais velho compartilhou um momento que reacendeu a esperança dos que o rodeiam. Sobrevivente da Covid-19, Vilmar abriu os olhos ao ser chamado pelo irmão que segurou firme a sua mão.

“As lágrimas são derramadas e isso é um sinal que ele está me ouvindo”, compartilhou Leomir em um dos seus boletins diários. Desde então, o processo de despertar foi constante. Os pequenos avanços foram fundamentais para moldar a expectativa de melhora depositada no gaúcho.

“Ontem [10 de junho de 2021], depois de mais de 80 dias intubado, foi retirada a traqueostomia. Ele agora consegue respirar sozinho sem ajuda do aparelho”. Foi assim que Denise Bichling, âncora da CBN, deu a notícia para os ouvintes da 95,9 FM. Com emoção e peso nas palavras, foi ela, colega de profissão há mais de 20 anos, quem transmitiu diariamente mensagens de força ao amigo nos dias de hospitalização.

Vilmar Minozzo e Denise Bichling compartilham experiências profissionais há mais de 23 anos. Foto: Arquivo pessoal/Denise Bichling

A recuperação

Passado tempo, Vilmar ainda deseja voltar aos microfones da rádio. Atualmente fazendo uso de uma bengala, pelas limitações físicas em uma das pernas, a expectativa dele e dos colegas é de retomada às rotinas da profissão. “Que em 2024 o retorno dele seja um presente para todos nós”, afirmou Denise.

A narrativa de superação transcende as manchetes. Cada frase dita por ele hoje reflete a sua própria recuperação. O exemplo de coragem que não ressoa apenas no campo jornalístico, mas como inspiração universal para todos que buscam força nos momentos mais sombrios da vida.

Atravessamentos

“Peço licença aqui para um breve relato como ex-colega de trabalho, testemunha do profissionalismo e hoje grande amiga e admiradora do jornalista e sobretudo do ser humano Vilmar Minozzo. Em 2001, quando eu tinha recém-iniciado o curso de Jornalismo, apareceu uma oportunidade de estágio na CBN Blumenau e eu não perdi tempo.

Eu morava em Gaspar, trabalhava em Blumenau e à noite ia até Itajaí para as aulas diárias. Foi uma rotina diária desgastante, por mais de quatro anos. Muitas vezes, o esgotamento me fez pensar em desistir. Minozzo não me permitiu. Ele sempre tinha palavras de incentivo e companheirismo. Lembro que num dos momentos mais difíceis, eu simplesmente sentei num meio-fio da calçada, na rua, e desabei em choro.

Lá estava ele, segurando a minha mão e lembrando dos meus sonhos. Por tudo isso, construímos uma amizade sólida, de respeito, afeto e bem-querer. A vida nos levou por caminhos diferentes, mas a admiração nunca se abalou. Quando soube de seu coma pelos telejornais, durante a pandemia, fiquei emocionalmente atingida e reforcei as orações, junto com todas as pessoas que estavam nesta mesma sintonia.

Minozzo é um ser humano com muita garra, o que explica o apelido de tigre! Não tenho dúvidas de que, tal qual o animal, é um dos maiores do gênero – neste caso, não apenas do comentário esportivo, mas principalmente da grandeza humana. Quando Gabriel propôs o seu nome para a produção do perfil, durante as aulas da disciplina de Gêneros Jornalísticos, vi o caso como uma oportunidade da vida em termos de gratidão.

Quebro o protocolo para deixar este depoimento aqui como alguém que se vê realizada com a sua recuperação e as voltas da vida. Se um dia Minozzo me apoiou, como uma então aspirante à jornalista, hoje busco desenvolver essa função em sala de aula, com Gabriel e toda a turma, que certamente também será inspiração para outros que virão adiante. É isso que dá sentido à vida, afinal! A certeza de que somos passagem e a busca por fazer sempre o melhor. Obrigada por tudo, Vilmar Minozzo!”

Magali Moser, coordenadora do curso de Jornalismo da FURB e professora da disciplina de Gêneros Jornalísticos, responsável pela série de perfis publicada em O Município Blumenau

Série de perfis

Este perfil integra uma série em parceria com o curso de Jornalismo da FURB. A iniciativa promove textos produzidos durante as aulas da disciplina de Gêneros Jornalísticos, ministrada pela professora Magali Moser, na quarta fase do curso.

O perfil é um dos formatos possíveis de textos jornalísticos que busca valorizar uma personagem.

As reportagens-perfis assumem um papel focado na experiência do outro, tendo como centralidade uma pessoa. Na parceria estabelecida entre O Município Blumenau e o curso de Jornalismo FURB prevê que a cada semana, o perfil escrito por um(a) estudante da turma seja publicado no portal, sempre nas terças-feiras.